1. Infelizmente a França é longe demais.

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"Para minha pequena Delphine."

Eram as palavras escritas no pequeno envelope dourado que Delphine retirou pela terceira vez do bolso naquela tarde. Por ser uma mulher meticulosa, se dava ao trabalho de guardar a folha sempre dobrada, e sempre no envelope, mesmo sabendo que com o passar das horas, voltaria a desdobrá-la e lê-la.

O fazia, porque esperava que de alguma forma o envelope protegesse o conteúdo escrito, mantivesse o papel intacto. E mesmo com o pouco tempo, já percebia que aquilo não estava mais funcionado.

Retirou a folha com cuidado do interior do envelope e desdobrou-a algumas vezes até que uma frase coerente se alinhasse. As mãos estavam trêmulas, seus dedos mal firmavam no papel, mas ainda assim, após forçar os olhos um pouco, conseguiu ler as palavras, mesmo em meio aos vincos, aos amassados.

Já havia decorado o que ali estava escrito, sabendo mesmo sem olhar, mas ainda assim procurou as palavras, e focou a atenção.

"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."

Antoine de Saint-Exupéry

Feliz décimo oitavo aniversário, minha pequena princesa!

21 de Dezembro, 2004.

Eram as palavras ali escritas.

O papel no tamanho A4, era do estilo papel carta, que um dia havia sido branco, e naquele momento, após tantos anos, mostrava-se levemente amarelado.

Delphine manteve o papel em mãos, entre os dedos compridos. Voltando a olhá-lo em seguida.

Sempre que olhava a folha, corria os olhos até o final, com aquela esperança de que algo ali, tivesse lhe passado despercebido. Chegava até mesmo a virar a parte detrás da folha, mas nada havia. Nunca houvera nada mais.

Ela procurava como se houvesse algo mais que precisasse saber, algo mais que estava sendo dito naquela curta sentença, ali, mas que não via, não compreendia, não decifrava.

Pelo empenho que empregara em manter a folha íntegra, era decepcionante para ela notar como o papel já estava degradado em alguns pontos.

Notava a tinta escura da caneta borrada, mas ainda daquela forma, não impedia que tudo fosse enxergado com clareza.

Havia sido ela, com as lágrimas, que haviam fugido de seus olhos, que contribuíra para manchá-la.

Lágrimas teimosas que caíram sem que pudesse de alguma forma controlar.

Cada vez ficava mais difícil controla-las e controlar a si mesma. Não era fácil para Delphine deixar de pensar que havia perdido a pessoa que mais amava na vida.

A pessoa que mais tinha afeto por ela. Seu pai.

A caligrafia desenhada no pedaço de papel era familiar, suas linhas, suas curvas, seus números.

Deu um profundo suspiro, e levantando a cabeça desviou os olhos do papel.

Arrumou a mecha dos fios louros, que ameaçava encobrir-lhe os olhos âmbar e continuou a passos largos, a caminhada que fazia para atravessar a extensão do aeroporto movimentado.

Fazia alguns minutos que seu voo chegara, e ainda tentava se situar. Tentava acostumar-se com a ideia de que já estava no seu país natal.

Delphine procurava um rosto familiar, mas aquela busca, havia se tornado um martírio. Não conseguia se concentrar em nada. Nada que não fosse o estado deplorável que seu emocional se encontrava.

Defy ThemOnde histórias criam vida. Descubra agora