9 OS FRUTOS 04

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Neste momento, Patrícia está dentro do carro indo embora. Sentada no banco de trás, ela olha as ruas, a cidade... Vê várias viaturas de polícia rodando, crentes sendo presos, igreja sendo demolidas, outras lacradas, desde a Vila Ruth até a Rodovia Presidente Dutra, indo pela Avenida Coronel Raimundo Sampaio, Avenida Comendador Teles e a Avenida Automóvel Clube. Estima quatro quilômetros de distância, e nesse percurso com um raio de quinhentos metros ao longo da sua extensão há mais de sessenta igrejas: Batista Nova Filadélfia, Deus é Amor, Igreja da Graça, Universal do Reino de Deus, Mundial do poder de Deus, Nova Vida, Igreja do Evangelho Quadrangular, Igreja Obra em Restauração, Igreja Católica, Igreja Cristã, Presbiteriana, Igreja Batista, Igrejas pentecostais, mas, a maioria são templos da denominação Assembleia, que advém do ministério de Madureira, CEADER - Convenção Evangélica das Assembleias de Deus do Estadual do Rio de Janeiro - e muitos outros ministérios assembleianos.

Já chegando à Rodovia Presidente Dutra (vai pegá-la sentido Rio), de cima do viaduto ela vê um congestionamento enorme: são viaturas do COMP, que estão sendo enviadas para cada canto do Estado. Ela vê também vários ônibus do COMP, passando cheios de pessoas que foram presas por não negarem o nome de Jesus, sendo levadas para os campos de concentração. São homens, mulheres, adultos, velhos e adolescentes, muitos com sinais claros de tortura no rosto.

Patrícia pede que o motorista Reginaldo pare o carro no acostamento. Ela já está na Rodovia Presidente Dutra e passa um ônibus com muitos jovens, ela está de pé na pista, olhando tudo aquilo, ela vê a quantidade de ônibus que estão levando as pessoas e Patrícia sabe o que vai acontecer com todas, ela olha para a janela do ônibus cheio de jovens e reconhece uma menina que está presa dentro do coletivo, a menina olha e a reconhece também: era Carla, a filha do pastor, que foi incentivada por Patrícia a assumir que era lésbica para os pais e colocou uma camisa escrito "sou sapatão". Ela está sentada no banco junto da janela do ônibus, apoia as mãos no vidro, olha para Patrícia e vê que a líder militante de equipolência não está mais com a camisa vermelha com o símbolo de proibido por cima da cruz, mas com uma branca com os dizeres "Só Jesus Salva".

O ônibus passa lentamente devido o congestionamento. Patrícia acena para a menina presa, dentro do ônibus, chorando, com peso na consciência, sentindo culpa e muita tristeza.

O motorista Reginaldo a chama para entrar no carro; Patrícia entra e Reginaldo liga o automóvel. Sai do acostamento, entra no enfileiramento de carros congestionado.

Patrícia sabe que não tem mais volta, sabe como é o seu amante e como ele odeia os crentes, ela vai ter de negar a Jesus quando estiver com ele, mas ao mesmo tempo ela se lembra da menina dentro do ônibus, alguns carros a frente dela.

O veículo onde Patrícia está se movimenta, vai um pouco mais à frente e para no local onde, mais cedo, antes do arrebatamento da igreja, ela estava com outros jovens fazendo protesto; ela começa a chorar, se lembra do que fez com os seus pais, a afronta e a falta de respeito que teve com eles e se lembra de incentivar outros a fazerem o mesmo, ela enxuga as lágrimas, o carro onde ela está se movimenta, ela pega o celular liga os dados móveis, e vê que um grupo novo com o nome de Perseguidos a adicionou. Quando ela vê os nomes de quem está no grupo e que são os seus amigos, ela chora de emoção e sorri de alívio e alegria, abre a mensagem para ler, e fica sabendo do que está acontecendo com Matheus, Juliana e o que o policial Charles fez com os pais dela; e fica muito nervosa e comovida e se lembra da promessa que fizeram na sala da casa do Matheus, de não deixarem uns aos outros e não negarem a Jesus.

Ela se lembra da fuga da cozinha quando quase foram presos, do policial que estava atrás dela, pelo protesto que ela e outros militantes fecharam a Rodovia Presidente Dutra, protesto esseque chegou a prendê-la, mas só a liberou pela mudança de vida e de camisa, ela se lembra de tudo o que aconteceu e entende que tudo aquilo tinha um propósito. Ela olha para a frente, vê o ônibus com os adolescentes presos e o outro mais adiante com as pessoas todas marcadas de tortura. Patrícia conhece o carro onde está, ela sempre é levada nele para os encontros com o professor Anderson. Ela sabe que tem uma arma debaixo do banco do carona, ela se abaixa, finge que está amarrando o sapato e pega a pistola que o professor Anderson guarda no carro; Patrícia abre a porta e desce do carro e nem fecha a porta dele, vai correndo para o ônibus onde está a filha do pastor. Ao pegar a pistola, ela sabe que um dos ensinamentos de Jesus é ser pacífico e amar quem os persegue, Patrícia ao se lembrar disso, fala consigo mesma:

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