9. Ela me perfumava, me iluminava.

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As mãos de Delphine seguravam o casaco macio, enquanto ela via a jovem mulher afastando-se em passos lentos. "Cosima" ela repetiu, a consoante chiando em meio a seus dentes. Aquele nome não fugiria de sua memória, embora não lhe parecesse tão estranho, como na primeira vez que associou a morena. Foi questão de apenas alguns segundos e quando voltou a focar sua atenção na mulher caminhando ao longe, viu que ela já tinha sumido de seu campo de visão. Cosima havia se misturado às pessoas que caminhavam de um lado para o outro no local, pessoas que ela não havia notado antes, mas que talvez por já ter passado o horário de inicio da peça. Delphine queria entender o que havia acontecido com ela. Jamais havia sentido algo daquela maneira por uma mulher. Ela apertou a peça que levava em mãos por entre os dedos e em um gesto que refletia a confusão que havia em seu interior. Delphine levou o casaco na altura da face inspirando a fragrância que o tecido exalava. Confirmando que o cheiro presente na peça era exatamente o que havia sentido quando Cosima estivera próxima. Aquela fragrância presente, era cítrica e lembrava alguma fruta que Delphine não conseguiu associar, não tinha a mesma intensidade que ela havia sentido antes, talvez pela proximidade, talvez pela maneira como o perfume em contato com a pele se tornasse mais suave.

Seus passos até o banheiro foram apressados e durante todo o trajeto ela declamara seu mantra para aquele momento, esperando com a pouca força que ainda lhe restava que a mancha saísse. Delphine não sabia o que havia passado em sua cabeça para aceitar a oferta de Cosima em ficar com o casaco. Nunca em sua sã consciência Delphine Cormier faria algo tão insensato como ficar com algo que não lhe pertencia, mas o sorriso daquela mulher, e a preocupação que ela demonstrou pelo desastre que havia causado, derrubou aquela barreira, e enquanto friccionava o papel embebido em sabonete líquido por sobre o tecido claro desejou que aquilo fosse o suficiente para que a mancha sumisse, mas não foi.

- É! Cosima tinha razão. – Delphine inspirou profundamente - Não vai sair! – proferiu conformada enquanto encarava seu reflexo no espelho. Sua face estava mais apresentável que naquela tarde, mas não menos cansada. Seus pensamentos a assombravam e a vontade de fazer algo imprevisível tomando forma. Ela pegou o casaco que havia colocado sobre o ombro e em apenas dois movimentos o vestiu. Seria tão mais fácil vestir aquele objeto se a lembrança de sua dona tão encantadora não povoasse sua mente. Sabia que seria uma tortura sentir o cheiro dela, impregnando suas narinas, fazendo a lembrar daquele momento em que a conheceu. A peça pareceu curta e Delphine esticou os braços de forma paralela, onde constatou que por ser mais alta que Cosima o casaco realmente havia ficado curto na manga, mas por terem o mesmo biótipo corporal todo o restante serviu perfeitamente.

Delphine cruzou as laterais do casaco e amarrou-o na cintura, ignorando a diferença aparente nas mangas. Gostava da forma como o vermelho contrastava com sua pele clara e mesmo vendo que seu vestido havia ficado completamente encoberto, optou por ficar com aquele visual, já que era ou aquilo ou ficar com o vestido manchado. Ela estava confusa quanto às sensações despertadas por aquela mulher tão gentil. Não sabia se queria encontrar Cosima quando saísse dali, muito menos sabia o que tudo aquilo significava, já que era tudo tão novo.

Desde a adolescência Delphine se questionava sobre sua sexualidade, e tinha uma mente aberta, primeiramente por causa do primo, e posteriormente porque como mulher achava estranho seu pouco interesse por homens, mesmo envolvendo-se algumas vezes com alguns, sabia que faltava alguma coisa, e mesmo não sabendo do que se tratava acreditava que nenhum homem era o que bom o suficiente, por isso evitava se envolver.

As poucas vezes que se deu a oportunidade não estranhou que após algum tempo se desinteressasse, optando por terminar o que mal havia começado. Talvez estivesse à procura de alguém que não existisse, talvez estivesse procurando demais, talvez estivesse idealizando demais. Aquela confusão a lembrava que tinha sérios problemas em confiar e envolver-se com outras pessoas, e que independente do gênero, a índole humana era sempre a mesma, sua vida havia lhe ensinado, em algum momento, as pessoas sempre a decepcionariam. Não iria passar por tudo aquilo de novo. Era melhor não criar expectativas com ninguém. Não por uma desconhecida.

Defy ThemOnde histórias criam vida. Descubra agora