Christiano estava claramente nervoso com o fato de ter que ir a um almoço na minha casa com os meus pais e eu não podia negar que também estava.
Minha mãe soube que eu namorava o Christiano quando eu mesmo contei a ela em meio as tantas lágrimas que derramei quando ele foi embora, mas depois daquilo nunca mais conversamos sobre e até quando contei a ela que Christiano estava de volta em seu antigo apartamento e que voltara a estudar na mesma escola que eu, também não mencionei nada sobre namoro com ele. Ou seja, meus pais sabiam. Isso era óbvio, pois eles eram extremamente compreensíveis com a quantidade de vezes que eu dormia na casa do Christiano e o tempo que passava com ele, mas sem perguntar nada. Agora estava na hora de dar um passo na nossa relação. Finalmente contar e não precisar, dali em diante, ter que omitir o nosso namoro.
- Cara, se eu te falar que estou nervoso, você vai acreditar? - disse ele passando a mão na testa. - Será que vão gostar de mim?
- Chris - eu disse acariciando sua orelha. -, meus pais já te conhecem e já gostam de você. Relaxa.
- É, eu sei, mas agora é diferente. Eu estou realmente nervoso. - disse ele gargalhando.
Caminhamos pelo sol escaldante de domingo a caminho da minha casa. Quando chegamos lá, minha mãe estava terminando de cozinhar e meu pai terminando de pôr os pratos e talheres na mesa.
- Chegamos. - eu disse fechando a porta.
- Chegaram bem na hora. - disse minha mãe.
- Boa tarde. - disse Christiano.
- Boa tarde, Christiano, como você está? - disse minha mãe colocando o pano de prato sobre o ombro e dando um abraço nele.
- Estou bem... - Christiano virou-se e apertou a mão do meu pai. - Tudo bom, Seu Gilson?
- Tudo ótimo, rapaz. Não precisa me chamar de 'Seu Gilson' não. - disse meu pai dando sua gargalhada nada discreta.
- Ok. - disse Christiano com um sorriso largo no rosto.
- Falta pouca coisa e já poderemos almoçar.
Acabei ficando na cozinha ajudando minha mãe e Christiano naturalmente foi para a sala junto com o meu pai. Comecei a cortas algumas folhas de alface para adiantar as coisas enquanto minha mãe estava no fogão...
- O Christiano está um pouco nervoso. - eu disse.
- Nervoso por quê?
- Sei lá. Só sei que ele está meio nervoso por causa desse almoço.
- Bom, se ele está nervoso pelo menos consegue disfarçar bem. - disse minha mãe apontando pra porta.
Olhei pra porta e de longe vi Christiano conversando todo empolgado com meu pai. Uma corrente de felicidade pareceu me consumir por inteiro ao ver aquela cena, os dois homens da minha vida conversando e se dando muito bem. Por pouco tempo meu pai saiu da sala e Christiano ficou sozinho sentado na ponta do sofá. Ele me olhou e sorriu assim que nossos olhos se encontraram, mas logo em seguida sua atenção se voltou para meu pai que estava de volta segurando um dos seus barcos de madeira. Esse barquinho meu pai tinha feito em casa quando eu tinha uns nove anos, ele era apaixonado pelo pequeno barco feito por ele e sempre se gabava por ter conseguido tal façanha.
- Marcos? - disse minha mãe depois de me cutucar.
- Oi.
- Ta viajando aí, é? - ela riu. - Você gosta muito dele, né?
- Muito. Somos importantes um para o outro.
- Posso perguntar uma coisa?
- Pode.
- Vocês já...? - perguntou ela com uma cara muito engraçada.
- MÃE!
- Que foi? Só queria saber...
- Não vou responder essa pergunta. - eu disse rindo.
- Deixa de ser bobo... Vamos levar essas coisas pra mesa e almoçar logo.
