Angel

61 9 3
                                    

Quando abri os olhos o dia ainda não tinha amanhecido, talvez tivesse dormido por horas, talvez minutos. O sangue já não escorria, porém, minha cabeça ainda doía muito, minha roupa, o vestido daquela maldita festa, estava todo rasgado, e muito, muito apertado devido ao meu filho.

Ainda estava encostada na árvore, o carro de Leonardo saia fumaça, e o gato de fato parecia gostar de mim, estava parado feito uma estátua ao meu lado.

Sempre quis ter um animal, mamãe nunca deixou, dizia que eu não tinha "responsabilidade" o suficiente. Queria saber o que se passou na cabeça dela quando me viu grávida então, estava sendo forçada a "criar" maturidade.

- O que eu vou fazer com você em? - Disse ao meu mais novo companheiro que começou a se roçar nas minhas pernas quando me levantei. - Acho que preciso te dar um nome. - Forcei para me manter em pé, precisava seguir em frente.

Peguei ele no colo e o olhei no olho, aparentou não gostar.

- O que acha de Kenay? - Minha mãe tinha um livro de nomes na estante da nossa casa, o descobri quando eu tinha uns 10 anos e sempre que podia, lia e me imaginava com um deles. Em um dia desses, encontrei esse; Kenay significa guerreiro, forte, corajoso. Acho que se encaixava bem com ele.

Miou, encarei como uma aprovação e o coloquei no chão.

- Você vem comigo? - Disse indo de volta a estrada, isso deveria terminar em uma avenida, qualquer coisa seria melhor do que permanecer dentro da floresta.

Num ato rápido, Kenay pulou na minha frente mechendo freneticamente as orelhas, logo em seguida, também comecei a ouvir passos.

- Olhem, o carro de Leonardo! - Um homem gritou.

- Ela não deve estar muito longe!

Luzes de lanterna começaram a vir na minha direção, eram os capangas de Lúcifer.

Tentei correr o mais rápido possível mas tudo doía e a barriga não ajudava. Logo eles conseguiram me identificar.

- Ali está ela! - Mais ou menos uns seis homens começaram a me perseguir.

Me enfiei mata a fora, Kenay começou a correr na minha frente como se me guiasse, só agora tinha me dado conta de que ele não tinha me abandonado.

Tiros começaram a ser disparados, olhava para os lados procurando algum lugar para me esconder mas não parecia haver nenhum.

- Não podemos mata-la! - Um dos capangas gritou, os passos diminuíram até que não ouvi mais nada.

Tomei um pouco de distância, estava muito longe da estrada, fadigada, não tinha sinal de ninguém por aqui, as folhas eram úmidas e insetos passeavam sobre meus pés descalços já cobertos por machucados.

- Que merda de dia é esse? - Me perguntei chorando, realmente sentia muita falta de Leonardo agora.

- Você não tem idéia do que estar por vir. - Um dos caras de Lúcifer pareceu não desistir da busca e me encontrou, deu uma coronhada na minha cabeça, caí de joelhos no meio das folhas. - O chefe vai adorar ver isso! - Falou com um certo entusiasmo na voz.

- Por favor, não faça nada comigo! - Pedi baixinho chorando, sentia minha cabeça sangrar outra vez.

- Ei, pessoal! - Deu uns cinco passos de distância de mim. - Eu a encontrei!

Aproveitei o minuto de distração, tirei forças de onde não sabia que tinha me levantei e corri.

- Desgraçada! - Gritou engatilhando a arma começando a atirar. - Volte aqui!

As lágrimas me atrapalhavam a enxergar mas não parava de correr. Pensava o tempo todo na vida ótima que eu tinha, preferia mil vezes tudo de volta mesmo sabendo que era tudo mentira. Sentia as balas passando perto de mim, quando uma acertou de raspão no meu braço esquerdo e outra acertou minha perna.

Uma dor aguda me preencheu, as forças pareceram sumir, meu corpo caiu imediatamente e por falta de sorte, foi exatamente em um barranco.

Rolei morro abaixo pensando se sobreviveria a essa noite, caí em um riacho que estava quase secando, queria gritar mas despertaria ainda mais a atenção para mim.

Levantei a cabeça com um pouco de dificuldade e olhei minha perna, o tiro tinha pegado em cheio na minha  um enorme buraco havia se formado e sangrava muito. Machucados estavam espalhados pelo meu corpo e até meus órgãos pareciam estar fora do lugar.

- Ah, não. Merda! - Tentei me mexer mas a dor foi insuportável. - Puta que pariu, que droga! - Fechei meus olhos e me permiti sentir tudo aquilo, a dor, a água passando pelo meu corpo, as lágrimas saindo de meus olhos, quando comecei a sentir algo que ainda não tinha sentido.

O pé da minha barriga começou a doer absurdamente, o fato que passou pela minha mente me fez entrar em desespero, ergui o meu tronco e quando olhei para a água que corria no meio das minhas pernas me desesperei.

Sangue, estava perdendo o bebê.

Unidos pela LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora