1.Que permite vários significados; opõe-se a unívoco.
É impressionante como as coisas acontecem na nossa cabeça. O tempo passa de uma maneira totalmente diferente. Não parece haver cronologias. Sem meio, fim ou início. Uma bagunça decretada. Um bololô de memórias. Especialistas da mente humana dizem que nossas sensações podem alterar lembranças. Podemos tirar, aumentar, inventar ou até mesmo esquecer nossas próprias memórias. Quando eu li isso imaginei como seria, se as minhas histórias fossem contadas por alguém que não fosse eu. Seria muito diferente? Ou permaneceria intacta? Será que as coisas realmente aconteceram como EU senti que aconteceram?
Mas eu não podia deixar de repetir aquele dia, aquele fatídico dia na minha cabeça mais uma vez. Eu costumo fazer isso. Se remoer tanto adoece, disso eu sei. A ansiedade faz isso. É quase como se o botão de replay tivesse afundado do controle.
Acho que a situação em que eu estava afundada até o pescoço só me fez cair em mim no dia do casamento. Até então esse dia parecia tão distante, a mil anos-luz. Vê-la de vestido branco foi como uma facada na boca do estômago. Eu gelei. Meus olhos marejados sobre ela... As flores... A decoração... O bolo... As gargalhadas.
Naquele dia eu me levantei da cama em que havíamos feito amor, em que eu havia te entregado meu corpo e alma. E eu estava só. O quarto ecoava o silêncio e o vazio que emanava do meu peito. Os lençóis ainda tinham o seu cheiro e o seu suor. As paredes daquele hotel escondem o nosso segredo...
Eu fui tão forte quando voltei para casa. O meu corpo sujo, foi assim que me senti. Eu era a outra, não Fergus. As digitais de Celine infestadas por mim, me faziam andar estranha quase como se tivesse nojo de mim mesma. Cheguei a vomitar no meio do caminho e até a chorar um pouco. Eu estava infeliz desde o começo, era só questão de tempo até que entendesse.
Fui mais forte ainda quando me arrumei para ir no casamento de alguém que eu amava e por um completo azar eu não era a felizarda. Eu não era ele e nunca seria. Minha face expressava luto. O preto das minhas roupas também. Mas os óculos escuros confirmavam. Eu definitivamente estava destruída. Entretanto, mal sabia eu que a pior parte ainda estava por vir...
Havia um cheiro forte de Champagne pelo ar quando ultrapassei a portela do quintal. O lugar estava infestado de gente, pessoas que eu conhecia e pessoas que não faziam a mínima ideia de quem eram. As gargalhadas altas preenchiam os espaços vazios. Alguns convidados conversavam, outros bebiam e uma parcela considerável admirava uns móveis feitos por Celine.
Tive a sensação de que todos ali sabiam sobre nós. Eu não conseguia fitar ninguém nos olhos, me sentia culpada. Era como se houvesse um imenso arame farpado enrolado na minha garganta. Eu sentia minhas mãos suadas molharem meu vestido. O meu coração disparava como uma arma de recarga automática, sem nunca ficar sem munição.
Eu vi Fergus próximo a mesa repleta de frios, enfiando algumas azeitonas na boca e ajustando os óculos. Foi naquele momento que mais uma vez o invejei. Por baixo dos óculos escuros as lágrimas ameaçavam despencar, mas me conti. Passei minhas mãos pelo meu pescoço dolorido.
-Oi, noivo! - Cumprimentei Fergus quando o alcancei, toquei sutilmente seu ombro.
-O-oi - ele respondeu tímido ficando de frente para mim. -Tudo bem?
-Como não estaria? - Forcei um sorriso. -É o casamento da minha melhor amiga.
-Se divertiram na mini despedida de solteira ontem? - Fergus indagou cruzando os braços com um semblante divertido.
-Ah... a despedida... foi divertida. Nós rimos muito. - Menti.
-Eu fico muito feliz por você estar aqui, Aurora, de verdade.
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ENTRE NÓS| ⚢
Roman d'amourUma série de cartas destinadas ao primeiro grande amor de Aurora. Cartas de amor, angústia, ira, boas e más lembranças. Seria o amor o único elemento capaz de sustentar relações? Seria o amor uma substância atemporal e isenta de interferências caus...