Mudanças

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Passaram-se alguns dias desde que fui nomeada Socorrista e, ironicamente, foi o período em que todos resolveram ficar bem para me poupar de algo interessante para fazer. Não precisei chegar perto da Sede uma única vez. Ninguém sequer ralava o joelho. Parecia que Gally havia conjurado campos de força ao redor dos Clareanos.

— Se divertindo? — Thomas perguntou com os braços apoiados sobre a bancada da Cozinha, observando-me lavar os pratos do almoço.

— Engraçadinho. — ironizei.

— Achei que tivesse dito que ficou desesperada com o caso do Newt e não estava tão empolgada para fazer aquilo de novo.

Eu dissera. Thomas já havia se tornado meu confidente e eu a dele. Tudo o que não dizíamos para os Clareanos, dizíamos um para o outro. Não eram confissões muito profundas, mas era bom desabafar com alguém sem receber uma patada no final, como Mike fazia.

— É, mas mesmo assim... Talvez uma hora eu consiga me controlar. — respondi e guardei o último prato. — Como vão...

— EI! — um berro raivoso veio do lado de fora e nós dois olhamos na direção da Clareira. Saímos curiosos para ver o que acontecera e encontramos Mike e Gally frente a frente, respirando arduamente como touros raivosos, os punhos cerrados ao lado do corpo. Newt vinha correndo dos Jardins, uma mão calçada com uma luva grossa e a outra largando uma pequena pá no chão.

— Não olhe para mim outra vez. — Mike mandou, apontando um dedo para Gally, a voz trêmula e grave de tanta raiva que parecia conter. Gally empurrou sua mão para longe e, antes que pudesse fazer mais alguma coisa, Newt o afastou.

— Que mértila, vocês dois. — ele resmungou. — Vão fazer alguma coisa de útil nessa porcaria.

— Mande-o fazer direito então. — Gally disse.

— Por que não resolve as coisas sozinho? — Mike indagou, aproximando-se outra vez e quase passando por Newt, que o empurrou de volta para mais longe. Gally aproveitou-se da distração dele e compeliu o líder para o lado. Instintivamente, com apenas dois passos largos, coloquei-me na frente de Mike, segurando seus braços atrás de mim para garantir que Gally não conseguisse chance de atingi-lo; mas eu não esperava pela força que ele usou para me empurrar.

Senti o lugar passar pelos meus olhos rapidamente e então minha testa chocou-se contra uma rocha do chão. Apertei os olhos com a dor, odiando-me pela maldita mania de me meter nas coisas. Ouvi uma movimentação de vários pés ao redor e então senti uma respiração pesada acima de mim.

— Tudo bem? — Newt perguntou. E o sotaque dele soou tão leve que foi como se tivessem colocado um pano quente sobre a minha testa. Sua mão rodeou meu braço para me ajudar a levantar e ele ainda me encarava, provavelmente esperando resposta.

— Estou bem. — afirmei. Seu olhar voltou-se para a minha testa e eu não soube dizer se a careta foi pelo sol contra seu rosto ou pelo que viu.

Thomas estava atrás de Gally, segurando-o pelos braços com uma força desnecessária. Mike se afastava, indo para a área dos Construtores dando breves olhadas raivosas para o outro. Gally olhou para mim e me surpreendeu com a expressão melancólica e culpada que tomou conta de seu semblante.

— Foi sem querer... Eu não... — começou, mais para Newt do que para mim, mas não terminou. Vi o maxilar de Newt se mover quando o cerrou, mas não parecia com raiva.

— Leve-o para o Amansador. — ele disse simplesmente e desviou o olhar, e outro garoto aproximou-se para ajudar Thomas.

Gally pareceu assombrado, mas não contestou; deixou que o guiassem.

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