CAPÍTULO 38-O TORMENTO DE ÁLEX

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Álex dispensou a mulher que vinha fazer a faxina todas as semanas, pois queria ficar sozinho.

Para passar o tempo, decidiu ele mesmo faxinar o apartamento. Ao final do primeiro dia, já não tinha mais nada pra fazer. Não tinha vontade de ler, entrar nas redes sociais, ver TV...não conseguia fazer nada a não ser esperar e esperar.

Sabia que aquele era apenas o final do primeiro dia e ele não sabia por quanto tempo Tiago ficaria lá dentro do quarto da iniciação. Adquiriu o hábito de ficar por horas e horas parado em frente à porta, como se, fazendo assim e passando energia positiva para o seu amado, ele fosse vencer aquela provação mais rapidamente. Ele meditava, entoava mantras, energizava Tiago mentalmente.

Álex sabia que não poderia sair de casa. Fora por isso que mandara Tiago mentir para as amigas que eles viajariam para um lugar onde não haveria comunicação. Mandara ele falar que ficariam fora  por uns dez dias, para que elas não se preocupassem com o silêncio deles.

O segundo dia arrastou-se lentamente, assim como o terceiro. No quarto dia, o fisioterapeuta já não conseguia mais dormir em seu quarto e decidiu deitar-se na porta do quarto da iniciação. 

Álex começou a sentir-se doente, indisposto, sem energia...perdeu a fome. O vazio da casa era quase palpável. Cheirou as roupas de Tiago, alisou os seus objetos pessoais e, de maneira insana, começou a invejar a água que caíra sobre o seu corpo, os lençóis que tocaram a sua pele, aquelas roupas que cobriam os contornos daquele corpo amado.

O vazio da casa invadiu o peito do médico que ficava durante horas sentado, na posição de lótus, em silêncio total, em frente àquela porta que o separava de seu discípulo.

Na manhã do quinto dia, Álex já se encontrava em desespero total, pois nunca alguém, que ele conhecesse, tinha ultrapassado três dias num quarto de iniciação! 

_Um dia é o mínimo...dois é o mais comum...para pessoas difíceis como você, espero o tempo máximo que são três dias._lhe dissera mestre Tanko.

O médico tinha ímpetos de girar aquela chave e abrir aquela porta, mas sabia que não podia. Caso fizesse isso, poderia matar Tiago ou mesmo condená-lo à loucura, ele sabia. Ninguém tinha permissão para interromper uma iniciação daquele tipo, havia lhe dito mestre Tanko, pois os riscos realmente eram imensos.

O fisioterapeuta leu e releu todos os livros que falavam sobre a iniciação apenas para confirmar o que ele já sabia: ninguém ultrapassara os três dias, mas o seu discípulo já estava lá dentro há cinco dias!

A insegurança, o medo e a dúvida vieram atormentar a sua mente naqueles dias: ele tinha se precipitado e Tiago não estava preparado...As roupas, era isso! Não deveria ter permitido que ele usasse as suas roupas, tinha que ser isso...ele tinha que ter exigido que Tiago comprasse roupas novas e não usasse as do seu mestre...

_Uma merda de mestre incompetente...um mestre idiota que nem sabe realmente se mandou o seu discípulo para uma iniciação ou para a sua própria morte...A vaidade é o maior pecado do ser humano e eu, atolado na minha, acreditei que em uma semana conseguiria preparar Tiago. Sou um arrogante...idiota...um irresponsável, isso é o que eu sou..._repetia arrastando-se feito um zumbi pela casa.

Doutor Álex Toledo passava  as noites em claro e já estava sem comer e sem beber por mais de um dia! 

No sétimo dia, entrava e saía pelos cômodos da casa como a procurar por Tiago, mesmo sabendo que ele não estaria ali.

Mais uma vez, parou em frente àquela porta e encostou-se nela, passando as mãos pela madeira como se essa fosse a tampa de um caixão: ali, atrás daquela porta, jazia o seu discípulo ainda imaturo...ainda despreparado...que fora mandado pelo próprio mestre para a morte. Imaginava Tiago lá dentro...imaginava que ele tinha falecido devido à inanição...à desidratação...à falta de oxigenação naquele quarto onde o seu mestre não se preocupara em colocar um sistema de ventilação adequado!

Deprimido, o mestre de Tiago começou a chorar desesperado:

_Então era isso o que queria me mostrar, mestre Tanko?_gritou agoniado._ Esta é a última lição que o senhor queria me dar? Queria me fazer chegar até aqui para me provar a minha incompetência....a minha pequenez diante daquele que tornou-se o motivo maior de minha existência? Então é isso? O senhor o mandou pra mim, fez com que eu me apaixonasse por ele, fez com que eu acreditasse que seria capaz de conduzir este ritual e agora, vai deixá-lo morrer a fim de me castigar por tudo aquilo que eu fiz, pela minha arrogância, orgulho, vaidade, indisciplina...pelos meus pecados, meus crimes cometidos contra todos aqueles inocentes, não é mesmo?

Álex falava parado no meio da casa, olhando a esmo, parecendo um louco que enxergava almas penadas.

_Estou despido de orgulho...de ambição...de esperança...imune à fome...à sede...à dor...ao frio...estou ciente que eu mandei Tiago para a morte...para morte._gemeu enconlhendo-se no chão enquanto chorava convulsivamente.

Como Andreia e Norma encarariam aquele sumiço de Tiago? Será que chamariam a polícia?

Ele seria procurado. A porta seria arrombada. Lá dentro, encontrariam o corpo de Tiago e constatariam o cárcere privado. Ele seria apontado como o monstro que trancara aquele rapaz ali para que ele morresse com fome e com sede.

Novamente, ele teve que se conter, pois estava enlouquecendo ao pensar em ir lá e arrombar aquela porta.

_Mestres, o que eu faço?_falou alto olhando para o teto, enquanto estava sentado num canto da sala, segurando a própria cabeça.

De repente, um som alto chamou a sua atenção.

Cambaleante, o fisioterapeuta dirigiu-se rapidamente ao quarto da iniciação.

Assustado, viu que a porta estava aberta e, lá dentro, ele não encontrou ninguém.

Álex foi até o quarto de Tiago e quase deu um grito quando o viu estirado em sua cama.

O médico andou lentamente, temendo que ele não tivesse resistido e somente tivesse saído para morrer ali fora.

Com passos lentos, aproximou-se da cama.

Assustado, percebeu que a barba estava enorme, os cabelos maiores, como se tivesse ficado por meses dentro daquele quarto da iniciação! A expressão desfeita, lábios ressecados e rachados, como se fosse um homem que tivesse atravessado todo o deserto, tamanha era a desidratação que se percebia nele.

As roupas estavam envelhecidas e pareciam que iriam se desmanchar ao simples toque.

Temeroso, ajoelhou-se perto da cama, observando aqueles olhos fechados.

Com alívio, percebeu a respiração fraca, quase inexistente.

_Você está vivo...você está vivo, meu amor!_chorou aliviado.

O SINAL DE CAIM-Armando Scoth Lee-romance gayOnde histórias criam vida. Descubra agora