Lembre-se, você é amado - Shikamaru

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Apesar da alegria que rodeava, por cada pequeno passo que tocava o longo caminho em direção ao novo jutsu, o vento trazia dor em seus sussuros, manchado de melancólia. Não mais apreciava a beleza da cachoeira, ou os raios gloriosos do sol que decaiam sobre a vila. Pareciam irrelevantes, tudo se tornou acinzentado.

- Você está cada vez melhor, loirinho - comentei, com os dígitos viajando carinhosamente pelos fios amarelos do garoto, que não conteve o sorriso com o elogio.

Enquanto mantinha os braços entrelaçados ao corpo de Naruto, orgulhosa daquilo que, aos poucos, conquistava com seu próprio poder, avistei os passos apressados de Yamato, adentrando a maciez da gramagem com certo desespero. As expressões, totalmente contrárias as que costumava carregar.

Naruto não notou a tensão que percorreu o corpo de nosso sensei assim que Yamato soltou palavras curtas, que não pude compreender. Foram as atitudes distantes do platinado que atrairam preocupação.
Movimentou a cabeça em afirmação, com a mente longe, vagando pela extensa cachoeira antes de fixar seus olhos em meu corpo imóvel, afirmando que algo não estava do jeito que amanheceu. Percebi o chamado silencioso, puxando o pulso de Naruto, em direção aos antigos participantes da ambu.

Em passos calmos e suaves, de minha parte, já que Naruto tropeçava sobre os próprios pés, encontrei o caminho até os dígitos carinhosos de Kakashi, que envolveram minhas costas, apoiando se em meu braço, como se precisasse de algo para descontar o peso das sílabas que encontraram seus ouvidos a alguns segundos e ao mesmo tempo, mantendo se firme, em uma tentativa de acalmar a onda de pensamentos que ocupava minha mente.

- O que aconteceu, capitão Yamato? Tá tudo bem? - questionou Naruto, tombando a cabeça levemente, assim que conseguiu manter a postura correta.

- Asuma - articulou em voz baixa, temendo a realidade de repeti-las.

- Asuma sensei voltou de missão, é isso? - interrompeu a fala do moreno, com a mandíbula tensionada. Nem mesmo Naruto acreditava nas palavras que acabara de falar.

- Asuma se foi - deixou que as palavras ecoassem. Agora, o clima obscuro deixava de se tornar algo incompatível com nossas almas.

O som adentrou meus ouvidos, impactando toda e qualquer célula que participa desse conjunto, ecoando por todas elas. Lágrimas não foram derramadas e nem seriam, afinal, Asuma não gostaria de ver aqueles a que confiou, chorando em sua despedida. Kakashi apertou os dedos sobre minha pele, atraindo minha atenção. Estávamos alheios aos gritos de negação que Naruto insistia em exbravejar.

- Vá, fale com ele - incentivou, sorrindo ao soltar me do calor quase paternal. Ele não precisava dar mais informações para que o entendimento fosse completo. Estava falando de Shikamaru.

Me afastei, correndo o mais rápido que pude, mesmo que a velocidade, neste momento, fosse algo difícil de alcançar. Tudo passava em câmera lenta. Era difícil raciocinar e talvez, nem quisesse alcançar o raciocínio para não lembrar do fato trágico que é nunca mais poder voltar ao normal. O normal com Asuma, era o normal  que sentiria uma falta inexplicável.

Tentava me concentrar no caminho mas, meus pensamentos insistiam em recair sobre os dias com o Sarutobi. Mesmo não sendo sua aluna, me ensinou coisas que levaria pra vida. Levaria sua existência pro resto da vida. O jeito como lutava bravamente, protegendo aqueles que amava sempre me causou admiração, o brilho nos olhos nunca se apagava quando se tratava de Asuma.

Sabia onde estava, era quase impossível que estivesse em outro lugar.

Passei pelas ruas movimentadas de Konoha, não notando nada e ninguém. Os rostos, que deveriam ser tão únicos, eram apenas figuras borradas, sem nenhuma individualidade, ele é o único alguém individual nesse momento. O objetivo maior, a residência dos Nara, chegava cada vez mais perto. A respiração descompassada era a música que me distraia do avassalador sentimento de insuficiência.

