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Pedi para usar o telefone. Não colocaram qualquer entrave. Expliquei que seriam duas chamadas internacionais. Continuava a estar tudo bem. Que diferença... em casa era um drama se demorasse mais do que cinco minutos a falar com a Monique, que morava a dois quilómetros de mim. Claudia estava estendida no sofá a ver televisão, na companhia de duas amigas, Maria e a senhora Rispoli arrumavam a cozinha e tratavam da roupa, eu fui até à mesinha do telefone.

O primeiro telefonema foi para a minha casa. Falei com a minha mãe, que me pareceu querer despachar-me a partir do momento em que soube que estava tudo bem comigo, que me estava a divertir muito com a Monique. Isso costumava acontecer, a minha mãe tornava-se impaciente quando lhe interrompia uma coisa que a estivesse a distrair e que estivesse a gostar. Despedi-me e ela desligou logo.

O segundo telefonema já foi mais longo e também mais complicado. Liguei para a casa de Jean-Marie. Atendeu-me ele e a primeira coisa que perguntou foi se já sabia a que horas chegava a Munique, se estava a telefonar do aeroporto. Esclareci-o. Era demasiado tarde, iria ficar mais aquela noite em Nápoles. Irritou-se. Fechei os olhos, mordi os lábios. Não lhe podia contar a verdadeira razão de não estar no avião particular a caminho da Alemanha. Para além de se irritar, iria encolerizar-se e era bem capaz de me vir buscar a Itália, dar um sermão a Diego, proibir-me de o voltar a ver, avisar o argentino que nunca mais me procurasse. De resto tinha-me parecido uma exigência absurda pedir para viajar, solicitar o avião particular, depois daquele frenesim todo à minha volta relacionado com o meu abandono junto ao San Paolo.

– Quero ficar para o Carnaval – menti.

"Qual Carnaval?"

– Existe Carnaval em Nápoles. A Claudia, a mulher de Diego, disse-me que é muito bonito. E... e estou cansada, hoje não me apetecia andar de avião. – Foi uma declaração bastante petulante. Detestei-me. Estava a contar mentiras e a ser presunçosa. Jean-Marie não merecia isso. Ele era meu amigo, sempre muito atencioso comigo, ajudava-me, cuidava de mim, integrara-me na sua família.

Ele perguntou-me, mais calmo:

"Ma petite, está tudo bem contigo? Estás a gostar de Nápoles?"

– Ainda não vi nada de Nápoles, Jean-Marie – queixei-me.

"Ah... já percebi."

– Sim, queria ver a cidade, pelo menos. Ontem cheguei tarde, hoje foi o jogo e esteve um tempo péssimo todo o dia, choveu muito.

"Apanhaste chuva?"

– Não. Não apanhei chuva – tornei a mentir. Mordi a língua.

"E Maradona?"

– O Diego está bem... o que queres saber dele?

"Está a tratar-te bem?"

– Claro que sim, Jean-Marie. Porque é que desconfias tanto de Diego? Isso deixa-me triste.

O belga estava cheio de razão. A casa de Diego era um circo, eu e ele mal conversámos, foi só aquele pequeno momento em que ele me mostrou a canção que tinha gravado para ajudar a UNICEF e mais nada. Estivera, na maior parte do tempo, entregue a estranhos, gente simpática, mas desconhecida, tinha acontecido aquele incidente no estádio, podia ainda ficar doente e nem sabia se no dia seguinte teria mais atenção de Diego. O jogo do Napoli fora maravilhoso, no estádio San Paolo, mas agora, fazendo uma revista ao dia, parecia uma pequena nota de rodapé no meio de uma enxurrada de eventos.

Jean-Marie tinha ficado calado. A seguir pediu-me desculpa e acrescentou:

"Quero que estejas feliz e isso é o mais importante."

Aqueles Dias de MaravilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora