Em muitos momentos da vida, fica claro que não podemos definir tudo o que queremos. Podemos planejar, desejar, nos iludir...mas a realidade é uma vadia estúpida e cruel que aparece sorrateira e é capaz de nos atirar do alto de um penhasco numa trombada.
E só o que nos resta é agradecer se, quando chegarmos ao chão, a queda nos permita sobrevivermos e sem sequelas permanentes. Para enfim, nos reerguemos e seguirmos adiante, só esperando o próximo tombo...
São com esses pensamentos amargurados, que me vejo sentada em uma calçada da rua, com uma mala enorme, onde meu filho Miguel de dez anos está sentado com uma mochila nas costas, distraído com seu joguinho.
Neste momento, totalmente alheio à gravidade da situação que estamos vivendo, sem um lugar sequer para passar essa noite.
Suspiro tão profundamente sentida, lembrando dos planos da Júlia adolescente.
Minha visão da vida era tão romântica, tão inocente e iludida com o futuro. Tudo seria possível se eu tivesse vontade e corresse atrás.
Escutava uma música que dizia: "Temos todo o tempo do mundo." E sim, eu realmente achava que tinha. Costumava me ver como uma adulta bem sucedida, com faculdade, carro, apartamento, viagens, um namorado sexy, gentil, amigo e companheiro...
Sairia da vida humilde que levava com dinheiro apenas para o básico. Vendo de longe as meninas da minha idade lindas, com roupas da moda, frequentando salões de belezas, indo em festas e ostentando fotos de lugares paradisíacos.
Enquanto eu, me contentava com roupas de promoção que a minha mãe como diarista, tinha condições de comprar ou com algumas doações que recebia de suas patroas. Mas não era revoltada por isso.
Ao contrário, eu era perseverante e conformada. Achava que aquilo tudo era temporário e eu teria o poder de transformar toda a minha vida através do meu próprio esforço.
E assim que me realizasse profissionalmente, retribuiria todo o trabalho da minha mãe que me criara sozinha pois meu pai, conforme me contara, era um ex-patrão que jamais assumira a filha da empregada.
Deixei escapar um sorriso irônico ao lembrar, do dia em que todos os meus projetos desandaram, por uma atitude impulsiva e impensada.
Sinto desgosto por mim mesma ao recordar minha inocência perdida, minha ingenuidade e por descobrir da pior maneira como a desigualdade social, o preconceito e as pessoas podem ser maldosas independente da idade.
Estava com dezesseis anos e no último ano do ensino médio. Sempre amei estudar e me destacava por minhas notas. Por este motivo, consegui uma bolsa de estudos integral, numa das melhores escolas da cidade. Pensava em cursar administração e estagiar em grandes empresas.
Faltava pouco para o final do ano, os professores e orientadores estavam otimistas e me incentivavam a tentar a faculdade federal, mas todos eram unânimes em dizer que eu conseguiria uma bolsa em qualquer instituição que escolhesse, por ser uma aluna exemplar.
Não tinha amigos próximos por estar sempre estudando ou ajudando minha mãe em suas faxinas porque ela já tinha certa idade, problemas cardíacos e precisávamos do dinheiro.
Muitas vezes trabalhei na casa de alguns colegas e sabia que comentavam sobre isso em seus círculos.
Algumas vezes ficava um pouco envergonhada quando me comparava com elas, mas me consolava mentalizando que um dia teria uma casa ou apartamento igual o delas e essa situação não seria pra sempre.
As pessoas na escola, geralmente se aproximavam de mim quando necessitavam de alguma ajuda nas matérias, provas ou trabalhos.
No restante do tempo, eram todos indiferentes. Era como se eu não existisse pra eles.
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Meu Chefe Indomável (CONCLUÍDA)
RomanceJúlia teve todos os seus sonhos interrompidos por conta de uma gravidez na adolescência.Sem ter onde morar com seu filho, ela vai trabalhar na casa de Arthur. Um homem pedante que deixa claro que despreza a sua origem humilde e não suporta crianças...