9 | Eu não sou gay, tá ligado?

473 107 38
                                    

Em frente ao espelho do meu quarto, eu estava analisando, além do meu próprio reflexo, meus trejeitos. O garoto magro de olhos verdes, cabelo castanho claro sempre penteado para trás e pele parda que me encarava de volta não me trazia nenhum indício de que ele gostava de rapazes. Na minha cabeça, nada sobre as minhas características físicas indicava que eu era um menino gay, então concluí que o que tinha me denunciado era o meu jeito de andar ou falar.

Tinha que ter alguma coisa. Como, afinal, Emmett descobriu o meu segredo em menos de uma semana?

Andando de um lado para o outro, ainda sem perder a conexão do meu olhar no reflexo, analisei cautelosamente o modo como eu me comportava. Eu passei tantos anos fingindo que era hétero e agindo feito um que acreditei que nada mais em mim pudesse me denunciar. Até ontem, ninguém tinha desconfiado. O que fez Emmett quebrar a regra?

Depois de caminhar em círculos — literalmente — e mudar a minha pose uma infinidade de vezes, fruto do meu propósito de examinar meu comportamento, bufei. Se eu quisesse de fato saber a resposta para a minha dúvida, teria que ir perguntar diretamente para a fonte: ele. Na minha concepção, o fato de Emmett saber que eu era gay queria dizer que qualquer outra pessoa naquele colégio, incluindo Ariana, poderia, com o tempo, perceber também. E se isso ocorresse, eu já teria que dar adeus à minha carteirinha de CAT.

Não, calma. Dá para resolver essa situação.

Sentei-me em frente ao meu computador, o liguei e esperei o Windows XP ser processado. Enquanto o sistema carregava, pensei numa maneira sucinta de convencer Emmett de que sua afirmação era completamente errônea, que ele estava precipitado quanto a mim.

Abri meu Orkut. Com um suspiro pesado, aceitei à sua solicitação de amizade e, não me importando se ele estava ou não online, abri o chat do que seria nossa primeira conversa. Eu tinha total conhecimento de que nenhum CAT poderia se aproximar de pessoas desprezadas por Ariana, por isso já coloquei na minha cabeça de que eu mandaria um pequeno texto para Emmett e já trataria de excluí-lo da minha lista de amigos do Orkut. Vai ser rapidinho.

Por um instante, antes de começar a digitar alguma coisa, olhei para seu nome inteiro, Emmett Lorenzo Brito. Pensei em começar com um "boa noite", mas supus que enrolar mais só dificultaria as coisas. Ir direto ao ponto era a única política que eu gostaria de seguir, por essa razão, com os dedos ágeis, escrevi minha mensagem. O maior blefe da minha vida estava acontecendo agora.

Olha, não entendi direito o que você quis dizer naquele papel.
Não entendi porque o que estava escrito não se aplica a mim.
Não sei quem foi que te disse que eu sou gay, mas isso é mentira.
Você está tendo impressões precipitadas sobre o que eu sou.
Passar bem.

Entretanto, com o dedo pairado sobre a tecla enter, hesitei em enviar as palavras. Só depois de ter digitado tudo que vim perceber o aumento nas pulsações do meu coração, indicando um nervosismo que eu não esperava. Relaxando o corpo sobre a cadeira, balancei a cabeça, desistindo da minha ideia. Pressionei, portanto, a tecla acima do enter e a segurei.

— Por que fui me apaixonar por você? — perguntei a mim mesmo, a voz baixa e triste, enquanto observava cada letra ser apagada no monitor. — Era para a gente ter se apaixonado só nos sonhos... Não era para você ter aparecido. Como é que eu vou te amar no mundo real, droga?

Com um aperto no coração, encarei sua foto de perfil novamente, só para me sentir ainda pior. Um sorriso muito fraco surgiu nos meus lábios quando fechei a página do Google e desliguei meu computador. Decidi que iria tentar falar com ele amanhã. Já que era para fracassar na tentativa de convencê-lo do contrário daquilo que ele já sabia, que fosse cara a cara, então. Frases escritas em um chat qualquer poderiam não ser tão precisas quanto àquelas que eu diria pessoalmente.

EU TE AMEI AMANHÃOnde histórias criam vida. Descubra agora