Parei de brincar com minhas mãos e ergui as sobrancelhas. Não fiz muito esforço para evitar transparecer o grande nível da minha surpresa. O quê? Para mim, ele tinha acabado de se contradizer.
— Eu pensei... — comecei, mas parei no meio da frase. Ele esperou que eu continuasse. — Pensei que tivesse me perdoado.
— Sim, eu te perdoei. De verdade, não há nenhum remorso dentro de mim. — Para enfatizar sua resposta, Emmett gesticulou com a cabeça, bem decidido. — Só que a nossa conexão... é perigosa, Hércules. Você viu o que aconteceu no parque.
Senti um sufoco dentro de mim.
— Mas tudo estava indo tão bem — apelei, a voz tímida. — Nossos encontros escondidos, digo. Se eu não tivesse te chamado... não teriam descoberto. Não que eu me arrependa de ter te chamado — acrescentei depressa. — Só estou dizendo... que nós estávamos felizes antes de tudo desmoronar...
— Estávamos. Isso é verdade. — Emmett inspirou fundo, infiltrando as mãos nos bolsos. — Mas ontem refleti melhor sobre nós dois. Antes de tudo, acho que é importante enfatizar que minhas impressões sobre você não mudaram. Ainda te acho um garoto legal. Ainda acho que você não é como seus amigos. — Pausando por um tempo, ele examinou meu rosto, como se estivesse procurando por algo. — Mas esse lance de nos encontrarmos às escondidas não é legal. Pensei que seria divertido. Eu estava enganado, pelo visto. Pelo menos até ver o jeito como Deise te tratou ontem. Não quero que se prejudique por minha causa. Por causa da gente.
— Você não fez nada — murmurei, deixando subir uma aflição pela cabeça. — Fui eu quem causou tudo isso.
Ele me mostrou outro sorriso, dessa vez mais expansivo que o anterior. Mais uma vez, não durou tanto tempo assim.
— Aquela garota é um câncer para você — ele disse em desapontamento, e eu sabia que esse lado indignado era destinado à ruiva. — Todos eles são. Sinceramente, não entendo por que você ainda insiste em ficar com aqueles três. Parece que você gosta de ser maltratado. — Ele subiu os ombros brevemente, o olhar meio triste. — Em todo caso, quem sou eu para julgar, né?
Não consegui dizer nada depois de ouvi-lo, e os acontecimentos ao redor ficaram dispersos para mim, de modo que eu não pudesse prestar atenção. De algum modo, fiquei momentaneamente cego. A única coisa que minha mente era capaz de processar era que Emmett estava me dando adeus. Todo o resto me parecia insignificante diante disse — nada era tão importante quanto isso. Deveria ser por essa razão que minha visão se encontrava tão distorcida em relação aos elementos à minha volta.
— Emmett? — chamou um garoto na quadra, segurando uma bola de vôlei. — Vamos?
Emmett virou a cabeça na direção dele, acenando, e se voltou para mim. Eu ainda não sabia o que dizer.
— Eu quero muito ser seu amigo, Hércules — ele disse, a voz mais calma, como se tivesse tentando me convencer de que estava sendo sincero. Eu já sabia que ele jamais seria falso comigo. — Mas em condições certas, do jeito que dois amigos normais fariam. Por enquanto, é melhor nos mantermos separados. — Ele começou a se afastar de mim, mantendo nossos olhares unidos. — Desejo coisas boas para você.
Emmett deu meia-volta e começou a andar até o centro da quadra.
— Espera, por favor — pedi, saindo da arquibancada.
Ele se virou, a uns três metros de distância.
— Pois não?
Por um instante, não consegui sentir meu próprio corpo.
— Como eu posso te agradar? — perguntei, o desconforto presente, denunciando que eu não fazia ideia de como proceder com essa situação. — O que é que eu tenho que fazer para que você volte a andar comigo?
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EU TE AMEI AMANHÃ
Teen FictionO ano é 2008. Num período em que a causa LGBTQ+ estava começando a ser debatida, Hércules Ferraz, um garoto gay de dezessete anos, faz de tudo para que a sua homossexualidade se mantenha escondida do mundo. Da classe alta, pertencente ao grupo popul...