Capítulo 32: Amanda

20 2 0
                                    


       Chorei por três dias inteiros, todas as nossas tropas foram expulsas de Vurian, e fomos obrigados a nos retirarmos do lado Norte. Mas antes de irmos, precisávamos lutar e buscar Rose no território inimigo, mesmo que eu escutasse o tempo todo que já não tinha o que fazer.
        Três noites chorando, três dias lutando. O povo Manak que Rose estava, já lamentava como se ela estivesse morta, mas eu não conseguia acreditar naquilo. O amor da minha vida tinha que estar viva.
         Mas não adiantou. Três dias de batalha não serviram para nada, pois fomos facilmente superados pelos inimigos. Então, começamos a nos preparar para a volta à Millandus. Fui obrigada a ir. Por minha vontade eu ficaria ali lutando até meu último suspiro.
        

Olhei meu reflexo no espelho, haviam alguns ferimentos, um corte no lábio e vários outros menores espalhados pelo meu rosto. Lavei minhas mãos três vezes e parecia que nunca conseguiria as sentir limpas. A todo momento eu continuava sentindo o sangue dos inimigos.
        Eu parecia com Rose naquele momento, marcas de batalha e inúmeras mortes que eu levaria para minha vida toda. Abaixei a cabeça e não evitei que as lágrimas caíssem, era tão frustrante aquele sentimento de perda.
          Vesti meu traje e rumei na direção do andar inferior. Todos estavam abatidos, até os Azarir. Subi minha máscara quando estavam prestes a abrir a porta. Entrei na segunda carruagem e fiquei em silêncio.
           Não disse nada por todo o caminho, afinal, não tinha o que dizer, nem ao menos respondi as perguntas que me eram direcionadas de vez em quando.
          Vi quando adentramos campo aberto em direção à muralha e me permiti chorar quando todos estavam dormindo. Ron me dissera que quando o imperador levava alguém, era certo que morrera.
          Ainda mais alguém como Rose, que era considerada a garota da profecia por muitos povos. Eu só conseguia pensar em apenas uma coisa, essa tal profecia causara sofrimento à Rose.
          Pedi aos deuses que não tivessem permitido ela sofrer, não sei se aguentaria saber que Rose sofrera antes de partir e afastava qualquer pensamento ao contrário disso.
          Preferia acreditar que ela tivera uma morte rápida do que pensar em torturas que possa ter sofrido. A viagem demorou menos de quatro dias, e quando chegamos em Millandus, muitas pessoas nos esperavam. 
          Quando desci da carruagem, Marcus estranhou as marcas de batalha em meu rosto e, caminhou na minha direção com expressão confusa, pois era quase certo que não esperaria pessoas abatidas.
         — Onde Rose está? — perguntou procurando por ela —, não a vejo em lugar algum.
         Todos ao redor pareceram perceber a pergunta que Marcus me fizera. Balancei a cabeça negativamente e ele ficou pálido, talvez de medo.
        — Amanda... onde Rosemary está... onde ela está?
         Fiquei em silêncio deixando que lágrimas rolassem por minhas bochechas. Marcus finalmente pareceu entender e simplesmente abaixou a cabeça.
         — Como...? — me perguntou ele com os olhos se enchendo de lágrimas.
         — O líder dos Pesadelos... eles atacaram Vurian... estávamos lá... ele a levou...
         Marcus olhou para o céu sem acreditar no que ouviu. Eu conhecia o que ele estava sentindo, aquele sentimento de não poder se despedir dela.
        Mas em meio às lágrimas, eu vi ódio se instalar em seus olhos, e tive a sensação de uma pressão no ar. Eu sabia o que significava, Marcus queria vingança.
        Eu o deixei com seus pais e subi sozinha em direção a estalagem que minha mãe estava morando, naquele momento o que eu precisava era estar com ela, precisava do seu abraço. 
        Bati duas vezes na porta, esperei e bati mais duas vezes. Minha mãe abriu a porta e sua expressão mudou quando viu os ferimentos em meu rosto, sabia o que significava.
        Tentei contar o que acontecera, mas não consegui e agradeci aos céus por ela ter entendido. Senti seu abraço e chorei pelo resto da tarde. Não ter Rose por perto cortava meu coração.
        O dia seguinte amanheceu chuvoso, as ruas ficaram vazias. Os raios não paravam e a terra parecia revolta ao que aconteceu. O mundo todo parecia se pronunciar.
        Não saí da cama naquele dia e mesmo que tentasse, os esforços seriam em vão, eu não conseguiria. Apenas observei o céu nublado com os raios o cortando.
         Eu tinha que voltar a casa de Rose, precisava deixar minha mãe em paz, mas simplesmente não conseguia levantar, nem dormir. A todo tempo eu pensava no seu sussurro. Eu te amo.
        

Desci rua abaixo para encontrar Marcus. Uma semana havia se passado e finalmente parou de chover. Estava mais que na hora de voltar para a cada que Rose dividira comigo.
         O futuro guerreiro dos Infeor estava me esperando, usando pela primeira vez uma roupa mais comprida. Um sobretudo marrom com calças de couro pretas.
         Seu rosto estava abatido, e eu conseguia entender o motivo. Dei um aceno leve de cabeça para ele e seguimos em direção a antiga casa de Rose. Não ousei dizer nada, não parecia que ele queria isso.
         Parei de frente a porta, segurando lentamente a chave que havíamos deixado na casa de minha mãe. Minhas mãos tremiam, eu não tinha certeza se aguentaria fazer aquilo. 
        Marcus repousou suas mãos por cima das minhas e olhou para mim, tentando conter o choro.
         — Juntos — disse ele.
         — Certo — minha voz saiu tão baixa que pareceu um sussurro.
         Abrimos a porta e o cheiro dela me atingiu. Desabei de joelhos e comecei a chorar de novo, sentindo uma saudade imensa em meu coração.
        Marcus me ergueu devagar e caminhamos para dentro. Tudo ali me fazia lembrar dela, a casa toda tinha seu cheiro adoçicado.
         Depois de meia hora finalmente tive forças para fazer chá, Marcus acendeu a lareira e esperou no sofá até que eu chegasse.
         Sentei de frente para a lareira e encarei o fogo, tomando goles rasos da xícara em minhas mãos. Eu não conseguia fazer nada sem lembrar de Rose e acabar chorando de novo.
         — Ela irá fazer falta... — murmurou ele.
         — Vai mesmo...
         — Eu queria dizer que... não vou contar para ninguém a relação que vocês tinham.
         — Não ligo mais pra isso, por mim, que saibam.
          Marcus concordou com a cabeça. Assim que amanheceu, percebi que o mundo estava mesmo se manifestando contra a morte de Rose, pois uma forte nevasca assolou o reino, fazendo Millandus entrar em inverno antes da hora.

Os Ventos do NorteOnde histórias criam vida. Descubra agora