136. COMEMORAÇÕES... E LUTO

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PARA SARAH, foi como se transportar de um local conhecido para outro próximo e também conhecido. O canal de Lila tinha sido excelente e, num rápido contato mental, agradeceu à prima.

Seu alojamento no QG do Comando de Espaço equivalia a um quarto de hotel pequeno, confortável e bem equipado. Sarah olhou a cama, mas preferiu a ducha. Ficou muito tempo debaixo do jato de água, como que tentando limpar toda a sujeira que vira no apartamento... e em Enrique.

Tentava não pensar, mas não conseguia. Havia imundície em tudo. No caráter de Enrique, que tinha parecido tão bom quando haviam se conhecido. No físico dele, largado e degradado, ofensivo a seus olhos, pois nenhum imperial que quisesse permanecer vivo podia se descuidar tanto. No ambiente, antes tão bonito e cuidado, transformado numa lixeira.

Encostou a testa aos azulejos frios da parede.

Uma coisa era bloquear as habilidades que Durina havia dado a ele, sabendo que poderia desbloquear quando quisesse, ou que desbloqueariam sozinhas quando ele se tornasse Rei. Outra coisa era pensar nele morto por ação do seu Palácio.

Sua mãe a conhecia muito bem. A racionalidade de Sarah compreendia os motivos, os objetivos, a falta de alternativas. O coração considerava outra imundície. O preço que as Linhagens pagavam por seu poder podia se tornar muito alto.

As lágrimas se misturaram à água do chuveiro.

A mãe viria, se chamasse, e Lila também, com certeza. Mas precisava ficar sozinha.

Afinal encerrou o longo banho. Chamaria atenção demais se passasse a madrugada inteira com o chuveiro aberto. Foi para cama e usou todo o treinamento que tinha para dormir, porque era melhor afundar no sono e esquecer. No entanto, não funcionou. A dor era maior. Revirou-se por muito tempo, tentando fugir dos pensamentos, até achar uma distração.

Fez contato com Durina, pedindo ao Palácio para não avisar aos pais. Não queria conversar com ninguém. Só precisava ocupar a mente.

O Palácio concordou sem protestar.

Desde que começara a aprender e treinar para bloquear as habilidades de Enrique, Sarah sabia que o plano tinha duas etapas. Primeira, impedir seu companheiro de continuar causando problemas. Segunda, a bolha de ilusão. Nas palavras de Lila...

Leve Enrique pra dentro de Durina, prenda na ilusão e peça ao Palácio pra prender você junto. E vai estar de volta aos tempos dos altos amores e pegações, e engravida, e fim de problema!

Era prático, sensato e exequível. Nos intervalos do aprendizado, Sarah trabalhava, juntamente com o Palácio, na estruturação dos parâmetros daquela ilusão. Com a Linhagem envolvida, a tarefa se tornava ainda mais complexa. No entanto, era uma complexidade que se relacionava mais a nível de detalhamento do que a dificuldades técnicas propriamente ditas.

Em um momento como aquele, era bom ter o que fazer.

A mente se concentrou na ilusão, acrescentando o muito que não poderia ver da atual forma física do seu companheiro. Para seus sentidos, ele precisaria ser o Enrique de oito anos atrás. Os parâmetros envolvendo o tato eram bastante delicados, e havia muita banha e flacidez a não sentir.

Sarah passou o que restava da noite concentrada em recriar um tempo muito mais feliz e, de alguma forma, isso acalmou sua mente e seu coração.

Quando chegou a hora de levantar para o desjejum, havia quase paz em seu espírito.

***

BEL COLOCOU os olhos na amiga e exigiu:

– Ok! O que foi que aconteceu?!

Olho do FeiticeiroOnde histórias criam vida. Descubra agora