Capítulo 31 - Vindo à tona

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Capítulo 31 - Vindo à tona

         Felipe quase destruiu a cozinha com sua falta de habilidade culinária, mas conseguiu preparar um desjejum aceitável aos seus olhos. Aurora acordou com o cheiro da gordura impregnado no ar e se arrastou, de camisolão mesmo, empurrando as cortinas. Ela, surpreendentemente, se deparou com o marido e franziu o cenho, preocupada.

- Felipe! O que ainda está fazendo aqui?

- Cuidando da minha esposa.

- Você não está atrasado?

- Sente-se. Vou trocar o curativo.

- Felipe!

- Se fosse o meu braço, o que você faria? – Ele rebateu e afastou a cadeira da mesa, de modo que Aurora pudesse se sentar.

        A guardiã cedeu com receio e estendeu o braço, enquanto seu marido desenrolava o pano branco. Ambos ficaram impressionados ao constatarem que o ferimento tinha apenas metade do tamanho inicial.

- Que cura rápida! Amanhã mesmo deve estar perfeito, ou em dois dias! - Felipe se animou.

      Aurora assentiu, impressionada. Seria bom parar de sentir dor.

- Já que estou melhor, você está liberado para cortar as minhas amigas árvores. Vai se prejudicar se não aparecer por lá.

     Felipe suspirou, ciente de que a esposa tinha razão.

- Será apenas um atraso, então. Vou passar babosa na queimadura.

      A moça assentiu, enquanto o conversador tratava aquele braço como se fosse um bebê, com todo o cuidado possível. Depois de cobrir o ferimento, ele se esgueirou, deu um leve beijo em Aurora e afagou seus cabelos.

- Não queria te deixar aqui sozinha.

     Aurora sorriu.

- Eu tenho meus livros, nunca estou só. Vá, senão vão brigar contigo – a guardiã se levantou e deu um beijo demorado no marido, o abraçando. Acariciou o queixo dele e agradeceu pelo cuidado.

     Felipe saiu às pressas, ainda que sem nenhuma vontade de se submeter ao autoritarismo do chefe Cam.

     Por sua vez, Aurora, dentro do casebre, reparou numa trouxa pequena que estava sobre o banquinho ao lado da bacia de água da cozinha. Ela não fazia ideia do que era aquilo, e curiosa, se aproximou para abrir. Arregalou os olhos ao se deparar com um cantil de chá, uma laranja, algumas uvas verdes e uma coxa de frango embolada numa toalha felpuda que deixou fiapos sobre a carne. Deveria ser o almoço de Felipe. A moça pensou em correr atrás do marido para entregar o lanche, mas ponderou que seria melhor incrementar aquela comida antes e fazer uma surpresa. Estava mesmo ansiosa para saber como era o ofício de lenhador, preocupada com a leve tristeza de Felipe e compadecida dele comer tão mal, então uniria o útil ao agradável.

***

     Branca chutou a saia longa do vestido que atrapalhava seu caminhar. Ainda assim, era bonito demais para não ser usado, e ela era uma rainha vaidosa. Arrumou os cabelos com as mãos, já familiarizada com o novo comprimento. Esperava estar apresentável diante do par de olhos julgadores que iria enfrentar.

     Ela encarou a enorme cerca viva que contornava o castelo do terrível rei Artur, atual morada de seu irmão gêmeo. Branca franziu o cenho e se sentiu apreensiva. Sabia que o que ia pedir a Henrique seria difícil para ele. Contudo, se ele não cedesse, seria doloroso para ela.

O Conto dos Contos 2 - A Lenda do Era Uma VezOnde histórias criam vida. Descubra agora