XXIII

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Dias se passaram na embarcação clandestina. Arin trabalhava como auxiliar de cozinha, muito melhor que içar velas, como algumas vezes já fizera. Seu trabalho era basicamente ajudar o chefe, um macho de cabelos grisalhos e pele morena. Muitas cicatrizes espalhadas pelo corpo, mas nessa vida, Arin aprendeu que todos têm segredos, alguns apenas mais visíveis que outros.

Ela atraía o olhar de vários machos, incluindo do capitão. Mas deixava que percebessem que ela têm treinamento suficiente para saberem que ela não é alguém que deveriam mexer.

Quando o barco encostou no cais da outonal, Arin se manteve sentada atrás de um mastro fingindo estar enrolando cordas. Tempo suficiente para que todos desembarcassem e ela tivesse analisados os principais pontos do porto e garantido que não havia perigo. Ela estar segura, significa sucesso da missão, não sabia dizer quantas vezes tinha escutado isso ao longo do seu treino na Ordem.

Desceu do barco, sua próxima missão era seguir direto para a primaveril, e se conseguisse um cavalo no caminho ainda melhor. Mas com um possível Azriel solto por aqui ela não arriscaria sair a procura de um. Qualquer coisa que precisasse, teria que esperar chegar à corte bagunçada de Tamlin agora.

O porto estava mais agitado que da última vez que estiveram aqui, podia notar na atmósfera do lugar que todos estavam preocupados. Ouvira boatos na embarcação de exércitos abandonando a primaveril, mas que ninguém sabe para onde foram.

A jovem espiã cobriu o rosto com o capuz do manto que levou. Em um lugar que ninguém queria ser reconhecido, ela era apenas mais uma à tentar esconder o rosto. Arin apressou os passos para sair da cidade, mas seguros no alto fluxo de pessoas o quanto pudesse. Era melhor para se misturar e Azriel não conseguiria sentir seu cheiro.
Arin olhava para trás quando esbarrou em uma senhora de idade.

- Desculpe. – falou a jovem com pressa.

- Que cabelo lindo você tem, quanto quer por uma mecha dele? – disse a velha senhora retirando o manto de Arin.

- O que? Não vou vender nada, se puder me soltar estou com pressa.

A velha segurou firme no cabelo de Arin.

- Pago o quanto você quiser minha querida.

Arin agarrou as mãos da senhora, estranhando o quanto eram frias, e forçou a soltar seu cabelo.

- Não vou vender, preciso ir senhora. – Arin girou os pulsos da velha sem machucar, e correu até que a perdesse de vista.

Não achou um cavalo, apenas uma senhora louca. Melhor que ter esbarrado com Az.

A mudança de estação foi bem vinda para ela. Nada contra o outono, mas a primavera era muito mais linda. Ou deveria ser. Como a corte reflete o estado de espírito do seu Grão Senhor, a primaveril invés de estar florida, estava seca. Não haviam flores, apenas galhos secos e quebrados. Arin olhou horrorizada. Pássaros migrando em direções opostas à essa época do ano em procura de alimento. Pequenos animais caçando em plena luz do dia. Urros que arrepiaram a fêmea ao fundo da floresta. Não era mais uma Corte, apenas uma floresta abandonada. Teria que manter os olhos e ouvidos bem atentos desde aqui, ela sabia das histórias de seres que viviam em cada corte, e não queria reviver seus piores pesadelos com os que circulam pela Primaveril.

Arin andava devagar o suficiente apenas para não fazer barulho e não se cansar. Em poucas horas de caminhada estava a beira de anoitecer, escolheu árvores altas, e subiu. Longe o suficiente do chão, amarrou sua cintura ao tronco da árvore. Não ousou respirar alto, todo movimento lento e calculado. Usava ervas para mascarar seu cheiro. Estava invisível por hora.

O amanhecer invadiu os sentidos da espiã. Estava clareando, a floresta seguia quieta. Árvores nem animais se mexiam. Depois de verificar que nada estava diferente, Arin desamarrou a corda que a prendia na árvore, guardou na bolsa e escalando a volta, desceu. A respiração sempre controlada, os ouvidos treinados estavam atentos, tudo silencioso.
Calmo demais, Arin achou. Ela tinha que sair dali, não tinha um bom pressentimento. Levaria apenas alguns dias a pé, tinha que sobreviver à isso só por alguns dias.

Na próxima missão quero ir pra algum lugar cheio. Tudo parece pior nesse silêncio.

Quatro dias se passaram, Arin não achou nenhuma fruto ou caça, estava sobrevivendo apenas com água, silêncio e kilômetros de caminhada pela frente. Estava exausta e faminta.

Apenas mais alguns dias.

......
- Quer mais? – Azriel perguntava sobre o vinho que estavam tomando, tirou a franja de Arin do rosto enquanto a olhava esperando por resposta. Eles estavam sentados no tapete do quarto, a janela estava aberta e chovia lá fora, eram iluminados apenas pela leve fogueira que ainda estava acesa na lareira. Eles vestiam apenas um lençol e as pernas de Arin passavam por cima das pernas do Encantador.

- Não, só quero ficar aqui mais um pouco. – ela deitou a cabeça no braço de Azriel.
Apenas os dois, juntos em uma cabana, com a chuva caindo lá fora. O mundo poderia acabar neste momento que Arin estava feliz.

Azriel acariciava o braço dela, subiu o dedo devagar até chegar em seu pescoço, onde arrastou uma mecha de cabelo para trás do ombro, e beijou a clavícula da jovem. Arin extendeu o pescoço para trás e suspirou. A outra mão do espião desceu a lateral do corpo dela, passeando suavemente pela cintura e apertou. arrastou a mão por trás dela e a outra juntou os joelhos, pegando a fêmea no colo quando levantou, e caminhou para a cama, deitando-a ali enquanto depositava beijos por todo o colo e pescoço de Arin. Ela estava no paraíso, um fogo descia de sua garganta até seu baixo ventre. Ela se contorcia na cama a cada toque e beijo do Encantador. Podia sentir as sombras passeando por suas pernas e costas, jamais imaginaria como sombras podem ser tão fundamentais para certas atividades.

Estavam se beijando com fome, mãos se perdendo no corpo um do outro quando algo uivou longe. Arin não se preocupou com isso, apenas ignorou o som. Mas o uivo surgiu de novo, mais perto dessa vez. Não fazia sentido se estavam na casa do vento.

Arin passou as mãos pelos cabelos do Encantador, desceu com o indicador até as costas, no meio das asas e apertou com as unhas. Em resposta, Azriel se pressionou mais contra ela. Arin queria congelar esse momento.

Mas uma batida de asas na perna da jovem a acordou.

Algo estava acontecendo.

Ela escutou o uivo novamente, estava em algum lugar da floresta.

Perto.

Ela diminui a respiração ao mínimo, precisava se concentrar em localizar a criatura, identificar com o que estava lidando e depois planejar algo. Por enquanto não se mexeria para não ser notada. A criatura só sentiria o cheiro dela se estivesse perto o suficiente para vê-la, mas ainda não parecia o caso.
Os pássaros vieram de trás da árvore, o que significaria que a criatura está nessa direção. Droga. Arin não podia se mexer para tentar enxergar o que era, se moveria o menos possível. Ela suspirou devagar, controlando toda a expiração.

Custava eu também ter uma asa? Pela mãe, tudo seria mais fácil.

Ela se concentrou nos sons da floresta agora. Fora as asas dos pássaros ao longe, não se escutava mais nada, é como se toda a floresta estivesse esperando por algo acontecer. Nem as árvores balançavam. Apenas aquele silêncio que congelava os ossos da garota.

Corte de Adagas e Sombras - Fanfic AzrielOnde histórias criam vida. Descubra agora