17 - Quando fui abandonada uma segunda vez pelo demônio

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Charlie

Acordei assustada dentro da banheira que estava com a água gelada. Comecei a tremer de frio enquanto saía e me enrolava no meu roupão, imaginando o que teria acontecido. Onde estava Alexander?

Olhei em volta e vi que tínhamos inundado todo o banheiro. Senti um pouco de vergonha e vazio enquanto lembrava os momentos íntimos que tive com Alexander. Aquele tinha sido um dos momentos mais importantes da minha vida – mas como sempre havia acontecido nos últimos 6 anos, em qualquer situação que fosse, acordei sozinha.

Com os olhos marejados, fui até a lavanderia e peguei o rodo – não queria que Rose se estabacasse inteira no chão por minha culpa.

Quando saí do banheiro dei de cara com um Alexander quieto, me olhando profundamente. Ele estava encostado na parede entre as portas do meu quarto e o de Rose. A vergonha varreu novamente meu interior e eu apertei a gola do meu roupão, como se precisasse me proteger.

Será que ele havia se arrependido? Ele nunca me deu qualquer sinal de que queria aquele tipo de coisa... eu que o beijei, eu que o fiz me agarrar... — os pensamentos eram incontroláveis na minha cabeça.

Eu passei por ele e entrei no quarto, fechando a porta atrás de mim, sentindo que as lágrimas já estavam caindo, quentes no meu rosto gelado.

Quem eu achava que era, para ser merecedora de qualquer coisa que fosse boa?

Comecei a me trocar sem me importar realmente com o que estava colocando. Nenhuma roupa me servia bem pois elas ficavam extremamente largas. Ouvi a porta se abrir lentamente e observei, enquanto enfiava uma blusa pela cabeça, Alexander colocar a garrafinha térmica verde de antes e a latinha com alguns pãezinhos em cima da minha cama.

— Coma, ou então você vai ter um colapso — ele pegou um dos pães e enfiou na minha mão, esperando que eu desse uma mordida. Seu rosto estava duro como pedra, e não consegui captar qualquer emoção dele. Meu coração se apertou um pouco mais.

Senti todas as minhas antigas proteções se fecharem. Decidi que o melhor talvez fosse voltar a ser a mesma Charlie de sempre. Eu não viveria com nenhum arrependimento do que fizemos... por mais que eu quisesse que ele também não se arrependesse. Enfiei todo o pão na boca.

— Sabe — comecei a dizer com a boca cheia, parando um segundo para conseguir engolir — não é que eu não coma. É que normalmente o meu corpo expulsa a maior parte da comida. Mas apesar de parecer prestes a quebrar inteira com qualquer vento mais forte, eu sou resistente, tá?

Ele riu e abriu a garrafa, colocando o chá rosa na tampa para eu beber.

— Percebi como você é resistente... — disse com um sorriso sem vergonha no rosto e me ofereceu o copo.

— Vai se ferrar Alexander... — respondi, o aperto no coração dando uma aliviada considerável. Mas a armadura estava lá. Intacta. Ele, por outro lado, parecia ter voltado a ser o Alexander de sempre.

O que havia sido aquela falta de emoções que vi por alguns minutos em seu semblante? Será que ele tinha mesmo se arrependido?

Considerando o que ele havia falado, eu sabia que tinha sido bem resistente ao aguentar toda a sua força e o seu corpo forte. Ele chegou a quebrar algumas partes da borda da minha banheira – o que aliás, eu precisaria dar um jeito de arrumar antes que Daniela voltasse para casa, para não ter que explicar o que tinha rolado no banheiro.

Terminei o chá com um gole e entreguei para ele a tampa, aproveitando para pegar outro pão, enquanto ia buscar uma blusa de frio. Ele podia ser quente, mas eu ainda sentia muito mais frio do que o normal – culpa da falta de gordura corporal.

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