Durante o almoço a mesa estava farta de comida, conversas e risadas. Meus pais encheram o Christiano de perguntas naquele almoço. Aproveitaram pra perguntar tudo o que nunca perguntaram durante o tempo que nos conhecíamos.
- E seus pais, Christiano? - perguntou meu pai.
- Meus pais moram no Canadá.
- Ah claro. Por isso você passou um tempo fora. Agora que me lembrei. E então você fica aqui sozinho?
- Sim, mas meu irmão mais velho às vezes vem de Brasília pra ver como eu estou e se está tudo certo em casa. - disse Christiano com um sorriso sem graça.
- Mãe, tem sobremesa? - eu disse na intenção de tentar mudar de assunto.
- Eles sabem sobre você?
- Pai! - alertei.
- Ta tudo bem, Marcos. - disse Christiano com um pequeno sorriso no rosto. - Eles sabem sim, mas não aceitam. Pro meu pai qualquer coisa seria melhor do que ter um filho homossexual.
- Isso é tão bizarro. - disse meu pai indignado.
- É. E eu decidi ficar longe deles. É melhor pra mim e eu estou feliz desse jeito.
- Por isso você voltou pro Brasil, não é? - perguntou minha mãe.
- Na verdade eu fugi de lá. Consegui um dinheiro e pude voltar.
- E eles não entraram em contato nunca mais?
- Nada. Desde então eu não falei mais com eles.
- Vamos mudar de assunto? - eu disse.
- Querem sorvete? - perguntou minha mãe se levantando.
- Deixa eu te falar uma coisa. - disse meu pai. - Nós sempre soubemos que vocês tinham algo mais forte que apenas amizade. Sempre soubemos e percebemos naquele dia que você chegou com o Marcos nos braços depois daquele episódio terrível onde ele foi agredido. Percebi pela maneira como você olhava preocupado para a situação e tentava não transparecer aquele turbilhão de coisas que estava sentindo. A gente sempre soube. De verdade. E nós nunca tocamos no assunto, pois não queríamos nos intrometer na vida pessoal do nosso filho e nem que ele se sentisse acurralado com os pais perguntando o que estava acontecendo entre ele e seu amigo. Permitir e aceitar que ele pudesse fazer suas escolhas sem ser interrogado sempre foi o lema dessa casa. É claro que sabíamos que tudo isso aí - disse ele apontando para nós. - era muito mais complexo que uma simples amizade, afinal de contas o Marcos dorme mais na sua casa do que aqui, não é?
- Verdade. - concordou Christiano rindo.
- Eu não vou esticar demais esse assunto porque Marcos sabe que se deixar eu fico horas fazendo discurso e eu não quero cansar vocês. - disse meu pai apoiando os braços em cima da mesa. Christiano olhando atento para ele. - Só achamos que depois desse tempo todo seria importante que, mesmo que não tenham assumido isso antes, nós sempre soubemos e nunca houve e nem haverá problemas por isso. Aceitamos nosso filho do jeito que ele é e aceitamos você como namorado dele. Eu não teria como não aceitar alguém que ama o meu filho e tem tanta preocupação com ele como você tem. É isso o que tínhamos para falar. - disse ele olhando para a minha mãe, que concordou balançando a cabeça e com um sorriso no rosto.
- Eu não sei o que falar. - disse Christiano. - Eu já tinha dito para o Marcos que ele tinha muita sorte de ter vocês como pais. Em poucas horas eu me senti mais acolhido aqui do que em toda a minha vida morando com os meus pais. Eu agradeço todo o carinho e fico feliz por poder ser o namorado do Marcos.
- Só te peço pra não inventar de ir embora de novo. - disse meu pai e todos nós rimos. - Você tinha que ver como esse menino ficou sem você aqui.
- É? - Christiano me olhou com um sorriso no rosto e fingi que não dava confiança para ele. - Agora eu não vou embora pra lugar algum.
...
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O Amigo - 2ª Temporada
RomanceSegunda temporada do romance O Amigo. A primeira temporada está em REVISÃO.