Imanente

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1.Que tem motivação ou efeito interior; que não desaparece ou não se vai.

No mesmo dia...

Despertei com o barulho de uma buzina alta e aguda vinda de fora da van, abri meus olhos ainda sonolenta e pude ver algumas cobertas amarrotadas sobre Pierre e eu. Não havia uma parte da noite anterior que houvesse esquecido, os gostos que senti, os toques na minha pele e na dele, a competição incansável para ver quem comandaria aquela espécie de performance e em especial, o ápice de ambos com diferença mínima a longevidade dos nossos lábios. Eu nunca sequer imaginei que pudesse ser bom, fazia tempo que ninguém me tocava por completo dessa maneira ou que olhava tão pungentemente dentro da minha pupila no ato. Na hora sempre parece que o momento é único, que o tempo não passa, que somos só aquilo e por mais que seja casual ou não nos fundimos um no outro. O suor perde o sabor amargo. Os filhos do prazer lambuzam nossos corpos. As respirações descompassadas. Os gemidos. Os sussurros. E as promessas, compõem melodias. Somos tão racionais e tão instintivos ao mesmo tempo. Não houve egoísmo, cada um se atentou às necessidades carnais um do outro, parecia que havíamos ensaiado e que éramos um mapa a ser explorado com um belo tesouro enterrado no "X".

Ao contrário da ressaca que senti da última vez não me sentia doente, apenas estava com muita fome e meu estômago reclamava, fitei Pierre ressonando com as costas nuas viradas para cima e os cachos meio amassados na almofada. Ele pegava no sono facilmente e por algum motivo mesmo depois de todas as noites mal dormidas e a insônia presente em cada uma delas eu também adormeci sem que percebesse. Não tive sonhos, nem pesadelos, somente descansei sem absorver nada do que havia feito na noite passada.

Mas agora a ficha caiu, raciocinar tudo o que fiz em questão de segundos. Ir do orgulho até a vergonha repentinamente. A imagem de Celine se materializando nos meus pensamentos toda vez que tentava retornar ao ato equiparando sua imagem a uma figura julgativa. Eu havia me traído, traído meus desejos. Eu não deveria ter deixado o emocional tomar a frente ainda mais em um momento tão delicado. Eu não podia culpar Pierre, ele havia me perguntado se queria dar continuidade e assenti, a ressaca do último final de semana não se comparava com o pesar da minha consciência nesse exato momento. Ele ali deitado calmo e eu aqui, sentada fitando-o pensando em como as coisas ficarão quando Pierre acordar.

"Eu definitivamente não sabia o que queria na porra daquela noite."

Ouvi seguidamente algumas batidas suaves na porta traseira da van, foi aí que ele despertou bocejando com um dos olhos meio aberto e o outro completamente selado.

-Aurora! Pierre! Vocês estão aí? - Era a voz de Lorenzo.

-Mas que merda é essa? - Pierre indagou com a voz rouca.

Sem falar nada destranquei o limiar e sai, meus pés mais uma vez tocaram a grama meio molhada e os raios do Sol emanavam calor. Sr.Galaretto estava parado em frente a caminhonete do seu filho com os braços cruzados e uma expressão de alívio ao me ver.

-Bom dia! - O cumprimentei neutra enquanto reunia meus fios de cabelo e os amarrava.

-Bom dia, Aurora! Ainda bem que vocês estão aqui! Estávamos preocupados. - Ele permaneceu onde estava, porém mais tranquilo.

-D-desculpa... Não era a nossa intenção. Acabamos bebendo demais e eu dei a ideia de nadarmos. - Expliquei olhando para o céu.

-Ainda bem que não vendemos a van. - Ele disse encerrando o assunto. -Trouxe as coisas que vocês deixaram do outro lado.

Antes que eu pudesse respondê-lo Pierre saiu do automóvel ajeitando a calça na cintura e fechando o zíper.

"Mais discreto impossível."

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