Capítulo 29

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Peter acabou de subir para o quarto, eu vou até a biblioteca, tranco a porta e me sento na mesa em frente ao notebook. Estou com medo do que tem aqui, mas não vou recuar, preciso saber.

Se fosse algo sobre ele, algo da vida dele, eu juro que não me importaria, mas não, isso fala a respeito de mim, da minha vida, as pessoas sempre me tiraram tudo que eu tinha, sempre esconderam quem eu sou e de onde vim, não vou viver isso de novo.

Eu perguntei a ele e ele não me respondeu, é meu direito saber e eu vou descobrir com ou sem a ajuda dele.

Sei que dessa vez eu não posso seguir só minha intuição, não seria justo, minha intuição quase sempre falha, devo a Peter um voto de confiança. Faço um trato comigo mesma, independente do que eu encontrar, vou dar uma chance de Peter se explicar, ele merece isso, assim como mereço minhas respostas.

Ligo o computador e uma foto da nossa família aparece, o notebook liga normalmente e eu estranho, não precisa de senha?

Começo a mexer, entro nas notas e aí, sim, a tela fica toda preta e pede senha de acesso.

Depois de colocar a combinação de números e letras que Eliza havia me dado, sou direcionada a uma nova tela com várias outras pastas. "1993","Arquivo920","Basic2" e então "Celina", ele tem uma pasta com o meu nome. Minhas mãos começam a tremer e minha respiração começa a ser afetada pela ansiedade causada.

Clico na pasta e torço para não pedir uma segunda senha, parece que é meu dia de sorte, a pasta se abre e eu sou direcionada a um arquivo de 350 páginas. Tem muita coisa aqui.

A primeira coisa a aparecer é uma espécie de contrato, ao passar meus olhos pelo documento vejo que é o meu contrato de compra, só ele tem 32 páginas. Depois disso reconheço o meu contrato de casamento e também tem uma cópia da certidão; até aí tudo bem, mas depois disso as coisas começam a ficar bizarras.

Ele relata o dia que cheguei e até o que eu disse para ele, então ele pula para o dia que adoeci e anexa todos os meus exames, ele começa a relatar tudo que eu como, o que eu pareço não gostar, minha relação com as crianças e até minha relação com o cachorro.

Cada vez que eu abro uma nota eu fico mais assustada do que já estava, ele diz tudo sobre mim, a posição que eu gostava de dormir na minha cama e como isso influenciava o meu humor, quanto tempo eu levava pra tomar banho, se eu lavava ou não o cabelo, tudo mesmo, quanto tempo demorava minha menstruação e como eu reagia durante meu ciclo.

Quando abro outro anexo, vejo inúmeros exames médicos, alérgicos, para DSTS, para doenças genéticas, entre outras; até uma foto da minha arcada dentária tem aqui.

As frases que mais me assustam são "como ela faz tal coisa?" ou "como ela reagiria se?", meu coração está tão desesperado quanto meus pensamentos, eu sei o que isso é, só não quero admitir. Desço as páginas sem prestar muita atenção nas palavras, eu sei o que está escrito ali, eu vivi isso.

A última página traz as seguintes frases "criança vítima de abuso sexual com culpa como consequência" e "vítima de pornografia infantil". Eu desabo na mesa, meus pulmões ardem querendo negligenciar o ar que entra tamanha a dor que estar aqui me causa.

Eu sou uma pesquisa, sou um maldito objeto de estudo.

De todas as teorias eu jamais pensei sobre essa. Eu me apaixonei por ele e ele escreveu sobre meus sentimentos em um papel, ele escreveu sobre a minha maior dor como se fosse expor em uma sala para pessoas desconhecidas julgarem o nível do meu sofrimento.

Eu amei ele enquanto ele analisava se eu era capaz de amar.

Estou com tanta dor que meus órgãos parecem se destroçar dentro de mim, meu coração pede para ser arrancado, isso não é traição, é pura maldade, falta de humanidade, falta de amor.

Comprada sem razões Onde histórias criam vida. Descubra agora