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O reflexo no espelho mostrava-me intensamente corada, os olhos húmidos, os lábios vermelhos. Tomara finalmente banho, um duche rápido. Diego quisera enfiar-se na cabina comigo para poupar tempo, mas eu afastara-o escandalizada. Exigira-lhe privacidade. Não, não podes tomar banho comigo! Achei que seria intimidade a mais. Estava bem ciente que era um contrassenso, uma vez que tínhamos acabado de fazer sexo, mas passada a loucura do desejo eu voltava a ser a Cristina Velez normal e tentava manter algum decoro, no meio da minha desgraça.

Penteava-me e via naquele espelho a imagem acusadora do pecado mortal da luxúria. Não queria sair do quarto com a evidência do que tinha feito. Inventava mentalmente mil e uma maneiras para me esconder e disfarçar, que depois descartava por serem demasiado estúpidas e ineficazes. O melhor remédio seria ceder ao sono e repousar algumas horas, deixar os meus níveis hormonais voltarem ao normal, mas não tinha esse tempo. Estávamos atrasados e devíamos seguir o quanto antes para o aeroporto. O avião esperava, claro. Por ter sido fretado pelo clube, haveria alguma condescendência. Atribuía-se a demora à vitória que gerava algum laxismo, mas não acreditava que os alemães estivessem dispostos a esperar para sempre. E não esperariam por mim, de certeza absoluta!

Diego percebeu a minha perturbação. Passou atrás de mim e disse:

– Toda a gente sabe o que estivemos a fazer.

O seu tom casual perturbou-me mais. Sustive a respiração.

– Toda... a gente?

– Sim. Toda a gente.

– E...?

Encolheu os ombros. Agachou-se junto à mala.

– Não te preocupes, eles não vão contar a ninguém.

– Como é que sabes? Eles... eles, quem? De quem estás a falar?

– Deles! – respondeu esticando um dedo no ar. Olhei para a porta do quarto. O burburinho no corredor acalmava-se. Estava toda a gente a deixar o hotel e nós também tínhamos de sair, com caras de culpa ou não. Diego acrescentou: – São meus companheiros, niña. Confio neles.

O fecho não corria. Ele assentou um joelho na tampa da mala, fez força.

– E eu tenho de confiar...

– Claro que sim, se sou eu que to estou a dizer.

– A tua arrogância irrita-me às vezes, sabes?

– Arrogante? Não sou arrogante.

– Então, passaste a sê-lo!

Levantou-se, carregando a mala fechada e inchada na mão esquerda. Rosnou-me:

– Não sou arrogante!

Inclinei-me para trás. Respirou fundo ao aperceber-se de que crescera para cima de mim. Abanou uma mão.

– Não quero discutir contigo quando me sinto tão feliz.

E quando acabaste de me comer!

Guardei a escova na mochila com gestos bruscos.

– O Signorini está lá fora. Vi-o no corredor... se me vê a sair do teu quarto...

– O profe? Estás a fazer essa cena toda por causa do profe? Deve ter-te visto a entrar no meu quarto e ele, mais do que qualquer outro, sabe que eu te... bem, o que nós fazemos. Não é de hoje, querida. Hum? Ora, aí tens... E não fui discreto quando te chamei, nem tu entraste aqui pela porta dos fundos. Toda a gente te viu, Cristina.

– Vim ver a taça! – justifiquei, irritada.

– E estiveste a ver a taça, porra! – zangou-se ele.

Aqueles Dias de MaravilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora