Capítulo 39

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Arthur respira fundo, criando coragem ou organizando seus pensamentos.

 Pega um punhado de areia, deixando escorrer entre os dedos e após um curto silêncio, inicia seu relato com um olhar triste, perdido em seu passado. 

Meu coração bate descompassadamente, antecipando que o que vou ouvir, será de alguma forma tão doloroso pra mim, quanto pra ele.

 Ouço atentamente sua narrativa:

- Apesar de eu vir de uma família abastada Júlia, não posso dizer que algum dia na vida, eu tive um lar. O casamento dos meus pais, era uma grande piada. Na frente dos outros, eram um casal perfeito...dentro de casa, nem se olhavam.

Ele deixa escapar um sorriso amargurado.

- Quando era criança nem me dava conta disso, apenas sentia falta da presença deles. Meu pai sempre viajava a trabalho e minha mãe, vivia entretida em suas futilidades de colunas sociais. Fui crescendo tendo o carinho e atenção apenas da Nana, que era a governanta da casa. Ao chegar em uma certa idade, percebi que o relacionamento deles era pura fachada e que nenhum dos dois se importava de esconder seus casos extraconjugais. Perdi a conta das vezes que flagrei os dois com seus amantes, dentro de casa mesmo. Sem nenhum pudor ou constrangimentos. Cada um tinha seus gostos: Meu pai, gostava de suas secretárias, minhas babás, as cozinheiras, as estagiárias da empresa...Já minha mãe, adorava os playboys, os jardineiros, os seguranças... A gota d'água, foi quando estava no último ano da faculdade. Eu era um cara tímido, reservado. Frequentava poucas festas, pois nessas alturas, todos já conheciam a fama dos meus pais e eu tinha vergonha porque sempre alguém fazia algum comentário a respeito. Não trazia meus amigos em casa, porque sempre acabavam na cama da minha mãe. Me isolava cada vez mais...

Não o interrompo em nenhum momento. Sei o quanto deve estar sendo difícil para uma pessoa orgulhosa como ele, se expôr dessa maneira. Ele prossegue:

- Conheci Débora quando começou a trabalhar como doméstica na minha casa...

Um breve silêncio interrompe sua narrativa. Ele parecia escolher as palavras com cuidado.

Quando toca no nome de Débora, sinto um frio no estômago. Apesar de querer ignorar, o ciúmes é inevitável. Meu corpo está dolorido e só então percebo o quanto estou contraída, escutando sua história. 

Consigo ver seus olhos escuros pela mágoa...

E se tem mágoa, é porque existiu outro sentimento que precedeu à decepção.

Imaginar Arthur com aquela mulher é insuportável.

Ele retoma a palavra e, mesmo sendo irracional, sofro ao vê-lo distante e porque sei que neste momento, seu pensamento está direcionado a ela. 

É a imagem dela que povoa suas lembranças...

- Débora também era mais jovem e, como deve ter percebido, muito bonita. Ela sabia como jogar seu charme e cada vez se aproximava mais de mim. Como era do tipo caseiro e relativamente ingênuo, foi bem fácil me envolver. Em pouco tempo, a convidei para sair e engatamos no que eu achava, ser um namoro sério. Ela vivia fazendo joguinhos de sedução comigo e quando eu tentava "avançar o sinal", fazia cenas de ofendida, com lágrimas e tudo. Dizia que eu só queria usá-la e descartá-la por ser de origem pobre e apenas uma empregada. Eu garantia que a amava. Tinha até decidido comprar um apartamento e pedi-la em casamento. Tinha certeza de que era a mulher da minha vida.

Solta um sorriso triste ao mencionar isso e meus olhos enchem de lágrimas que não quero derramar. A aflição do ciúmes, misturado a tristeza de vê-lo sofrer, era sufocante.

Sabia que não podia interrompê-lo, era importante para ele colocar aquilo tudo pra fora.

 E pra mim também.

 Pela primeira vez, ele estava se revelando por inteiro. 

Tive certeza que ele nunca tinha se mostrado dessa forma pra ninguém.

De uma maneira contraditória, me sinto contente por ter merecido essa confiança.

Meu Chefe Indomável (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora