36. Isso precisa acabar

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O celular de Lynn se esgoelava histericamente na  cabeceira. Ela sabia que era Edward, mas não queria atendê-lo. Fitava o aparelho piscando, sentada na cama abraçando os joelhos. Paul passara em casa  rapidamente para tomar um banho e mudar de roupa, saindo logo em seguida sem dizer aonde ia ou quando voltava, se voltava.

- Mamãe! Seu celular está tocando, não está ouvindo? –  indagou Ceci, enquanto subia na cama, achando impossível que a mãe não estivesse realmente ouvindo o estardalhaço do aparelho.

- Eu não quero atender, Ceci.

A garota pegou o celular e viu o número do pai.

- É o papai Edward! – exclamou ela – Posso atender?

- Claro, meu bem, diga que eu estou doente.

Ceci lançou um olhar intrigado à mãe. Certamente algo acontecera nos últimos dias e ela não sabia o que poderia ter sido. A relação dos três estava indo maravilhosamente bem, almoçavam juntos todos os dias e levavam-na a escola, então ela não conseguia pensar em qualquer motivo para a súbita mudança.

- Oi, papai! – disse Ceci atendendo a chamada – Está sim, papai, mas ela está doente. Não sei... Vou perguntar para ela – Ceci tirou o aparelho do ouvido e virou-se para Lynn – Vamos almoçar com o papai hoje?

- Você pode ir, Ceci, mas eu não vou – respondeu Lynn virando o rosto para a janela.

Ceci demorou um momento para absorver o choque. Depois pegou o aparelho novamente, focalizando sua atenção na conversa com o pai.

- Hoje nós não podemos ir, papai...

Lynn virou-se para a filha surpresa.

- Você pode ir se quiser, Ceci – sussurrou ela colocando os cabelos ruivos da menina atrás da orelha.

- É, hoje não vai dar mesmo – continuou Ceci ignorando a mãe - Mas fica para outro dia. Não, ela não pode falar. Tudo bem... Também te amo, papai. Beijo, beijo.

- Por que fez isso? - indagou Lynn, fitando a filha, confusa.

Ceci virou o rosto sério para a mãe. Ela também sentia-se como se traísse Paul. Nunca comentava com ele sobre os almoços com Edward. O  sentimento de culpa lhe doía no peito, mas era tudo tão perfeito quando estavam os três juntos...

- O que aconteceu? - perguntou a garota com seriedade.

- Como assim o que aconteceu? Eu que te pergunto, Ceci. Por que não quis ir almoçar com seu pai?

- Você está triste, mamãe... Foi alguma coisa que o papai disse... Ou fez? - ela abaixou o olhar, temendo a resposta que receberia. Não queria que as coisas voltassem a ser como antes.

- Ceci, por favor, pare com isso - pediu Lynn, respirando fundo para afastar o desconforto daquela conversa.

- Mas eu quero saber, mãe... - insistiu ela, voltando o olhar para a mãe novamente.

- Isso não é assunto para você. Se arrume, vou levá-la na casa de Edward.

Lynn se levantou da cama e fez sinal para a filha se apressar. Precisava tomar uma atitude, não queria que as coisas voltassem a ser difíceis e sofridas. Depois de tanto tempo guardando rancor de Edward, já era hora de amadurecer e deixar os atritos de lado pelo bem da filha.

A atitude de Ceci deixara Lynn confusa. Perguntou-se quão transparente ela ficava quando estava perto de Edward. Teria Ceci notado alguma coisa? Ou talvez Edward houvesse comentado qualquer coisa... Lynn afastou os pensamentos e foi tomar uma ducha fria. Estava decidida a não amolecer perto de Edward. Saiu do banheiro determinada. Escolheu um conjunto cinzento de aparência séria e prendeu os cabelos. Antes de sair tomou cinco calmantes.

- O que são essas pílulas, mamãe? – indagou Ceci ao vê-la engolindo um punhado delas.

- São... É remédio, Ceci.

- Está doente? - pressionou, ansiando por uma resposta melhor.

Lynn não respondeu, pegou a mão de Ceci e as duas saíram para a garagem. Fizeram o curto trajeto até a casa de Edward em silêncio. Ceci observava a paisagem através do vidro fumê, ainda pensando no que poderia ter dado errado entre a mãe e o pai.

- Desça, Ceci. Vou esperar você entrar.

Cecilia voltou o rosto para a mãe. Seu olhos estavam arregalados de surpresa. Não podia acreditar que tudo iria desmoronar assim.

- Você não vai conosco, mãe? - perguntou, incrédula.

- Não - negou Lynn, apertando o volante com força - Faça o que estou falando...

Ceci desceu do carro e foi em direção à porta, ligeiramente magoada com o tom seco da mãe. Não se despediu nem disse que a amava. Tocou a campainha e esperou um pouco até que Edward abrisse. Os dois se abraçaram e beijaram.

- Sua mãe não vai entrar?

- Não... – murmurou a garota, com o olhar baixo – O que aconteceu entre vocês, papai? - acrescentou sem encara-lo.

Edward ignorou a pergunta de Ceci e foi até o carro de Lynn. Ele bateu na janela e, relutante, ela baixou o vidro do carona para falar com ele.

- Não vai almoçar conosco? – perguntou Edward vendo o reflexo dele e de Ceci nos óculos escuros de Lynn.

- Não.

- Não está se sentindo bem?

- Pare de fazer perguntas... – resmungou ela, com a voz ligeiramente arrastada –  Não vou e pronto!

Edward pegou Ceci no colo e os dois observaram o carro de Lynn se afastar.

- O que aconteceu entre vocês, papai? Vocês brigaram? – insistiu Ceci.

- Ceci, eu amo a sua mãe, quando éramos mais novos... – Edward se interrompeu arrependendo-se de ter começado a falar – Ah, bem...  Isso é bobagem... Vamos almoçar? Onde quer ir hoje?

Ceci revirou os olhos, chateada. Não conseguia obter uma, uma única, resposta esclarecedora por parte dos pais. Semana retrasada ela encontrara uma revista antiga que falava sobre o parentesco de Lynn e Edward. Apesar de não compreender por completo, ela entendeu o sentido básico da história, e isso serviu para aumentar ainda mais a sua curiosidade sobre a relação dos pais. Quando se esquecia de que havia Paul no meio da confusão,  ela sentia-se extremamente feliz com o fato de Edward e Lynn terem se acertado. Em outros momentos, entretanto, ela sentia-se confusa, era como se estivesse traindo seu pai Paul, e isso a fazia sentir-se culpada. A atitude da mãe, no entanto, a fazia crer que o que quer que fosse de bom que estava  acontecendo entre Lynn e Edward havia terminado.

Garota Ingênua [COMPLETA]Onde histórias criam vida. Descubra agora