Capítulo 1:

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CARLA

Carla: Ai — Ela salta sobre seu pé direito e segurar nos dedos machucados do esquerdo. Dando um olhar furioso para a mesa baixa de sua cabine minúscula e claustrofóbica, amaldiçoando o homem que era o motivo daquele cruzeiro terrível.

Arthur Picoli.

A imagem dele surgiu em sua mente, e apenas por um segundo, Carla apreciou o calor quase instantâneo que a percorreu. Mas o calor desapareceu um momento depois, sendo substituído por fúria. Era melhor que se concentrasse nesta emoção em particular. Afinal de contas, diferente de todos os outros passageiros do navio Malhando á Bordo, Carla não tinha subido a bordo para se divertir. Estava ali por uma razão. Uma razão muito boa.

Enquanto seus dedos latejavam em compasso com as batidas de seu coração, Carla cuidadosamente se apoiou sobre os dois pés, e deu dois passos necessários para chegar ao armário. Já tinha pendurado suas roupas e os poucos trajes que levava pareciam lotar o guarda-roupa. Pegando uma blusa amarela clarinha no cabide, ela levou para o banheiro a um passo de distância.

Carla: Muito bom Arthur — murmurou ela — Quando você reformou seu velho barco e o transformou num navio, deveria ter pensando um pouco mais naquelas pessoas que não moram na cobertura do dono, que fica no deque superior.

Mas disse a si mesma que aquilo era típico. Soubendo como Arthur era, mesmo antes de conhece-lo naquela noite abafada de verão, mais de um ano atrás. Ele era um homem devotado a ver sua companhia marítima tornar-se a melhor do mundo. Fazia o que tinha de ser feito quando necessário. E não se desculpava por isso.

Carla esteve trabalhando para ele quando o conheceu, como diretora dos cruzeiros em um dos outros navios da frota. Adorava o emprego, adorava a ideia de viajar, só não gostava muito de malhar. Que ironia!

Ela tinha totalmente se apaixonado pelo chefe. Tudo por causa de um encontro romântico a luz do luar e do charme inegável de Arthur. Carla soube muito bem que Arthur nunca se envolveria com uma funcionária. Então quando o sexy e maravilhoso Arthur Picoli a abordou no Pavilion Deck, presumindo que ela fosse uma passageira, Carla não o corrigiu. Tinha consciência de que deveria ter feito isso, mas que mulher não teria se deixado levar por um maxilar esculpido, olhos claros e cabelos castanhos que atiçavam os dedos de uma mulher?

Ela suspirou, apoiou as mãos nas laterais da pia minúscula e lembrou-se de como tinha sido o primeiro momento que ele a tocou. Mágico. Pura e simplesmente. Sua pele havia esquentado, e seu coração batido tão freneticamente que foi difícil respirar. Ele a girou numa dança, ali, sob a luz das estrelas, como uma brisa havaiana os acariciando, e a música do deck abaixo flutuando no ar como um suspiro.

Uma dança virou duas, e a sensação daqueles braços forte ao seu redor havia seduzido Carla para uma mentira que voltara a assombra-la menos de uma semana depois. Um caso sexual tão intenso que abalou sua alma, enquanto despedaçava seu coração. E quando depois de uma semana vivenciando aquele caso, Arthur descobriu por outra pessoa que ela trabalhava para ele, tinha terminado tudo, recusando-se a ouvi-la, e assim que eles haviam chegado de volta ao porto, ele a demitiu. A dor daquela dispensa era tão grande quanto no dia em que aconteceu.

Carla: Oh Deus, o que estou fazendo aqui? — Ela respirou fundo quando seu estomago começou a se revolver com o nervosismo que vinha se construindo em seu interior há meses.

Se houvesse outra maneira de fazer aquilo, ela teria feito. Afinal de contas, não era como se tivesse ansiosa para encontrar Arthur. Cerrando os dentes, ela ergue o queixo, virando-se de modo brusco batendo o cotovelo na maçaneta. Irritada, olhou para seu reflexo no pequeno espelho retangular e murmurou:

Carla: Você está aqui porque está é a coisa certa. A única opção. Ele não lhe deixou escolha.

Carla precisava falar com Arthur, e não era nada fácil conseguir acesso a ele. Uma vez que ele morava a bordo de seu navio de cruzeiros, ela não podia confronta-lo em terra firme. E nas poucas vezes que Arthur estava no Porto do Rio de Janeiro, trancava-se num apartamento de cobertura com mais seguranças do que havia na Casa Branca. Como ela não conseguia lhe falar pessoalmente, tinha tentado telefonemas, mensagens. E quando estes fracassaram, começou a lhe enviar e-mails. Pelo menos duas vezes por semana, nos últimos seis meses, Carla vinha lhe mandando e-mails que ele aparentemente deletava sem abrir. O homem estava sendo impossível, então Carla finalmente foi forçada a pagar uma reserva no Malhando á Bordo, e fazer um cruzeiro que não queria e nem tinha condições.

Ela não entrava num navio há mais de um ano, então, mesmo o menor balanço do navio fazia seus joelhos tremerem. Houve uma época na qual adorava estar num navio. Quando apreciava a aventura de um emprego que nunca era igual por dois dias consecutivos. Quando acordava todas as manhãs tendo uma nova vista pela janela de sua cabine.

Carla: É claro —  admitiu secamente— Isso quando eu tinha uma cabine com janela .

Agora estava na cabine mais barata que pode encontrar, sem janela e com sensação de estar trancada na barriga de uma fera. Era forçada a deixar a luz acesa o tempo todo, caso contrário, a escuridão era tão completa que era como estar dentro de um vácuo. A sensação era estranha e perturbadora.

Talvez se conseguisse dormir um pouco, ela se sentisse diferente. Mas foi despertada tarde da noite anterior pelo horrível ruído da corrente da ancora sendo erguida. Tinha soado como se o próprio navio estivesse sendo cortado ao meio por mãos gigantes, e uma vez, que aquela imagem se plantara no seu cérebro, Carla não tinha conseguido mais dormir.

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