Carta n° 01

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Querida Celine...

Venho me comunicar com você através dessa carta, porque nós duas sabemos muito bem que eu não tenho coragem de te olhar nos olhos e te explicar o que rolou da última vez que nos encontramos. Já inicio pedindo perdão - mesmo minha psicóloga dizendo que não devo me desculpar pelo o que sinto - , acabei agindo impulsivamente, você sabe como eu sou e odeio isso em mim, mas de alguma forma, você gosta e ainda não entendi bem o porquê.

Essa introdução ficou mais longa do que eu gostaria e por mim amassava essa folha e mastigava ela até virar uma pasta, arrependimentos e frustrações, é disso que sou feita. Gastei três linhas só reclamando, mais típico que isso só o que houve entre nós na semana passada.

Nos últimos vinte anos, para mim você era a luz no final do túnel que me fazia querer levantar as segundas-feiras cedo só porque sabia que iria te encontrar, nada de sentimentos românticos, eu só gostava muito de ter-lá ao meu lado como uma grandíssima amiga. Nós duas dividimos tudo, desde um brioche velho até o mesmo espaço na cama nas festas do pijama na sua casa, sempre estávamos rindo do meu humor duvidoso e sarcástico que não fazia mais ninguém gargalhar, apenas você. E hoje me indago: será que você ria de dó ou o problema está todo em mim que não consigo assumir que na verdade, sou hilária? No entanto, sinto a necessidade de deixar tudo muito claro, principalmente o fato de que me apaixonei por você há menos de 2 anos atrás, se é que te conheço bem está se perguntando o por que de não ter contado a você e a resposta é, eu também não sabia.

"Como assim não sabia, Aurora?"

A ouço procurar novamente por explicações em meio a bagunça que deve estar em sua mente. Porém, se aquiete, sente em um lugar confortável e pare de andar de um lado para o outro roendo as unhas - pois sei muito bem que está assim no momento -, respire fundo que logo mais te darei as respostas de como solucionei tal problemática. Demorei para compreender o que estava preso no meu coração e entalado na minha garganta, e assim que entramos na faculdade tive medo de nos afastarmos, primeiro que eu sempre quis te convidar para ir fazer intercâmbio na Itália, mas o seu italiano é péssimo - brincadeiras a parte -, quem me dera que sua dificuldade com a pronúncia fosse o único empecilho. Você não deve saber, mas eu passei sim numa universidade em Milão, só que recusei a vaga na época, eu entrei em pânico só de pensar no que seria da minha vida sem você, como que eu iria me suportar sabendo que deixei o que dava valor real a minha existência para trás? Simplesmente não consegui e foi aí que eu aceitei a bolsa para podermos ficar juntas por mais um tempo, a vida de universitária foi divertida com você, tenho que confessar, ambas nos formamos naquilo que sempre queríamos, você com seus números complicados e eu decidi seguir o caminho da arte, tudo ia tão bem, estávamos no último semestre e foi aí que Fergus entrou na sua vida... Olhos claros, boa pinta, sedutor, ombros largos e extremamente mais engraçado do que eu - você que disse isso, dessa vez não é minha síndrome da impostora falando, ouvi da sua boca. Para mim, ele era um imbecil e constantemente dizia que não ia com a cara dele, se eu soubesse que isso só te incentivaria mais ainda a casar com ele, não teria deixado minha opinião explícita. Saber que vocês iriam morar juntos depois da faculdade me fez surtar de raiva e foi assim que eu impulsivamente aceitei o mestrado em Roma, já não me importava mais se iria perder a parte que mais gostava em mim, ele já tinha me tirado você antes mesmo da minha ida... Pensei que era apenas um ciúmes bobo que as garotas sentem pelo namorado das amigas ou inveja por você ter achado alguém e eu não, contudo, era diferente. O problema não era quando ele te beijava, e sim, quando você beijava ele ou quando entrelaçava suas mãos nas dele como um nó.

Certa vez, mamãe me viu chorando no quarto logo após voltar de um passeio que fiz com vocês dois, lembro dela indagar "Você não está apaixonada pelo Fergus, não é?", na época eu não respondi, só continuei chorando no colo dela. Eu nunca quis ele, eu sempre quis você! Só que a ira dominava meu ser, tanto é que depois da formatura eu fui embora para Roma sem dizer adeus. Sabe quando você me perguntou na festa se eu recebi suas cartas e eu disse que não? Era mentira, cada uma delas chegou até mim, eu só nunca abri nenhuma... Mas guardei todas, porque eu precisava de algo seu comigo. Pensei em você todos os segundos, horas, dias, semanas, meses, anos e passarei mais de cada um deles porque o seu coração é dele e não meu... Eu sempre te amei, Celine.

Depois de quase 3 anos sem te ver, seu rosto ainda era muito marcante pra mim. não tinha uma parte de você se quer que eu houvesse esquecido. Seu sorriso demarcado, a melanina da sua pele e o aroma do seu creme de cabelo atormentavam-me constantemente por mais que eu já tivesse presenciado uma diversidade de belezas indescritíveis, a sua era a única capaz de me fazer perder a fome, ter tremedeira, insônia e ao mesmo tempo sentir fome, ter calma e dormir melhor do que nunca. Todos os dias longe de você eram pesadelos intermináveis, mesmo sem nunca nossos lábios terem se tocado os beijos alheios ficaram amargos e eu que sempre amei colorações vibrantes nas minhas telas, agora só conseguia pintar com preto e branco.

Todavia, o mundo não perdeu suas pigmentações para mim, não é isso, é que as cores simplesmente não parecem combinar mais comigo e por um lado, toda essa dor virou arte que tornou-me a grande artista que sou hoje. Quando o telefone tocou e eu ouvi sua voz, algo em mim emergiu como se tudo tivesse voltado ao seu devido lugar, somente não durou... Em seguida você anunciou que ia se casar com aquele dos olhos claros, boa pinta, sedutor, ombros largos e mais engraçado que eu e só Deus sabe o quanto me contive para não gritar de angústia...

"Noiva? Que notícia ótima!"

E você já sabe do resto, voltei para a cidade onde nascemos nos reencontramos e fiz o que fiz na sua festa de noivado, perdão por isso, aliás. Acho que me estendi demais nessa carta, só queria terminar manifestando o que você me despertou quando nos beijamos e quase... Enfim, nem nos meus melhores sonhos presenciei algo tão bom... Seus lábios são tão macios quanto dois marshmallows e o seu beijo é tão doce que poderia me resultar diabetes o excesso deles. Finalizo, sendo 100% sincera com você, eu cometeria o mesmo erro quantas vezes fosse possível até ser eu no lugar do Fergus.

Mil perdões, espero que algum dia possamos nos resolver...

Mil perdões, espero que algum dia possamos nos resolver

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