— Belo disparo — falei indo até o alvo para recolher a flecha —, mas demorou demais para se concentrar, tem que ser mais rápido, seus inimigos não esperariam você se concentrar para atirar.
Uriah juntou os pés novamente, soltando um suspiro. Eu já conseguiria adentrar campo aberto sem antes ver a habilidade do garoto com o arco. Não era ruim, só precisava de mais treinos, porém, dava para o gasto.
— Pronto para irmos? — recolhi algumas flechas do chão e entreguei para ele —, vamos antes que o sol ilumine melhor a cidade.
Ele acenou positivamente com a cabeça e então saímos da parte traseira da estalagem. Na porta, olhei para os dois lados, afim de verificar se a movimentação seria segura até os portões do reino.
Uriah ficou às minhas costas, me seguindo de perto. A cidade ainda estava um pouco escura, pois eram as primeiras horas da manhã, tínhamos que estar fora do reino antes que o sol a iluminasse completamente.
Seguimos pelo labirinto de casas, observando atentamente cada beco, esquina ou curva, para contornarmos os soldados do império, afinal, para todos eu estava morta e, ninguém precisava saber que era o contrário.
Chegamos perto dos portões, havia um soldado escoltando a entrada e saída, apenas um. Lamentei por ele, pois eu não seria misericordiosa.
— Fique aqui — pedi a Uriah.
Cobri minha cabeça com o capuz de um manto que comprei e caminhei devagar até o soldado. Ele parecia estar tomado pelo sono, e quase não percebeu minha aproximação.
Enquanto caminhava, meus olhos percorriam todos os arredores, a procura de algum sinal de outros soldados por perto, eu me daria mal se estivessem observando a entrada de outro lugar.
Meu coração batia forte, eu estava nervosa, não sabia porque, mas estava. Era como se milhares de olhos estivessem sobre mim, me observando, esperando eu fazer o que pensava.
O soldado ergueu a cabeça levemente, finalmente percebendo minha aproximação lenta. Ele me olhou de cima a baixo e sorriu, provavelmente achando que eu era uma prostituta ou algo do tipo.
Um plano eu já tinha, faltava apenas o alternativo. Lutar não era uma boa opção, pois se o imperador estivesse no reino, reconheceria meu padrão de combate.
Tendo isso em mente, limpei a garganta e procurei o tom de voz mais suave que eu podia fazer. Se minha voz fosse um pouco agressiva ele notaria, Joel já me dissera que, qualquer soldado é treinado para identificar tonalidades de voz, afim de perceber uma ameaça antes de ela se revelar.
— Olá? Pode me ajudar? — usei a voz suave que pareceu enlaçar o soldado rapidamente.
— É claro que sim, coisa linda.
Soltei uma risada tímida, claramente fingida, mas o soldado estava ocupado demais tentando me seduzir para sequer perceber.
— Pode falar, boneca.
— Bom, eu preciso... — retirei a adaga da bainha rapidamente e a enterrei abaixo do queixo dele —, que me dê licença para passar — sorri.
Encostei o soldado no muro enquanto ele caía lentamente, seus olhos estavam vidrados em mim, como se estivesse vendo um demônio na sua frente.
Tirei a adaga e o deixei agonizando, seu corpo tremeluziu e ficou imóvel logo em seguida. Limpei lâmina e a guardei, virei na direção em que Uriah estava e o vi acenando, tentando chamar minha atenção.
Virei tarde demais para ver o que ele estava tentando me alertar. O soldado levantou e me agarrou pelo pescoço, com uma força incrível, mesmo estando com o pescoço jorrando sangue.
— Sua vadia! — rugiu ele no meu ouvido —, vai pagar por isso, vou te fazer se arrepender de ter me atacado.
Senti sua mão prestes a alcançar lugares proibidos do meu corpo, que até então apenas Amanda havia tocado. Girei o corpo com a adaga em mãos, a lâmina brilhou quando terminou de fazer seu trabalho, de modo perfeito e uniforme.
A mão que tentava me tocar, caiu no chão, e antes que o soldado pudesse gritar de dor, com apenas um golpe cortei sua garganta, a ponto de eu conseguir ver a cartilagem tireóidea e sua jugular jorrando sangue.
Seu corpo deu um único espaço e caiu com as costas no muro. Fiquei ereta enquanto respirava fundo, controlando o nervosismo. Uriah se aproximou encarando a adaga em minhas mãos.
— Isto é... da minha mãe — disse ele.
Eu sabia que não teria como esconder por muito tempo o que havia acontecido de fato e precisava contar para ele, afinal de contas, Uriah descobriria por conta própria em algum momento do futuro.
Agachei para ficar do seu tamanho, peguei suas mãos, sujando-as de sangue, o sangue do soldado. Encarei ele nos olhos, respirei fundo e organizei as palavras em minha mente antes de as dizer.
— Uriah... sua mãe estava sofrendo, metade do corpo dela não estava preso, na verdade, estava esmagado por aquela pedra enorme... não havia nada que pudesse ser feito — os olhos dele começaram a se encher de lágrimas —, ela... — limpei as minhas lágrimas —, ela me pediu para acabar com o sofrimento dela e cuidar de você... eu prometi que cuidaria, e então...
— Você tirou o sofrimento dela...
— Isso... tirei... e agora ela mora na Cidade nas Nuvens, com uma rua de ouro e muita paz.
— Ela sofreu...?
— Não, eu garanto a você que ela não sofreu nada, nem sentiu dor, seu fim foi rápido.
— Promete?...
Abracei ele, ouvindo seu choro perto dos meus ouvidos. Não consegui segurar minhas lágrimas, pois eu conhecia aquele sentimento, a perda era como um veneno, que se a pessoa não tiver força, dificilmente conseguiria suportar a dor.
— Eu prometo — apertei ele ainda mais.
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Os Ventos do Norte
FantasiEm um mundo assolado por uma praga, Rosemary cresceu sozinha, dentro de um reino selado pelo medo de serem contaminados. Decidida a ajudar o exército real na luta contra os rebeldes conhecidos por Pesadelos, Rose descobre que há uma maneira de acaba...