CAPITULO 23

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— Senti sua falta.

Zach. - o repreendo.

Ele abaixa a cabeça, passa a língua nos lábios e seu maxilar se tenciona. Seus passos se direcionam até a cadeira em minha frente e lá ele se senta, olhando fixamente para uns papéis em sua mão.
Não dava mais pra ficar em Hamptons, por mais que eu odeie o compromisso que meu pai impôs pra mim aqui na empresa eu me sinto ma responsabilidade de, pelo menos, respeitar o tempo estimado de ajudá-lo em seu projeto e ajudar Zach em sua formação. Talvez eu esteja criando juízo.
Eu não falaria sobre o ocorrido com Vince em minha consulta, por mais que, uma ora ou outra ele me questionará , de forma invasiva, sobre meu "relacionamento" e eu irei acabar falando, por puro impulso, por mais que eu não tenha aceitado o pedido. Isso interfere em nada da minha vida, nem em minha "evolução".

— Eu precisava sair, espairecer. - digo me referindo ao dias em Hamptons. — Ainda mais depois de ter sofrido um atentado. - aponto para o meu braço, Zach assente, tenso.

— Nova York te remete ao passado. Por isso, que quando você sai da "bolha" a tendência é se sentir mais leve, livre. - diz — Já pensou em se mudar? Buscar novos ares, conhecer novas pessoas, viver algo diferente, algo totalmente fora da sua rotina. - pergunta.

Eu já tinha pensado nessa hipótese, aliás, penso sempre, mas eu sou tão presa, refém a minha zona de conforto que acabo me privando. Por medo. Em dias de loucura eu penso em largar tudo — como se eu tivesse algo pra largar – e viver na casa de praia em Hamptons, adotar um cachorro, me sujeitar ao meu primeiro emprego em qualquer loja de conveniência ou virar, sei lá, garçonete do meu restaurante favorito, só pra sair dessa cidade e viver uma vida menos poluída. Na minha cabeça tudo seria perfeito. Óbvio que os custos da casa de praia são altíssimos mas isso eu deixaria com meu pai, meu salário seria apenas para comida e alguns luxos – não abriria mão da minha mesada também. Viveria bem e sozinha. Mas depois que esses momentos de loucura passam eu penso o quão depressivo seria eu viver isolada de tudo e todos, tirando o fato que eu abriria mão das festas e tudo que a cidade grande ainda me proporciona. Há prós e contras.

— Não foi aquilo que te deixou assim, né?! - sua pergunta sinuosa me trás aquela sensação. Aquela que senti quando estava no hospital, depois de acordar. Me sinto um lixo, como se estivesse feito a pior coisa do mundo. Meu corpo se tenciona e uma onda de culpa o toma por completo. — Ta tudo bem? - minhas mãos ficam suadas e trêmulas, instintivamente, minha boca fica seca e meus batimentos aumentam seu ritmo. — Jade? - Zach segura minhas mãos inquietas e num ato involuntário eu o abraço forte, como se meu copo fosse se fundir ao dele.

O tempo pareceu não passar enquanto eu estava acolhida em seu peito. É estranha a sensação de saber que alguém pode arrancar do seu peito toda dor e angústia, e mesmo assim você ter que evita-la por um bem maior.
Assim que tudo aquilo passou, não teve outra saída a não ser ir embora, eu queria correr direto pra casa mas Felícia me avisou que meu pai queria me ver, assim foi feito. Fui até Enrico Cooper. Eu não o via desde domingo passado, ou seja, uma semana; ontem quando cheguei, o mesmo já estava dormindo.

— Oi, pa...- meus olhos se arregalaram — pai! o que aconteceu? - corro até ele pra ver mais de perto o hematoma gigante em seu rosto. Ele sorri de canto, não muito feliz.

— Não foi nada, minha filha. Só a porta do armário. - diz. Desacredito.

Será que todos os homens a minha volta resolveram mentir pra mim de uma vez só? Ata, são homens, me esqueci. Sei que Enrico está mentindo pois ele não é nada desastrado e muito menos do tipo de arranjar briga na rua. Pelo o que eu saiba. Tudo anda meio estranho depois da volta de Steven, ou eu estou pilhada demais e o culpando por tudo de ruim. Não que ele mereça algum tipo de isenção de seu passado.

— Esse armário estava bem nervoso com você né - ironizo.

— Soube lidar com ele. - seu ar triunfante me assusta, ele não está falando de algum objeto - óbvio -  mas sim de alguém.

Meu pai não tem essa postura. O que é que tenha acontecido, eu irei descobrir, sendo tola ou não. No mais, o que meu pai queria saber era se eu estava mais disposta, se meu braço já tinha se recuperado, essas coisas. Confesso que no segundo dia em Hamptons eu já tinha tirado meu gesso, até por que não tem como eu passar uma semana em Main Beach com aquele troço. Imagina a marca horrível que ficaria isso se eu tivesse deixado e ficado no sol.

Na quinta, Zach combinou de me levar até o zoológico do Bronx. Ele ainda não desistiu de tentar algo diferente pras minhas consultas. Em comparação ao inicio, hoje eu estou bem mais aberta a conversar com ele sobre algumas coisas, não todas. Até por que não é tudo que sai com facilidade da minha boca. É muito difícil ter algo preso dentro de si, algo que nem sua melhor amiga sabe, algo só seu e não conseguir compartilhar.

Minha intenção, assim que eu chegasse em casa seria encurralar minha mãe. Julie nunca foi muito boa pra esconder as coisas, muito menos pra mentir, diferentemente do meu pai. Emma está correndo pela casa quando chego, seus mini pés freiam ao ouvir o barulho da porta bater atrás de mim. A pequena da curtos pulinhos e corre até mim pra me abraçar. Fiquei longos minutos escutando ela reclamar que nunca foi a praia, injuriada por eu ter ido e ela não, e, além de tudo, Emm me fez prometer levá-la a próxima vez que eu for. Sei que ela não entende nada por ser um bebê mas quando ela crescer e ter consciência que nossos pais são donos da casa na praia ela irá se revoltar e massacra-los por isso. Eu fui assim, quando descobri a casa obriguei meus pais a passarem uma semana inteira lá comigo. Naquele verão eu voltei mais vermelha que um camarão. Bons tempos.
Minha mãe estava na cozinha começando os preparativos para o almoço, concentrada no tempero da carne – para mim e meu pai –, quando cheguei por trás a assustando. Julie grita e distribui vários tapas em meu braço, mas logo em seguida me abraça. Assim como Enrico, é a primeira vez que a vejo depois da viagem. Me sento na bancada, ao lado em que ela está fazendo suas coisas e fico a encarar por logos segundos. Faço assim quando quero algo ou falar alguma coisa.

— Sei que você quer alguma coisa. - fala, ainda focada nos temperos. Ela conhece a filha que tem.

— Só queria saber o real motivo do Dr. Enrico estar todo esfolado - digo dando ênfase no "real", pra que ela saiba que eu não cai no papo furado de armário. — Você sabe o que aconteceu, Dra. Julie? - a pressiono.

— O armário estava...- a interrompo.

— Corta essa, mãe. Não tenho três anos. - bufo.

Julie continua a receita do almoço como se estivesse esquecido do que estávamos falando. Sei que está fingindo, pois seus ombros estão tensos. A fuzilo com o olhar e, por fim, ela para. Jade, vence! Mamãe coloca as mãos na cintura e retribui a fuzilada de olhar.

— Ele se meteu em uma discussão e acabou levando um soco na cara. - desembucha.

Abro e fecho a boca repetidas vezes sem entender. Como eu havia dito, meu pai é um cara pacífico, nunca briga com ninguém, muito menos sai na mão. Bom, eu pensei que era. Me sinto enganada, santo Deus, pareço ter cinco anos de idade novamente. Eu devo ter apagado por muito tempo depois da minha overdose e alguém substituiu meu verdadeiro pai por uma versão otimizada, um badboy velho. Se é que existem adultos com tal fama.
Tento, a todo custo arrancar mais coisas de minha mãe mas ela foge. Fica zanzando pela casa, totalmente inquieta, passa as mãos no cabelo e volta pra cozinha. Um ciclo. Mamãe nunca picou um aspargos tão rápido quanto agora. Ela está, visivelmente, tensa. Paro sua mão veloz com as minhas mãos, ela permanece olhando fixo para tábua de madeira. Hipnotizada. Julie solta um suspiro tão alto que ensurdece meus ouvidos.

— Mãe, quem foi? - pergunto impaciente.

— O Vincent Reed.

O DespertarOnde histórias criam vida. Descubra agora