Capítulo O3 | Panacas

223 26 107
                                    

[Sammy] 

Sempre me questionei o porquê de eu me chamar Sammy. Meus pais não poderiam ter escolhido algo como Samuel ou simplesmente Sam? Meu irmão, por outro lado, ficou com o mais comum. Sky Richard Fray, o gêmeo.

Apesar de todo mundo dizer que éramos iguais, as diferenças para mim se mostravam totalmente perceptíveis. Por exemplo: Sky era mais alto e possuía olhos verdes enquanto os meus castanhos. Nossa genética era bem parecida e, se ele não malhasse todo dia para configurar os gominhos na barriga e bíceps travados, com certeza seria magrelo como eu. O que mais divergia eram nossas personalidades. Sky, o típico popular do colégio sempre conquistando respeito dos populares e tendo uma pá de garotas agarradas ao pescoço. Seu talento para esportes era tão notável que ninguém ousava lutar pelo título de capitão do time de futebol americano. Provavelmente, se continuasse naquele ritmo, ganharia bolsa em alguma faculdade grande no ano que vem. Eu era mais introvertido, apreciando a companhia de livros e mantendo-me fora dos holofotes. As vantagens de ser invisível: não havia uma comparação massiva entre nós no colégio. Qualquer um com boa memória fotográfica e senso de distinção saberia diferenciar o irmão famoso do impopular. Nem os professores se confundiam. E eu mal tinha um círculo extenso de amizades também. Alaska Marie Willson era simplesmente a melhor amiga que uma pessoa poderia ter, seus defeitos e qualidades a tornavam mais próxima do meu entendimento. Jamais me cansaria de saber mais da baixinha que ela mesma. Nos conhecemos no jardim de infância e desde então não nos separamos. E definitivamente não fui apaixonado por ela como na maioria dos clichês contados. Nosso laço se resumia a uma amizade maior que um grande amor.

Sobre minha monótona vida, não tinha muito o que dizer. Nasci e cresci em Skarye Fall. Eu era o tipo de menino que sentava em uma das primeiras fileiras da sala de aula e esforçava-se para conseguir uma nota acima da média ao fim do semestre. Nada do tipo que beijava meninas no armário do zelador ou curtia festas na casa dos colegas de classe — como Sky fazia. Grato por não ser reconhecido e nem convidado para muitos eventos, afinal, preferia de estar atrás dos bastidores. De qualquer modo, essas pessoas que rodiavam meu gêmeo eram, em sua maioria, superficiais e interesseiras. Mais valia uma amiga como Alaska que outras do tipo mencionado. Também, por mais estranho que pareça, nunca me apaixonei. Nenhuma paixonite ou amor platônico — nem no fundamental. Se eu tivesse que dizer o tipo de garota que me agradava, não saberia responder. Ainda não achei nenhuma que fizesse meu coração disparar. Sequer beijei. Quanto a minha família, meu pai morreu num acidente de carro quando eu tinha cinco anos. Aos oito, mamãe arrumou um substituto: Todd. Nunca gostei dele — não por ciúme da minha mãe, eu apenas... não gostava. Sky o venerava. Metade das conversas deles giravam em torno de esportes. Sky. o garotinho de ouro de todos com todo mérito para o título.

Inclusive, avistei-o naquele exato momento entrando na sala do treinador. O colégio não era tão ruim quando Alaska estava para me fazer companhia, mas sem ela... O que fez com a prima do mal foi errado, eu sei. Só não apoiei a ideia de ela estar presa em casa e eu no ninho de... estudantes. As primeiras aulas passaram meio arrastadas, tanto que nem consegui prestar atenção nas palavras do senhor Jones falando do aquecimento global e nem dar trela ao falatório de romantismo da professora Roberts. Na terceira eu já estava mais focado, embora soubesse que o tempo demorava passar mesmo que meus olhos não estivessem checando o relógio a cada minuto. Sobrevivi até o almoço. No refeitório, peguei uma bandeja azul-escuro, coloquei leite e uma maçã. Meu apetite não estava lá essas coisas tendo o universo contra mim. Soube no momento que me virei para ir até minha costumeira mesa junto aos isolados e todos os lugares estavam ocupados. Pensei em jogar a bandeja no lixo e ir embora, mas odiaria desperdiçar o alimento. Talvez eu pudesse, só dessa vez, dispensar o almoço. Ou comer debaixo dos corredores da escola.

Quase ClichêsOnde histórias criam vida. Descubra agora