22. Biblioteca

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Enquanto Camile e Denise mantinham uma conversa impossível de se entender, Kim procurava pelas pessoas esquisitas com quem se envolvera, mas apenas Tara, Nico e Noah estavam na mesa em que costumavam sentar, em um silêncio claramente desconfortável.

— Bert está te procurando, Denise? – Denise disse, tocando o ombro de Kim com um sorriso e se afastando das garotas em direção a um garoto de pele escura que parecia feliz em vê-la.

— Eles são o casal mais adorável e irritante daqui – Camile comentou, baixo, enquanto ajeitava a gola da camisa da mais baixa com uma mão. Kim arqueou uma sobrancelha e sorriu, não sabia que Denise tinha um namorado e nem esperava por isso.

As duas garotas seguiram até uma mesa vazia no refeitório. Camile comentava sobre algum garoto com quem se envolvera no Instituto, mas Kim estava distraída demais procurando pelos outros. Estava preocupada, por menos que quisesse admitir.

— Onde está Lukas? – Camile indagou, percebendo a direção do olhar de Kim.

— Não sei – Young-Woo murmurou. Camile soltou um suspiro alto.

— Você e ele... Estão...? – a colega de quarto deu de ombros, separando com a colher sua comida no prato.

— O quê?! – a asiática riu – Não, nós somos amigos. Acho que ele gosta da Tara...

Kim parou de falar, seu sorriso desaparecendo enquanto encarava os olhos arregalados de Camile. Sua primeira reação ao entender o que acontecera foi gargalhar, apenas para esconder o desespero pelo que havia feito. Abriu a boca para dizer algo, mas um chiado de seu walkie-talkie chamou-lhe a atenção.

     — O que foi isso? – a morena indagou, ajeitando seus óculos que escorregavam pelo nariz.

     — Hã... Preciso ir ao banheiro.

     Mentiu a asiática, levantando-se apressada e caminhando até a mesa onde os outros jovens estavam. Tara levantou os olhos de forma tediosa, enquanto Noah e Nico pareceram assustar com a chegada repentina da garota.

     — Olá, Kim, tudo bem? – Nico começou a tagarelar, sorrindo – Você quer sentar aqui também? Os outros sumiram, você viu eles por aí? Lukas e Ronan. E aquela garota de cabelo azul, eu esqueci o nome dela. O cabelo dela é muito legal. O seu também, Tara.

     — Okay... – Kim murmurou, observando enquanto Tara assentia em resposta. A mais nova balançou a cabeça, como se isso mudasse o assunto, apontando para o próprio bolso – Walkie-talkie.

     Os quatro jovens correram para fora do refeitório, ignorando olhares confusos e deixando seus pratos para trás. Quando passaram pela porta, Kim apanhou o aparelho e sintonizou em busca de sinal, até ouvir uma voz ainda um pouco distante:

     — ... Pelo amor de Deus, alguém está vivo? – era Liz, que parecia irritada.

     — Estamos aqui – a asiática disse.

     — Finalmente, porra! – a mais velha exclamou – Onde enfiaram seus walkie-talkies? Achei que deveríamos levar o tempo todo.

     Kim olhou para os outros, que checavam os bolsos. Noah foi o único que encontrou seu aparelho, encarando-o em silêncio. A garota revirou os olhos.

     — O que houve? Onde vocês estão? – Young-Woo indagou, impaciente.

     — No maldito quartinho de limpeza – a outra respondeu – Nós temos um... – antes que pudesse terminar a fala, gritos desesperados de Lukas e Ronan foram ouvidos ao fundo, fazendo com que Noah, Nico e Tara se aproximassem. A voz de Liz tornou-se mais exasperada – Temos um problema muito grande, venham logo. Agora.

...

Todos encaravam a funcionária amarrada, que encarava-os com os olhos marejados. Estavam em silêncio, pensativos, há cerca de cinco minutos.

— Okay – Tara quebrou o gelo – Agora temos sequestro na lista de crimes. Ótimo, parabéns, pessoal!

