Almoçamos rapidamente, e Alana foi a primeira a terminar, comendo por último as batatinhas fritas no prato. Ela encarava Russo quase sem piscar, com desconfiança, morrendo de medo. A sua cabecinha devia estar uma bagunça, falei barbaridades sobre ele para a minha menina, e agora estávamos na presença dele.
— Qual é de você está me encarando desse jeito aí, pô? — Russo perguntou a ela, balançando a cabeça.
— De que jeito? — Alana retrucou num sussurro.
Eu, por outro lado, fuzilei Russo com um olhar, exigindo silenciosamente que ele deixasse minha filha em paz.
— Desse jeito aí esquisito... coé, passa a visão.
— Eu não gosto de você. — Ela deu de ombros, fazendo com que Russo a encarasse intrigado. — Você é um homem muito mal.
— Ih, qual foi? Me julgando antes de saber dos proceder? Fica na sua, não quero nada contigo. — Revirou os olhos.
— E com a minha mamãe? — Alana ergueu a sobrancelha. Era só um pitoquinho de gente, mas ficava valente quando o assunto era me defender.
— Papo de visão, se liga. Não quero nada com tua mãe, a única coisa que eu preciso, ela está ligada no que é.
Alana franziu o cenho, parecendo não entender muito bem o que ele queria dizer, mas no final desistiu e apenas balançou a cabeça.
— Então tá bom.
O assunto encerrou ali. Não demorou muito, e estávamos na estrada novamente; desta vez, Alana conseguiu se manter acordada e foi conversando bobagens comigo durante toda a viagem.
Um frio na barriga me apossou à medida que nos aproximávamos cada vez mais da Cidade de Deus. Inclusive, eu até reconhecia alguns lugares.
Já era o finalzinho da tarde quando parei o carro na frente da contenção, pois os vapores barraram minha subida, mesmo eu piscando os faróis. Russo desceu logo atrás de mim e se aproximou dos campanas, conversando por alguns minutos, e no final se aproximou de mim.
— Deixa o carro aí e me segue. — Ele disse simplesmente.
— Mas... — Ia rebater que nossas malas estavam no carro, porém ele não me deixou terminar e saiu caminhando de volta para o seu carro.
— Mamãe, que lugar é esse? — Alana perguntou assustada, olhando para os moleques armados com fuzil ao lado do carro.
— Depois a gente conversa. — Falei enquanto tirava o meu cinto e descia do carro. Como explicar para uma criança de quatro anos de idade o que era o tráfico de drogas?
Ajudei Alana a sair do carro e só me preocupei em pegar a sua mochilinha no banco de trás. Alguns dos vapores que estavam ali ficaram me encarando sem disfarçar, não sei se chegaram a me reconhecer, provavelmente não, afinal eu tinha dezenove anos quando pisei aqui pela última vez, mas eu sinceramente esperava que não. Afinal, eu fugi dali como traidora.
Meu corpo estava tenso quando finalmente alcancei o carro de Russo e me sentei atrás com Alana.
— Quando vou ver o Gabriel? — Perguntei ansiosa. Russo me encarou pelo retrovisor interno e deu partida no motor.
— Ele não está aqui. — Respondeu. Notando o meu olhar curioso, ele explicou. — Está no hospital.
Franzi o cenho. Queria lhe perguntar se ele estava sozinho lá, mas a expressão de Russo não me dava abertura para isso.
— Quem é Gabriel, mamãe? — Alana me encarou.
— Uma pessoa muito importante para a gente. Não se preocupe, em breve você vai conhecê-lo. — Sorri. Nunca contei a ela que tinha um irmão, não havia esperanças de que Russo deixasse eu vê-lo novamente um dia.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Sombras da Dor [M]
Fanfic+18| Em um passado marcado por mágoas e escolhas equivocadas, Luna e Russo viveram um romance turbulento que parecia destinado ao fracasso. Agora, o destino conspira para que eles se reencontrem, trazendo à tona antigas feridas e sentimentos mal res...