𝟶𝟸𝟻

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Acordei cedo para acompanhar o Matheus em uma consulta médica. Infelizmente, a única parte ruim foi ter que dividir sua atenção com a Carina, que fazia questão de ignorar minha presença o tempo todo. No entanto, o menino parecia gostar o suficiente de mim para não se importar com os comentários maldosos e de duplo sentido dela.

Imagina a confusão que seria para uma criança de oito anos descobrir de repente que viveu uma mentira a vida inteira, que a mãe que ele tanto adorava, na verdade não era a sua mãe.

Era só por isso que eu ainda me mantinha na minha e de boca fechada, engolindo a seco o desaforo daquela mulher chamando o Matheus de filho.

Aproveitei a minha ida ao hospital particular e fiz um novo teste de sangue, que, claro, ficou tudo por conta do Russo. Depois da consulta, fiquei de receber o resultado no mesmo dia por e-mail e fui direto para o trabalho.

Ainda tinha medo de me expor tanto depois da ameaça do Mandela, mas com o passar do tempo percebi que Russo tinha colocado um garoto para me seguir fora do morro. Uma vez, até cheguei a questionar as intenções do menino, que me respondeu em poucas palavras que estava apenas fazendo o seu trabalho.

Foi mais um dia agitado no trabalho, principalmente porque minha chefe resolveu lançar uma coleção nova para o verão desse ano. A loja meio que estava fazendo um sucessinho dentro do shopping, mesmo os materiais das roupas sendo de confecção duvidosa.

Saí quase meia hora mais tarde do shopping e estava super atrasada para pegar a Alana na escola. Então, na metade do caminho, enquanto pegava meu ônibus, decidi ligar para a minha irmã e pedir para ela buscá-la no meu lugar.

A todo momento eu atualizava a caixa de entrada do meu e-mail, esperando pela clínica, mas parecia que a resposta não chegaria nunca.

Se eu estivesse realmente grávida, seria uma responsabilidade a mais que eu teria, além do Matheus e Alana. Mas eu não senti nada de diferente nessas semanas, nenhum enjoo, desejo...

Cheguei no morro e o dia começava a se preparar para o fim. O movimento na rua estava grande por conta de um campeonato de futebol que o Russo estava patrocinando na favela.

Achei bacana a iniciativa dele, pois acabava ocupando o tempo que muitos jovens usavam para fazer besteiras. No entanto, também acontecia muita confusão entre eles. Ô pessoal para ser competitivo; a cada esquina era uma briga diferente.

Até escutei o Matheus comentando no hospital que queria muito participar junto com os amigos, mas praticar esportes ou até mesmo atividades físicas estavam descartadas no momento pelo médico.

Já estava perto de casa quando vi de longe a Gabriela parada em um beco, parecendo estar no mundo da lua.

— Saudades da minha bandinha morta. — Dizia enquanto suspirava triste. Eu segurei a risada enquanto me aproximava dela. — Por que, One Direction? Por que vocês acabaram com a minha vida?

— Ainda nisso, Gabi? Supera! — Falei de repente, fazendo com que ela pulasse de susto e me olhasse como se eu fosse uma assombração.

— Você é tão malvada, Lua. Às vezes acho que quem matou a Bruna foi você. — Ela falou divertida, me fazendo resetar completamente. — Ei, tudo bem? Ficou pálida do nada. — Gabriela segurou o meu rosto. — Foi só uma brincadeirinha idiota, me desculpa.

Olhei atentamente para a Gabriela e ela tinha uma expressão arrependida na face, me fazendo sentir ainda mais culpada por nunca ter lhe contado a verdade sobre a morte da Bruna. No fundo, eu sempre tive muito medo que ela me enxergasse de outra forma a partir do momento que soubesse de tudo daquela noite.

— Tem algo que eu fiz e nunca contei para ninguém. — Murmurei baixinho. Gabi me olhou curiosa, apoiando-se na parede e cruzando os braços.

— O quê? — Perguntou, mas eu permaneci calada, pensando nos prós e contras de ela saber a verdade. — Fala logo, Lua, está me dando medo.

Sombras da Dor [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora