Capítulo 25: Amanda

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       Joguei minhas botas do lado da porta e caí na cama, frustada e preocupada. Rose sumira há cerca de duas semanas aproximadamente, e mesmo que todo dia eu e os soldados da casa Garlapar fizéssemos uma busca por toda a extensão de Zufreid, não a encontramos.
        Ron tentava me acalmar todas as manhãs durante o café da manhã, minutos antes de eu sair. Estava frustada, preocupada e triste, pensando no que eu tinha feito para merecer aquilo.
         A saudade era como uma faca, que cortava meu coração e doía há longo prazo. Coloquei as mãos no rosto e chorei, diante de todas as possibilidades existentes, Farwell me explicara sobre os Halab e os Rädsla Sniffers.
         Tirei minha roupa protetora e vesti algo mais leve. Meus nervos doíam e queimavam por conta do mesmo trajeto o dia todo diariamente desde que ela desapareceu. 
         Eu pedia aos deuses que se ela estiver morta, pelo menos me permitam encontrar seu corpo para lhe dar um fim digno. Me levantei da cama e olhei meu reflexo no espelho.
         Haviam sombras escuras abaixo dos meus olhos, resultado das noites mal dormidas. Suspirei secando as lágrimas e voltei para a cama.
         Alguns minutos depois alguém bateu na porta, escutei a voz de Ron pedindo para entrar e cobri o corpo. Eu estava de camisola, não seria muito apropriado ele me ver vestida assim.
         Ele entrou trazendo consigo uma bandeja com frutas, pães e sucos. Quase vomitei, a fome não era uma coisa comum ultimamente, me sentei tomando cuidado para manter meu corpo coberto e olhei para da bandeja para ele.
        — Não quero... — falei contraindo os lábios.
        — Meu pai disse que você precisa comer.
        — Diga a Farwell que eu decido o que preciso.
        Ron deixou a bandeja em cima de uma escrivaninha e sentou na beirada da cama, olhando para mim com expressão triste.
        — Amanda...
        — Não me force Ron.
        — Vamos encontrá-la, só é questão de tempo. 
        — Você diz isso há quase duas semanas! Estou começando a desacreditar de você.
        — Vai dar tudo certo Amanda...
        — Saía...
        Ron suspirou e se levantou, balançou a cabeça positivamente e saiu deixando a bandeja como todas as vezes. Virei para o lado e cobri minha cabeça com o cobertor, sentindo o cheiro de Rose no travesseiro, e como todas as noites, dormi.

Eu corria pela neve, a visibilidade era baixa e o vento estava forte. Ao longe eu conseguia ouvir os gritos de ajuda de Rose. Desesperadamente corri na direção do som, com as mãos em seu cinto de adagas.
         Era difícil continuar correndo, o vento estava irregular e me desequilibrava. A única coisa que me manteve de pé foi a determinação de chegar até Rose.
         Pisei em falso e caí, sentindo o tornozelo doer como se tivesse partido em dois, porém, me levantei novamente e continuei correndo, ignorando a dor o máximo que conseguida.
         De repente o vento cessou e a nuvem branca desapareceu, Rose estava caída no chão despedaçada, enquanto um Rädsla a devorava. Sua pele escura e gosmenta refletiu a luz do dia.
        Ele olhou para mim, seus dentes afiados pingando sangue, e os olhos vazios me observaram. De repente a criatura gritou irritada e desapareceu. Caí de joelhos diante dos restos da pessoa que amo e gritei enquanto as lágrimas congelavam em minhas bochechas.
         Acordei em um sobressalto. Mais uma vez aquele pesadelo me atormentara. Vesti a roupa de proteção e calcei as botas. Olhei para o lado da cama em que Rose ficava e contraí os lábios.
         Saí do quarto a passos rápidos e largos, ouvindo os murmúrios e conversas na mesa do café. Ron me olhou contraindo os lábios como todas as manhãs. Me sentei na cadeira mais afastada dele e comi pouca coisa.
         Calcei as luvas e rumei na direção da porta, levantando a máscara para cobrir meu nariz e boca. Amarrei meu cabelo em um coque e ajustei o capuz.
         Abri a porta e observei os soldados preparando os cavalos para nossa busca novamente, mas no fundo eu sabia que em algum momento teríamos que seguir a pé, sempre acontecia.
          — Vamos adentrar o território dos Halab hoje, mantenham em formação — disse o comandante.
         Assenti, o comandante me prometera que iríamos avançar um pouco, procurar por um lugar só toda vez não ajudaria em nada.  
         — Milady — cumprimentou um soldado —, fique ao lado do comandante, é mais fácil para ver.
         — Certo — minha voz saiu abafada pela máscara.
         Subi no cavalo e ajeitei meu corpo, mas o comandante não saiu e, olhava fixamente para a porta. Segui seu olhar e de repente ela se abriu.
        Ron estava terminando de calçar suas luvas enquanto vinha em nossa direção, vestido com um traje diferente do meu que parecia ser feito de couro mais resistente.
        Desviei o olhar dele, quase não acreditando que ele nos acompanharia, afinal, nunca fora. Eu o xinguei na minha mente, provavelmente estava ali por ordem de Farwell.
         Ouvi o rei dizer que não confiava em seus homens para me protegerem, mesmo que em doze dias de buscas nada me acontecera. Farwell se culpava pelo desaparecimento de Rose.
         Ron assumiu minha retaguarda e enfim partimos, passando por uma abertura dentro da montanha que cercava a parte traseira do castelo. Perguntei uma vez se Farwell não tinha medo de ser atacado pelas costas, mas Ron explicou que a passagem era escondida.
         A única e principal entrada do reino era pela frente, e mesmo que potenciais inimigos tentassem atacar pelo alto, uma barreira fora conjurada ali pelo rei. Pensei nos poderes dos outros reis, ou Duques das casas.
         Cada um tivera uma dádiva dada pelos deuses, todos os duques líderes das diferentes casas existentes. Saímos do outro lado sentindo o açoite do vento contra nossos rostos, todos os dias sentíamos a mesma coisa.
         Percorremos todo o campo aberto, tentando cobrir a maior área antes das primeiras três horas da manhã. Eu refiz tantas vezes esse caminho, que podia andar de olhos fechados e mesmo assim conseguiria chegar até às planícies antes do caminho entre as montanhas.
          Entraríamos em breve no território dos Halab, que fica bem na encosta do caminho entre as montanhas. Nos dividimos em dois grupos e cada um seguiu para um lado, Ron ficou no meu grupo, o que me fazia ainda mais acreditar que ele estava ali por ordem do rei.
         Ali o vento era mais fraco e a visibilidade era melhor, segui pela direita da encosta logo atrás do comandante, com Ron atrás de mim e mais um na retaguarda. De acordo com ele, já estávamos em território hostil.
         Nossas atenções estavam voltadas na neve das paredes, para o caso de uma movimentação irregular, que indicava presença de Halab. Subimos uma pequena elevação, com duas paredes de montanha dos dois lados, um ótimo lugar para emboscada.
        Procuramos sinal de pegadas ou sangue, mas não encontramos nada. Desci do cavalo e subi mais um pouco, sendo seguida por um soldado. Ele cuidaria da minha proteção.
         No topo haviam algumas poucas árvores e mais neve. Continuei pela esquerda em cima da montanha, o vento balançava a barra do traje e meus cabelos só continuaram no lugar por estarem presos.
          Olhei a extensão de outro campo aberto, com poucas árvores que desaparecia além da minha capacidade ocular de visão. O soldado continuava por perto, atento ao chão em qualquer vestígio.
       — O que tem para lá? — apontei com a voz contida pela máscara.
       — Para lá tem a montanha corta-vento.
       — Para o que ela serve?
       — Contém a maior parte do ar cortante do Norte, só conseguimos andar por aqui graças a elas, além disso, lá fica o maior território de Rädsla Sniffer.
        — Qual é a possibilidade de Rose ter ido até lá?  
        — Mínima.
         Assenti e dei um passo. De repente ouvi um estalo, como se um galho se partisse. Olhei para o soldado que parecia inquieto. O chão começou a estremecer e a única coisa que pensei foi em correr.
         Atrás de mim eu conseguia sentir a vibração na neve. Algo grande estava me perseguindo, e eu tinha certeza do que era, só não queria olhar. Voltei pelo caminho que fiz e tentei subir no meu cavalo, mas ele saiu trotando antes de mim.
          Caí na neve e me levantei rapidamente. Ron me puxou de um esconderijo em uma fenda na montanha e então o vi. O Halab parou perto da fenda, seus dentes afiados brilhavam e os olhos estavam fixos el mim.
         Tinha garras enormes e afiadas, além de um corpo bem grande, seus pelos eram brancos, e a única coisa que não tinha branco, era o focinho escuro. O Halab se preparou para soltar um rugido, mas Ron disparou uma flecha que ao atingir o monstro, liberou uma mistura de pólvora e brasas, causando uma explosão pequena, mas forte o suficiente para tontear o monstro.
          Os soldados se reagruparam e enfrentaram o Halab, peito a peito, sem tocar nele, uma lei da natureza para definir quem era o mais forte ali. O monstro foi atacado com as flechas de explosão, obrigando-o a recuar.
         Ron me puxou até o cavalo mais próximo e subiu. Coloquei-me atrás dele e escapamos dali, enquanto os soldados iriam lidar com o Halab. No caminho, o filho do rei me explicou que a ponta da flecha tem dois pequenos compartimentos.
          Um deles tem pólvora — o maior — e o segundo tem brasas acesas, conservadas acesas por conta do ferro da ponta, quando atingem o alvo, os compartimentos se juntam e as brasas acendem a pólvora causando a explosão.
         Inteligente e engenhoso.
         Voltamos para o castelo e caminhei rapidamente de volta ao quarto, meu corpo estava frio e eu precisava me esquentar. No banho, comecei a me perguntar se um dia encontraria Rose, e se iria estar viva ou morta.
  
       
        

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