Por um segundo de sanidade

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— Por favor, Tommy. Por favor.

Meu corpo se projetou para frente. Eu ouvi um tiro.

O pânico, a tristeza e a urgência se avolumaram dentro de mim, ganhando o mesmo poder que aquela bala tinha. A surdez momentânea dizimou a noção de quem eu era e de onde eu estava. Apenas senti o choque do meu queixo contra o ombro de Newt, e minha mão sendo ralada pelo asfalto. Eu quase podia sentir a transição de velocidade dos meus batimentos cardíacos. Com o receio à flor da pele, encarei Newt.

Ele estava deitado, imóvel, de olhos fechados, exatamente como quando sofreu a parada cardíaca. A diferença era de um buraco manchado de sangue em sua testa. Levei algum tempo para me situar.

— O que você fez...? – eu sussurrei, deslizando as mãos pelo peito e rosto de Newt. — O que você fez?

Ouvi Thomas se levantar num salto, desajeitado, mas não consegui tirar os olhos de Newt. Eu tremia, mas não sentia direito meu corpo.

— Newt, não...

— E-ele me pediu. Nelly, ele...

— Newt...

Eu ouvia, mas só queria que o mundo parasse. Newt não dava o menor sinal de vida, e a cada segundo que se arrastava eu esperava encontrar um ferimento de bala em mim, não nele. Como aquilo tinha acontecido? Instantes atrás ele estava por cima de Thomas... Dias atrás ele tomava as próprias decisões... Como agora ele simplesmente não estava mais ali?

Eu não encontrava palavras. Queria chama-lo, dizer que podia acordar e eu não o deixaria mais sozinho, dizer que ele não precisava mais ter medo de se perder para o vírus... Mas eu não conseguia...

Por que o tempo continuava passando? Por que aqueles Cranks continuavam brigando? Por que alguém gritava por Thomas? Por que, diabos, o maldito sol estava do mesmo jeito?!

— Eu sinto muito, Newt, eu sinto tanto... – dizer aquilo era exatamente o mesmo que destroçar minha alma com a lâmina mais letal que existisse.

Acariciei seu rosto outra vez, e de repente percebi que devia ter feito isso mais vezes, com tanta delicadeza quanto agora. Eu sentia, mais do que nunca, a dor daquilo. Toda a dor que ele passara, da tentativa falha de se livrar dela, do peso que carregava desde então... Newt tinha uma irmã... O quanto ele seria feliz ao lado dela ninguém descobriria...

Ele parecia tão calmo agora, livre do Fulgor, livre do mundo horrível em que tinha sido colocado. Livre da responsabilidade de ser o Grude, de ser o líder. Tantas vezes eu o tinha pressionado a ser o que ele não queria...

Minha testa tocava o peito dele, meus soluços balançavam meu corpo e preenchiam o ar. Eu segurava sua mão contra mim, desejando dar a ele tudo que ele precisava. Aquilo não era o mesmo que foi quando perdi minha mãe, nem de quando perdi Bruno. Eu soube o que acarretaria a partida deles. Com Newt, a profundidade daquele abismo simplesmente não podia ser vista.

Por que eu tinha demorado tanto?

Alguém cercou minha cintura para me puxar para longe dele e eu empurrei quem quer que fosse. Eu não sabia por quê. Quando Newt realmente precisava de mim, eu estava atrás de uma cura que podia sequer funcionar.

— Ele se foi, querida... Ele se foi...

Com uma força descomunal, agarrei as roupas de Mallory e a aproximei do meu rosto.

— Diga isso mais uma vez! Diga isso... – minha voz falhou, do mesmo modo que eu podia sentir fazerem as batidas do meu coração, e o repentino ódio foi embora, dando lugar a algo muito mais forte que tristeza. Era muito mais forte que qualquer coisa que eu já havia sentido, e eu sabia que não era capaz de carregar comigo. Não outra vez...

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