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No sábado à noite eu estava moída de cansaço, mas era um cansaço satisfatório, que me deixava feliz e deslumbrada, muito distraída e um pouco estúpida. Conseguira finalmente visitar as ruínas de Pompeia! O senhor Vignati não estava disponível para me levar até ao sítio arqueológico, que era como se chamava oficialmente, pediu muita desculpa, só que era um pedido de Maradona e o homem prometeu-me arranjar alguém de confiança que me servisse de motorista. Tentei recusar a generosa oferta, o senhor Vignati nem quis escutar os meus toscos argumentos e repetia constantemente que se tratava de Maradona, não se dizia que não a Maradona, se Maradona fazia questão que eu fosse a Pompeia, alguém iria levar-me a Pompeia e não havia mais discussão. Então, não discuti e esperei.

Com tanta complicação acabei por passar apenas duas horas na cidade romana. Foram suficientes para uma primeira visita, considerei-as como um aperitivo. Haveria outras ocasiões para regressar ali já que Nápoles tinha as portas escancaradas para mim e esforcei-me para que fossem horas especiais. Levei a minha mochila e o meu caderno, estacionei no fórum e fiquei a maior parte do tempo nesse lugar. Na última meia hora corri até à casa do fauno e detive-me maravilhada no átrio a céu aberto, no tanque ornado com a pequena estátua de bronze, a contemplar, numa sala mais adiante, a réplica do célebre mosaico de Alexandre, o Grande, imaginando entre suspiros e lágrimas o esplendor daquela antiga mansão nos seus tempos áureos.

Até à hora do almoço estive com Claudia e brinquei com a bebé Dalma. As mulheres andavam naquele corrupio histérico que me dava dor de cabeça. Convidaram-me várias vezes para ir com elas às compras, Diego tinha-lhes passado um cheque, estavam eufóricas por poderem ir gastar dinheiro. Recusei educadamente, justifiquei que iriam levar-me a Pompeia. A Kity quis saber o que era isso e expliquei-lhe, com a Dalma ao colo que parlava e roía um brinquedo de plástico por causa dos dentes. Disse-me que eu era uma rapariga muito inteligente. Demonstrou aquele interesse das minhas tias quando lhes contava sobre assuntos que me eram caros, um interesse genuíno, mas superficial, que para elas não acrescentava nada ao conhecimento que achavam fundamental para conduzir a sua vida. A Kity foi simpática e apreciei a sua atitude para comigo. Não a macei com detalhes, transmiti-lhe o meu entusiasmo e quis parecer-me que ela captou muito bem a minha vivacidade a contar sobre coisas antigas.

No fim desse dia, jantei na cozinha com as mulheres. A Kity voltou à carga e perguntou-me se eu tinha gostado das tais ruínas romanas, não tinha decorado o nome do lugar. Respondi-lhe que tinha adorado. Falei-lhe brevemente sobre a grande praça central onde as pessoas se juntavam para conviver. Estivera somente aí, porque o tempo foi curto para uma volta maior pela cidade que era quase tão grande quanto Nápoles, exagerei a comparação de propósito para a impressionar. Contei-lhe sobre os meus apontamentos, disse-lhe que escrevia e que um dia contava escrever um livro. Ela voltou a dizer que eu era muito inteligente. Tentou puxar Claudia para a conversa, mas ela não lhe deu a importância que achava que eu merecia e desistiu. Repetiu:

– És uma menina muito inteligente. És uma boa amiga para o pelusa.

– Ah... obrigada – agradeci timidamente.

Naquele tempo em que estivéramos fora, a casa foi toda arrumada e a sala voltou a ser um espaço ordenado e acolhedor. As mulheres reuniram-se em redor da televisão a comentar os mexericos habituais. Roupas, maquilhagem, os maridos e os namorados daquela e da outra, os filhos, as confusões de família. A pequena Dalma adormecera no colo da mãe e eu, inspirada pela sua pura tranquilidade, fixada no seu santo sossego, comecei a render-me ao cansaço e às dores nas pernas. No domingo teria o jogo do Napoli e queria estar em forma para pular com os golos de Diego. Desculpei-me que iria dormir, despediram-se de mim. A Maria perguntou-me se precisava de alguma coisa, disse que não. Fiz-lhes adeus com uma mão, com a outra escondi um bocejo.

Aqueles Dias de MaravilhaOnde histórias criam vida. Descubra agora