Carolina olhou para baixo, indignada com sua nova reputação, e triste em ver que Daniel, naquele momento, mostrava-se tão desconfortável ao seu lado.
— Não é justo, sabia?! Primeiro eles me pedem uma opinião. Depois eu tento expressá-la da maneira mais imparcial possível, já que não entendo 100% do assunto. E agora, sem mais nem menos, eles me transformam numa nazista, só porque respeitei a liberdade de escolha dos outros!
Meio comovido, Daniel voltou a olhar para Carolina, percebendo que ela, apesar de tudo, não aparentava nervosismo ou tristeza, muito embora suas palavras, carregando o peso da ingrata difamação, queimassem em amargo ressentimento.
Carolina, soltando o braço de Daniel, guardou o celular no bolso e ficou respirando quieta por uns sete segundos, tentando recuperar a postura. Como Daniel não lhe falava nada, e como não sabia o que ele estava pensando, decidiu encerrar o assunto.
— Eu pensei que todos entenderiam se eu dissesse "quem quiser, sinta-se à vontade, pois estamos vivendo numa democracia." Mas a verdade é que todos estão se ofendendo. Então sinceridade? Vou tomar cuidado na próxima vez. Isso tudo é muito chato.
— Eu... acho que te entendo.
— Huh?
— Bem, resumindo, acho que você quis dizer o seguinte: desde que não prejudique os outros e nem descumpra a lei, qualquer um está liberado para usar o serviço da clínica. É isto?
— Sim, é por aí. Assim como implantes mamários, transplantes de cabelo e terapias com células-tronco não afetam minha vida, engenharia genética em embriões também não a afeta. Se isso é um desrespeito aos direitos do embrião, já é um debate diferente. Um debate que, no momento, não sei como deve transcorrer, porque não tenho opinião formada. Mas, no que diz respeito aos casais interessados no serviço, bem... o espermatozoide e os óvulos são deles, portanto podem fazer com eles o que quiserem. A responsabilidade será toda do casal.
Daniel colocou a mão no ombro de Carolina e lhe disse, sorrindo:
— Eu te entendo, Carol. Não te acho preconceituosa.
— Verdade?
— Claro! Muito embora eu reconheça: o tema é polêmico demais. No fundo, existem pessoas interessadas em, como se diz, embranquecer o Brasil, achando que irão transformá-lo numa nova Suíça, ou numa Dinamarca.
— Está falando dos militantes do Patriotismo Bolsonário, não é?! Aqueles que defendem a criação de uma cultura homogênea, igual a da Coreia do Sul.
— Eles mesmos. Inimigos jurados do movimento Café com Leite.
— Eu não sou como eles, Daniel. Eu não quero um país assim, e com certeza não estava defendendo isto no meu vlog.
Daniel piscou para Carolina, afagando-lhe uma das franjas. Agora recuperado do susto, voltou a lhe dedicar boa vontade.
— Relaxa. Acredito em você, tá?!
Carolina, grata pela compreensão, devolveu a ele um sorriso amoroso. Já aliviada, conseguiu se descontrair um pouco mais, dando tapinhas em sua bochecha e dizendo:
— Obrigada. Sabia que você era mais esperto do que a opinião pública.
— Pff, não sou analfabeto funcional pra deixar a Rede Lobo decidir o que penso.
— Sim. É por isso que gosto de conversar com você.
— Mesmo? Que bom. Só toma cuidado pra não se apaixonar, ok?!
— Há! Nem esquenta. Qualquer coisa, aceito a friendzone.
— Tá bom, língua solta. Mas falando sério: o que você vai fazer? Tem muita fofoca ao seu redor.
Carolina cruzou os braços, exibindo um ar de corajosa determinação.
— Eu tenho uma ideia.
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O vlog de Carolina e o feriado antecipado no calçadão
HumorQuando Carolina se tornou vlogueira, ela ainda acreditava no poder da honestidade. Achava que isto sempre falaria mais alto, independente da situação. Porém, ela acabou subestimando o maior vilão deste país: a agressividade da opinião pública brasil...