— Vocês tem – Kim corrigiu, as mãos na cintura – Eu não participei de nenhum dos dois crimes. Na verdade, fui agredida em um deles.

— Você não deixa de ser cúmplice, querida – Liz retrucou, uma sobrancelha arqueada – Você está nessa merda, vai afundar com todo mundo.

Young-Woo abriu a boca para se defender, mas o olhar de repreensão de Lukas fez com que a garota parasse. Tudo o que menos precisavam era de uma briga naquele momento.

— Vamos fazer logo o interrogatório – Ronan falou, apertando a mão de Noah.

Lukas suspirou, aproximando-se da mulher e abaixando-se, mantendo um sorriso gentil no rosto.

— Eu vou tirar esse pano de sua boca, mas você não pode gritar, tudo bem? – ele falou, como se a mulher fosse uma criancinha. Ela assentiu com a cabeça.

McKenzie desatou o nó em sua nuca, soltando sua boca. A mulher ficou em silêncio, os lábios tremendo e as lágrimas escorrendo. Ele se afastou, devagar, as mãos abertas como se acalmasse um animal feroz.

E, quando ele já estava em uma distância segura, ela gritou alto e de forma desesperada. Mesmo com todos mandando-a ficar quieta, ela continuava gritando. O primeiro a ter uma reação foi Ronan, que empurrou a cabeça da mulher contra a parede, fazendo Kim segurar o riso.

A funcionária não desmaiou, mas ficou atordoada. Balançava a cabeça e murmurava palavras inaudíveis. Liz aproximou-se, tentando ouvir o que dizia. A garota prendeu a respiração e arregalou os olhos.

— Corram! – gritou.

Em menos de cinco segundos, os sete pacientes corriam pelo corredor vazio, com um monstro gosmento os perseguindo. Liz e Lukas carregavam esfregões que apanharam no quartinho de limpeza, que deixavam um rastro ensopado pelo linóleo branco.

— Por aqui! – Tara gritou, abrindo uma porta e correndo para dentro.

Era uma biblioteca, local que Kim sequer pensara que existia ali. O Instituto no geral era uma grande surpresa, parecia irreal – de fora, aparentava ser muito menor do que realmente era por dentro.

— Péssima ideia – Nico falou, ofegante.

— Péssima ideia, péssima ideia... – Noah repetiu, encolhendo-se ao lado de Ronan. Nico assentiu.

— Nos filmes que eu assistia, os monstros sempre estavam na biblioteca – ele explicou – Sempre mesmo. Em cima das estantes, pingando no chão. Biblioteca é uma péssima ideia, quero sair daqui. O que vamos fazer? Não temos saída.

— Isso não é um filme, é a vida real – Liz retrucou, o corpo contra a porta, que era esmurrada pelo monstro – Porra, alguém me ajuda aqui?

Kim e Ronan correram até a porta, recebendo certo olhar de desprezo. Liz revirou os olhos, as pancadas ficando mais fortes. A asiática mantinha os pés firmes no chão, os olhos fechados com o esforço que fazia para manter a porta fechada.

— Alguém com mais de meio metro? – exigiu, olhando para Lukas e Tara.

— Não dá! – a indiana exclamou, enquanto tentava empurrar uma mesa de madeira envernizada com a ajuda do loiro.

As pancadas na porta cessaram repentinamente, Kim sentiu seu corpo relaxar e seus músculos pulsarem. Ficaram em total quietude, apenas fitando a porta.

— Será que ela se foi? – Ronan indagou, quase num sussurro.

Young-Woo abaixou-se, encostando a cabeça no chão e observando a fresta que se formava entre a porta e o chão. Não havia sombra do outro lado. Levantou a cabeça para dizer aos outros, mas antes que pudesse o fazer, a madeira estourou em pedaços, os corpos de Liz e Ronan foram lançados em direção a Nico e Noah – que permaneciam paralisados –. Kim permaneceu encolhida no chão, não queria olhar, apenas os sons da briga travada entre todos com o ser era o suficiente.

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