Denver e sua alma desintegrada

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Consegui uma tranca para as portas do laboratório no começo da tarde, e saindo da floresta, comecei a imaginar uma grande tragédia acontecendo caso aqueles Cranks conseguissem se soltar das correntes. Minhas entranhas se reviravam pensando nos utensílios sendo destruídos.

Eu estava ponderando sobre voltar e manter tudo no prédio que usava de abrigo, quando uma voz retumbando por toda a rua me distraiu desses pensamentos. Havia um rosto imenso projetado por tecnologia numa construção alta, falando num tom inumano, robótico, mas não por causa da computadorização. Ava Paige nunca parecera ser da raça humana.

— Repito: estamos em estado de emergência.

Em seguida, ela desapareceu. Continuei encarando a grande tela, sentindo a raiva crescer e borbulhar como um monstro faminto dentro de mim. Se eu pudesse agora estar tão perto dela como estive ao sair da Clareira...

Uma mulher gritou de algum lugar acima de mim e a janela mais alta de um dos prédios se desfez em vidro, logo antes do corpo de alguém despencar de lá e bater no chão, do outro lado da rua. O sangue e a carne espalhados prenderam minha atenção por longos segundos, até outro aparecer na janela e gritar em vitória. Estava muito longe para eu poder ver direito, mas tive certeza de ser alguém consumido pela Insanidade. Mas o que ele estava fazendo ali? Todos os Cranks estavam no Palácio ou bem longe de Denver.

Como se ouvisse minhas dúvidas, uma dezena de pessoas saiu caminhando de trás do prédio, rindo, conversando e comendo. Comendo um braço. Esquivei-me para detrás das árvores o mais rápido que pude, e um deles olhou na minha direção. Achei que ele viria até mim, mas não pareceu me ver e voltou-se para seu grupo, e eles seguiram pela rua como adolescentes pós-festa. Eu chamaria aquilo de estado de emergência.

Lembrei-me do que Thomas dissera sobre os Cranks do Palácio quererem fugir de lá e fiquei me perguntando por que só agora a cidade fora colocada sob aviso.

Agarrando um pedaço longo de madeira do chão, contornei o prédio de onde a mulher caíra, a fim de encontrar respostas para aquilo; afinal, isso envolvia Newt. Um beco comprido se estendia por vários metros, recheado de corpos. Qualquer coisa do almoço do dia anterior que tivesse sobrado no meu estômago voltou pela minha garganta com o cheiro e a cena. Eu vomitei água sobre os degraus de uma escada e senti que não pararia enquanto estivesse cercada daquele cheiro. As pessoas estavam destroçadas ao longo do asfalto, algumas gemiam ou soltavam seu último suspiro, enquanto alguns de seus membros produziam reflexos.

Abaixei-me sobre os poucos que ainda respiravam, para tentar salvá-los de algum jeito. No entanto, quem tinha feito aquilo não pretendia que sobrevivessem.

Eu me ergui e olhei ao redor, cobrindo a boca com o dorso da mão, aterrorizada com aquilo. A cura não poderia ser trabalhada numa cidade assim. Meu coração deu um pulo ao lembrar do laboratório, parecendo agora muito mais vulnerável aos Cranks, mas o que fiz foi tirar da minha bolsinha o aparelho que localizava Newt. Antes que eu pudesse apertar o botão, um som rouco e estrangulado chegou aos meus ouvidos.

Um dos corpos movia a perna em espasmos atrás da quina do prédio e, quando me aproximei, pude ter certeza de que não era um reflexo. Uma mulher que poderia se passar por Imune sangrava pelo abdômen e claramente tentava dizer alguma coisa. Ergui sua blusa apenas para ver que o Crank que a machucara devia estar com pressa ao fazê-lo, pois não tinha chegado a acertar uma área fatal. Não confiei em nada que estava ao meu redor para estancar o sangramento, então arranquei minha própria camisa, ficando de sutiã, enrolei-a até que pudesse cobrir por inteiro o ferimento e pressionei com força. Meus ferimentos nas costas gritaram em protesto, como se reconhecessem o Fulgor espalhado no ar.

Ela continuava tentando dizer alguma coisa e começava a ficar vermelha.

— Ei, ei... Se acalme, você vai ficar bem.

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