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Luna Oliveira

— Oi, precisamos conversar. — Entrei no quarto do Eduardo e o encontrei deitado na cama, certamente ainda se recuperando da ressaca do fim de semana, onde ele passou o dia inteiro fora de casa.

Antes eu dormia aqui com ele, mas depois que decidimos ser apenas amigos, eu passei a dormir junto com a Lana.

— O que foi? — Eduardo obrigou a se sentar na cama e me encarou com os olhos cerrados por conta da claridade que entrava pela porta aberta.

— Acho que seria legal a gente começar a pensar em morarmos separados. — Comecei o assunto, me aproximando lentamente de onde ele estava. — Deve ser muito confuso para a cabecinha da Alana, fora que as pessoas estão comentando sobre a nossa situação.

— E daí? — Eduardo franziu o cenho.

— E daí que não estamos mais juntos, Eduardo.

— Você quer que eu saia de casa? — Ele continuou dizendo, meio irritado. Neguei rapidamente com a cabeça.

— Não, é claro que não. Essa casa é sua, ela era da sua família, e eu jamais pediria para você sair. — Expliquei, e me sentei ao seu lado. — Estou falando porque vou começar a procurar um canto para mim e vou levar a Alana junto comigo.

— Tudo isso pra poder transar com outro? — Eduardo parecia indignado enquanto dizia aquilo. Mordi o lábio quando ele se afastou de mim e se levantou.

— O problema não é esse, Eduardo.

— Então qual é a porra do problema? — O seu tom de voz se elevou um pouco, no entanto ele ainda parecia calmo.

— Não estamos mais juntos, não faz o menor sentido ainda morarmos na mesma casa. — Falei como se fosse óbvio. — Talvez não seja agora, mas um dia você vai encontrar outra pessoa e querer ficar com ela, e vai ser difícil se eu estiver aqui, junto com você. E outra, está na hora de eu andar com as minhas próprias pernas.

— Não vem com essa, Luna, você sempre se virou sozinha, nunca precisou de mim para nada. — Ele cambaleou até a porta do banheiro, por onde sumiu e eu pude ouvir logo em seguida o barulho da água escorrendo.

— Isso não é verdade, você sabe disso. — Entrei no banheiro e encontrei suas roupas jogadas no chão, o vidro do box estava levemente embaçado por conta do vapor causado pelo chuveiro, mas ainda sim era possível visualizar o Eduardo do outro lado. — Enfim, preciso da sua ajuda para contar a Alana, não quero que ela sofra achando que não vai ter mais o pai presente na vida dela.

— Você quer que eu minta para minha filha, Luna? Você está sim querendo me tirar esse direito de ser presente.

— Para com isso, Eduardo. Chantagem emocional uma hora dessas? Depois de tudo, é sério? — Cruzei os braços, começando a me sentir nervosa. Ele depois que começou a encher a cara era tudo, menos presente na vida dela. Até o trabalho largou, vivia da herança que os pais deixaram depois que morreram. Não sei porque todo aquele alvoroço.

Pisquei os olhos repetidamente quando uma vozinha se fez presente.

— Mamãe, você está brigando com o papai? — Alana me encarou com seus olhinhos assustados. Aliviei minha expressão abrindo um sorriso doce e me abaixei para pegá-la no colo.

— Não, meu amor, papai e eu só estávamos conversando. — Beijei a sua bochecha e deixei o banheiro, seguindo com ela no meu colo até as escadas. — Que tal a gente descer e brincar um pouco no quintal? Faz tempo que não te vejo por lá.

— Aquele balanço já está velho. — Reclamou com um biquinho bonito no rosto.

Soltei uma gargalhada. Há alguns anos, Eduardo fez um balanço para ela no quintal com algumas peças enferrujadas que estavam sobrando na garagem.

Senti o sol morno de fim de tarde queimando a minha pele assim que saímos para o quintal. Alana saiu correndo para brincar no balanço enquanto eu me ajeitava em um banco.

A vizinhança era bem calma. Eram raríssimas as vezes que faziam bagunça por aqui, muito ao longe eu conseguia escutar uma música tocando alto. Hoje foi um desses dias.

— Mamãe, posso te fazer uma pergunta? — Alana perguntou em meio à diversão. Olhei em sua direção e ela continuava balançando em alta velocidade, os seus cachos dourados voavam contra e a favor do vento, chicoteando o seu rosto. — Jura que não vai ficar brava comigo? Mas você tem que me prometer! — Insistiu quando eu concordei com a cabeça.

— Sim, eu prometo que não vou ficar zangada. — Confirmei, rindo levemente.

— Por que você não ama mais o papai? — A voz de Alana saiu bem fina e baixa, só que daquela vez ela parou de balançar e ficou me encarando.

— O quê? Por que está falando isso? — Me remexi inquieta no banco.

— Eu ouvi a sua conversa com o papai. Você disse que vai embora. — O rosto dela ficou vermelho e seus lábios começaram a tremer, ameaçando o início de um possível choro.

— Lana... — Suspirei, pensando nas palavras que eu usaria. — O seu pai e eu vamos nos amar pra sempre, afinal temos você, mas as coisas mudam...

— Não entendo... — Balançou a cabeça.

— Nós nos amamos como amigos agora, e amigos não moram juntos.

— Eu queria que vocês ficassem juntos para sempre, como os pais da Lala. — Ela desabafou, deixando seus ombros caírem.

— Pode ser difícil de entender, filha... — Respirei fundo, buscando as palavras certas. — Mas o amor, por si só, nem sempre é suficiente para manter duas pessoas juntas. As pessoas mudam o tempo todo, e algumas conexões se desfazem durante esse caminho, mas isso não significa que o carinho e o cuidado acabem. Nem todas as histórias de amor são para sempre, Lana, e está tudo bem. Você é jovem demais para compreender isso agora, mas um dia entenderá que o amor também envolve deixar ir e permitir que cada um siga o seu próprio caminho.

Me levantei do banco e caminhei até onde ela estava, me agachando e apoiando minhas mãos em seus joelhos. Ela me encarou fixamente nos olhos e eu me obriguei a abrir um sorriso.

— O seu pai e eu vamos te amar, independente de qualquer coisa, inclusive se somos um casal ou não, entendeu? Sempre estaremos aqui por você, não importa o que aconteça. — Ela fez uma carinha tristonha, mas não deixou de concordar com a cabeça. Até que a sua mirada se prendeu em algum ponto acima do meu ombro.

— Quem é ele, mamãe? — Alana sussurrou baixinho com os olhos curiosos.

Me virei ainda com o peso do corpo nos calcanhares e fiquei sem ar quando o vi parado na frente da minha casa. Como a cerquinha era baixa e dava para ver perfeitamente o lado da rua, não foi muito difícil reconhecê-lo.

Como uma maldição, ele continuava da mesma forma, talvez com o rosto um pouco mais maduro e cheio de barba, mas ainda sim era ele aí. O personagem principal do meu passado e de todas as minhas lembranças sombrias.

— Entra pra casa, Alana, e não sai de lá. — Murmurei séria antes de me erguer do chão, e só pelo meu tom de voz a minha filha soube que eu não estava de brincadeira e correu em direção à porta da cozinha.

Os olhos frios dele acompanharam minha filha até que ela sumisse pela porta, e aquilo me causou um calafrio na espinha. O que aquele homem estava fazendo ali depois de tanto tempo?

 O que aquele homem estava fazendo ali depois de tanto tempo?

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Sombras da Dor [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora