Abaixo de 0 graus

141 15 2
                                    

Gally e eu entramos na sala de cirurgia outra vez. Olhei para Newt e para Mallory, pronta para correr e ir checar sua respiração caso ela dissesse algo, no mínimo, desagradável.

— A bala afetou o lobo frontal e uma parte dos temporais quando o atingiu. – a cirurgiã disse para o chão.

— Eu não vi nada disso. – repliquei.

— Claro que não, estava chorando a operação inteira. Eu precisaria de uma tomografia para saber com precisão, mas já vi um caso assim, tenho quase certeza de que ele sofrerá sequelas.

— De que tipo? – Gally perguntou.

Mallory abriu a boca para responder, mas se interrompeu ao perceber que eu sabia a resposta. Cocei nervosamente a cabeça ao falar:

— Vai ter problemas com a memória ou os movimentos... Só vamos saber quando ele acordar. Isso se as convulsões não começarem a se manifestar agora.

Eu me afastei deles com a mão na cintura, tonta ao entender que eu era a razão das sequelas. Mallory poderia ter evitado algumas delas com os exames pré-operatórios. Abaixei a cabeça de olhos fechados, sentindo uma lágrima molhar minha bochecha esquerda. Aquilo seria ruim de tantas maneiras e de um jeito tão grande que não havia como pôr em palavras.

— Certo, mas ele está infectado. Isso tudo não vai fazer diferença nenhuma quando ele se transformar. – Gally disse, tão frio que senti meus braços se arrepiarem.

Voltei-me para os dois, demorando meus olhos nele por um tempo.

— Olha, foi mal, mas é a verdade. Mesmo com a cura, o que você esperava fazer com ele enquanto estivesse sendo produzida? – ele disse.

Mirei o chão, constrangida com aquela pergunta, porque meu desespero se concentrara em, pelo menos, tirar a bala e fazer Newt sobreviver até o fim da cirurgia.

Contudo, Mallory movimentou os pés para trocar de posição, cruzando os braços e fitando o lado oposto da sala.

— O quê? – indaguei com selvageria.

— O quê? – ela replicou.

— Sei que está pensando em alguma coisa.

— Estou esperando você criar maturidade e acabar com o sofrimento dele.

Precisei de alguns segundos para captar direito sua fala e meu sangue ferver o suficiente para me impelir na direção dela e fazê-la bater contra o armário de vidro atrás de si.

— Salvei sua vida naquele beco, não pense que não posso fazer o contrário. – blefei num chiado raivoso, quase tocando meu nariz no dela, amassando sua camisa nas mãos. Eu me lembrava dessa sensação de querer tanto machucar alguém, mas o cheiro e o gosto de coisa queimada da última vez não veio.

— Não vou alimentar sua falta de bom senso, Jordan. Vai ter que aprender que nenhum médico pode pensar do jeito que está fazendo agora. – ela tinha a voz firme, como se soubesse que eu não era capaz de fazer nada.

— Seu trabalho é contornar a morte, por que é tão difícil fazer isso agora?

— Porque não sei que história é essa de produzir uma cura, mas, se for demorar tanto tempo quanto estou imaginando, não tem ciência ou religião que o livre dessa. – ela fez a sentença de modo tão seco quanto Gally. As linhas de cor vinho que dançavam na minha visão com a voz dela tinham se tornado negras.

— Você precisa ser tão fri...

Eu parei de falar no instante em que minha mente clareou, e de repente não vi mais necessidade em ameaça-la. Eu me afastei dela olhando para o chão, deixando meu cérebro trabalhar. O cheiro de pinho quase me sufocou.

Socorristas  | Maze Runner ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora