31. VOCÊ ACREDITOU FÁCIL DEMAIS

412 41 1
                                    

ENRIQUE FICOU PARALISADO, em choque. E, quando desatou a falar, não parou mais:

– Eu ?! EU?! Como assim, EU?! Essa coisa doida nem me conhece pra saber como eu sou e pra que sirvo! Que é que eu vou fazer lá?! Que é que querem que eu faça lá, se nem sou telepata nem sei criar imagens no ar e nem sei levantar pessoas maiores do que eu?! Como é que podem me responsabilizar por uma coisa que nem conheço?! Como...!

Foi interrompido por um copo de água na cara. Abanou-se todo, como se estivesse se livrando de um enxame de mosquitos, e levantou com precipitação.

– Melhorou? – Sarah continuou sentadinha onde estava.

– Como é que você pôde fazer uma coisa dessas comigo?!

– Ah, com VOCÊ! Então vamos recapitular: tudo que você tem a fazer é estar lá na data e na hora certa, e ficar parado, esperando a previsão, porque só vai saber o que tem que fazer quando a hora chegar. Pra todos antes de você, foi fácil e óbvio, tão fácil quando aquela historiadora que reconheceu a ruína favorita dela. Não tem motivo algum pra não ser fácil pra você também. Agora, vamos ver o MEU caso: uma princesa de quase dezoito anos sem companheiro ouvindo do Olho do Feiticeiro que o companheiro que ela não tem é a pessoa requisitada de uma previsão catastroficamente colorida! Pelo menos, na hora, meu pânico foi grande o suficiente pra eu gritar que não tinha companheiro algum e não sabia onde ele estava, momento em que, gentilmente, o Olho do Feiticeiro disse que era pra procurar você na Escola de Entre Rios! Você por acaso tem ideia de quanto homem tem dentro daquela maldita Escola, entre alunos, professores, empregados e todo o resto?! Cinco mil, Enrique! E eu tinha que achar um só! E as semanas e os meses passando, e nada de eu achar você! Até minha mãe e meu pai já estavam pensando que o Olho do Feiticeiro tinha se enganado e que você não estava lá coisa nenhuma! E se eu não achasse você, como ia ser?! Uma desgraça pela frente, e ninguém ia saber qual era porque EU não tinha achado meu companheiro!

Sarah levantou diante do companheiro, batucando um dedo muito autoritário no centro do peito dele:

– EU não fiz nada com você! O Talismã da MINHA Linhagem fez COMIGO, se é que você não entendeu! E eu não dei chilique! Perguntei bem rápido o que precisava saber antes do Olho do Feiticeiro cortar o contato, tomei fôlego, me matriculei naquela maldita Escola com homem saindo de baixo de cada pé de grama e tratei de encontrar você! ISSO é ser Linhagem, senhor Enrique! Isso é o que me ensinaram a ser, o que você vai ter que aprender, e o que vamos ter que ensinar pros nossos filhos! Deu pra entender o tamanho do rebuliço em que se meteu quando me pediu em casamento?!

Ele estava sem voz diante do monte de razão que tinha a figurinha enfurecida na sua frente.

– E chega de chilique! Você queria saber, eu disse! Quer saber mais alguma coisa?!

– NÃO!

– Ok, fique aí se aclimatando com as novidades que vou lá molhar os pés no mar. Eu não vou nadar, ok?! Só vou molhar os pés, e molhar os pés pode!

Ela foi apenas até o limite das ondas, deixando a água gelada lamber seus pés.

Tinha sido fácil. Fácil até demais.

***

OS MINUTOS PASSARAM DEVAGAR. Indo e vindo, as ondas respingaram suas calças até os joelhos, mas Sarah continuou no mesmo lugar, os pés enterrando lentamente na areia.

Afinal, sentiu Enrique se aproximando. Ele parou às suas costas, segurou-a pelos ombros e perguntou:

– E se eu não tivesse pedido você em casamento daquele jeito muito doido?

Olho do FeiticeiroOnde histórias criam vida. Descubra agora