1. É aquela sensação de ano-novo de que tudo vai ser melhor.
Você estava enfiada no espaço criado pela porta entreaberta e o batente, os seus cachos estavam meio desarrumados - provavelmente hoje era um daqueles dias em que você só curtia preguiça no seu sofá, será que aquele era um momento ruim? -, mas o seu cabelo estava natural e um pouco maior que da última vez que o acariciei - aliás, fazer isso era como tocar as nuvens sem descolar os pés do chão. Uma camiseta maior que você cobria seu tronco e o começo das suas coxas - certamente ela era de Fergus. Na verdade, ela tinha o cheiro dele. É, com certeza era dele. E eu conseguia sentir aquele odor forte de perfume masculino vindo de você. As suas marcas de expressão dos lábios estavam bem demarcadas, aquilo me fez concluir que vocês haviam rido muito, não consigo te imaginar dando risada para massagear o ego dele - quer dizer, consigo sim, te vi fazer isso nos nossos tempos de faculdade. Você cruzou seus pés como se fosse um flamingo repousando. O ar de pergunta continuou pairando sobre aquela superfície quase que tangível entre nós duas, eram só dez centímetros de distância que existia entre nós, mas a verdade é que emocionalmente esse casamento nos afastou como se você estivesse aqui na Terra e eu em Netuno. Eu não podia, mas queria te beijar ali mesmo.
-Em, Aurora? O que você está fazendo aqui porra? - Ela murmurou com seus olhos inquietos, que não paravam de tentar enxergar se seu noivo estava por perto ao mesmo tempo que observava a movimentação na rua. -O meu casamento é amanhã.
-E-eu sei - repliquei baixinho.
-Então por que você está aqui? - Celine questionou cruzando seus braços e me fitando penetrantemente.
-A gente pode conversar em algum outro lugar? - Sugeri dando um passo para frente.
Instantaneamente ela recuou quase entrando por completo na casa.
-Você sabe que...
-...Eu sei que você não consegue ficar perto de mim sem me desejar - interrompi sua fala.
-Não - Celine negou em seguida balançando sua cabeça. -Você sabe que essa é uma hora ruim. - Ela quebrou nosso contato visual voltando a fitar de maneira desconfiada algum canto específico da sua casa, certamente era o lugar onde Fergus estava. -Volta para a casa da sua mãe, amanhã nós conversamos - consegui perceber de leve sua mão que segurava a porta pressionando a superfície de madeira para frente no intuito de fechá-la.
-Antes ou depois do seu casamento? - Fui direto ao ponto enfiando meu pé entre o limiar e o batente encarando-a.
-Por favor, vai embora! - Senti o calor do seu hálito tocando de leve minha pele do rosto e em meio a uma expressão que misturava suspeita e receio do que eu faria dali por diante. Era quase que impossível não enxergar o seu medo de que eu fizesse uma cena bem ali aquela hora da noite. -A gente não pode fazer isso agora e nem aqui, entendeu? - Essa frase escapou dos teus lábios como um doce sussurro sem doces palavras, mas por um lado elas não me impressionaram, aquilo era o esperado. No fundo eu estava me acostumando a essa dinâmica doentia.
-Não, Celine - falei igualando nossos tons de voz. -Eu entendi bem para caralho. É uma péssima hora porque você só quer que eu te coma quando seu noivo não está por perto. Você é muito previsível... - Rolei meus olhos suspirando forte, me afastando dela e da porta. -Eu já entendi essa merda.
-Você precisa de um lugar para dormir é isso? - Celine indagou mais uma vez, colocando um dos seus pés mais à frente. -Francis te irritou?
-Sabe como ela é. - Respondi passando as mãos pelo pescoço enquanto andava de um lado para o outro evitando fita-la diretamente nos olhos.
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ENTRE NÓS| ⚢
RomanceUma série de cartas destinadas ao primeiro grande amor de Aurora. Cartas de amor, angústia, ira, boas e más lembranças. Seria o amor o único elemento capaz de sustentar relações? Seria o amor uma substância atemporal e isenta de interferências caus...