21 | Enterrando tudo de ruim

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Eu estava me sentindo como uma pena dentro da banheira. Quando abandonei o cômodo, tive a sensação de ter deixado todos os meus problemas irem embora junto à agua que me limpou. Esse deve ter sido meu banho mais relaxado.

Nossa...

Me troquei com uma lentidão tão agradável que não me importei por estar desperdiçando meu tempo com algo tão irrelevante. Eu poderia até estar concentrado no presente, em escolher e vestir minha roupa, porém minha mente estava com um pé no passado, rebuscando os detalhes do que tinha acontecido no refeitório. Eu disse tudo aquilo mesmo ou foi apenas um delírio? Parecia inacreditável que alguém como eu, tão paciente para aguentar certas coisas — isso era evidente diante da realidade de eu ter suportado todos os CATS por quase três anos —, fosse explodir um dia.

Eu não imaginava que um dia iria ser jogado para fora do meu grupo de populares. Se dependesse de mim, continuaria com eles para sempre. Meu pai estava certo: passar mais tempo ao lado de Ariana, Bernardo e Deise me deixava cada vez mais incapacitado de me desvincular deles. Precisei perder Emmett para me dar conta disso. Essa parece ser a grande questão de estar conectado a pessoas tóxicas, pelo visto: se não nos dermos coonta de que estamos aprisionados por correntes de sufocamento, falsidade e desamor, jamais poderemos nos libertar delas. E acho que só conseguiremos fazer isso quando passarmos a nos valorizar. Alguém que possui um mínimo de amor próprio não se submete a ser humilhado.

Diante do espelho do meu quarto, eu fitava meus olhos verdes, decifrando a mudança tangível neles. Eu não era um adolescente que, assim como Deise, dava uma importância anormal ao próprio reflexo, mas hoje, pelo menos por uns minutos, fiz questão de encarar a mim mesmo. Percorri a visão pelo meu cabelo molhado, observando as gotas de água levadas pela gravidade, e terminei no meu próprio olhar, que cintilava com um toque mais nítido que o de costume. Recordando-me das últimas palavras de Emmett no corredor, sorri lentamente.

Estou tão orgulhoso...

Queria ter ficado por mais alguns segundos no quarto, mas também queria contar a novidade para meus pais. Sendo assim, corri, literalmente, para a cozinha. Os dois estavam com suas vestimentas do trabalho, o que indicava que tinham chegado recentemente. Animados, eles conversavam entre si, em pé ao lado da mesa. Eu não disse nada: aproveitando a mínima distância que os separava, os abracei, fechando os olhos no processo. Pelo espanto da minha mãe, ficou claro que meu gesto foi bastante inesperado.

— Ei, querido. — Sua voz continha traços de felicidade. — O que foi isso?

— O garoto te desculpou? — meu pai tentou, a mão massageando minhas costas.

— Foi algo tão bom quanto isso — murmurei.

— Ah, foi?

Fiquei grudado a eles antes de decidir que contaria tudo. Meus pais tinham um cheiro tão bom. Eu não podia associá-lo a nada.

Quando me separei, deixei à mostra, sem fazer nenhum esforço para isso, a minha expressão de alívio tremendo. Eu não me lembrava da última vez que estive assim, animado demais para sequer conseguir controlar minhas próprias emoções.

— Eu saí do grupo dos CATS — expus, olhando cada um deles.

Enquanto meu pai franziu a testa, minha mãe arregalou os olhos.

— Isso é... uma brincadeira? — ele perguntou, duvidoso.

Fiz que não, achando graça. Em seu lugar, eu também não estaria totalmente convicto de que isso era verdade.

— Acabou. De uma vez por todas — afirmei, relaxando os ombros. — Nunca mais terei que andar com Ariana. Nunca mais me permitirei ser humilhado.

EU TE AMEI AMANHÃOnde histórias criam vida. Descubra agora