Não precisava de permissão para entrar, fazia tempo desde a última vez que precisei. Troquei olhares momentâneos com Shikaku, recebendo um aceno incentivador.

Sabia que eu estaria ali para seu filho.

Mesmo quando minhas forças se esgotarem, eu correrei até Shikamaru.

As paredes tão conhecidas, se tornaram um labirinto complexo quando sua agonia atingiu meus ouvidos, era dor sonora. Seu coração sangrava e era possível escutar.

Assim que encontrei as portas de correr, com coloração tão suave, possuindo um quadriculado, que nada combinava com a escuridão presente nos corações, as empurrei suavemente, não estranhando o cessar dos gritos e nem mesmo o choro alto. O rancor tinha se disolvido por meio da agressividade. As peças no chão, os móveis derrubados, e agora, só a dor sobrava.

Ele estava no chão chorando, sentado, joelhos dobrados e colados ao peito, rosto escondido entre os braços, tentando evitar o mundo e a dor que amar traz, segurando com firmeza uma das coisas que possuiam mais preciosidade para Asuma.

Seu isqueiro prateado.

- Shika, olha pra mim, eu estou aqui- sussurei ajoelhada, ao envolver seu corpo, em uma tentativa de remover todo o peso de seu coração.

O moreno ergueu o rosto, perdido em meio aos sentimentos, que, infelizmente, não tinham manual de instruções como seu jogo favorito. Os olhos se tornaram morada de lágrimas, me pediam para dizer que tudo ia ficar bem, pediam da base de sua existência que Asuma estivesse passeando pela vila, atormentando a todos com o cheiro de seu cigarro.

- Shikamaru, Asuma nunca ia querer te ver assim, você sabe não é? - soltei as palavras calmamente, acariciando o rosto macio do ninja, sentindo o molhado das diversas lágrimas que tiveram a oportunidade de beijar essa superfície.

- Essa é a única certeza que tenho agora - comentou irônico, sorrindo dolorido, apreciando o contato carinhoso que tinha com minhas mãos.

- Acho que você deveria ter certeza de outra coisa - afirmei, antes de deixar um beijo demorado sobre seus fios.

- Você é amado. Eu te amo, seus pais te amam, seus companheiros te amam e Asuma te ama, Shikamaru. As coisas acabam, as pessoas morrem, é normal, mas o amor que as une, nunca termina. Se acha que Asuma te abandonou, não aprendeu nada com ele. A vontade do fogo que queima nele sempre vai estar com a gente. Ele morreu para proteger aqueles que ama, e nós, como as pessoas que ele amou, devemos deixar que a chama dele seja nossa guia - dissertei, firmando uma mão de cada lado do rosto de Shikamaru, diria que este fora esculpido pelos anjos, fixando seu olhar no meu, não deixando que escapasse de minhas palavras. Era a verdade, ele precisava escutá-la.

- Você pode chorar, esse não é o problema. Mas faça questão de sair daqui de cabeça erguida, honrando aquilo que Asuma deixou para nós - concluí, secando as novas lágrimas que derramava com meus polegares.

Ele nada respondeu. Buscou abrigo em meus braços, aceitando sem hesitações o cafuné que ofereci. Ficamos em silêncio, até que o Nara organizasse a bagunça que habitou seus pensamentos e o sono dominasse nossas ações. Sabia que estava bem, quando, na manhã seguinte, antes mesmo do sol se levantar, Shikamaru acordou me com um selar entusiasmado, sussurando eu te amo e deixando o cômodo com presa, não esquecendo de carregar consigo o item que recolhera de seu sensei.

Ele tinha um plano.

E se ele tem um plano, significa que aceitou o mundo como ele é.

E o mundo real, infelizmente, é sem a existência de Asuma.

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Eai, galera?

Seria muita ousadia de minha parte perguntar se vocês estão bem?

Enfim, obrigada pelos 70K e até o próximo capítulo!

𝓘𝓶𝓪𝓰𝓲𝓷𝓮𝓼 𝓝𝓪𝓻𝓾𝓽𝓸 Onde histórias criam vida. Descubra agora