capítulo 36

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Pricila havia pegado, naquele dia, o carro
emprestado de Allan para levar Carol até
sua casa antes de ir para o hospital. O frio
já não castigava tanto, afinal estavam quase na primavera, porém ainda se agasalhavam bem. Ela já tinha o dinheiro para comprar seu próprio carro, porém o deixava no banco, rendendo juros enquanto não via que era algo de extrema importância.

Havia ido viver em uma república anos atrás justamente para economizar dinheiro, afinal seu pai lhe mandava dinheiro para a despesa de uma casa grande somente para ela, então conseguia juntar bastante por mês.

- Você fica muito bonita dirigindo. - Carol
elogiou, reparando no semblante sério e
concentrado de sua namorada.

- Obrigada. - Pricila disse, entrelaçando
seus dedos nos de Carol. Ela andava com
cuidado, em uma velocidade lenta, afinal
Carol já havia sofrido um acidente de carro,
não precisava de outro.

- Sei que é seu aniversário, Prica, mas eu
posso te pedir algo? - Carol perguntou,
vendo o carro ser estacionado em frente à sua casa.

- O que quiser, amor. - Pricila disse, se virando para olhá-la. Carol desprendeu seu cinto e mordeu o lábio inferior.

- Me ensina a dirigir? - Pediu empolgada, reparando a surpresa invadir o rosto de sua namorada.

- Acho que ainda é muito ce..

- De novo isso. - Carol expressou bufando,
aparentando estar chateada.

- Isso o que, Carol?

- Nada. - Disse, soltando o ar de seus pulmões. - Nos falamos mais tarde.

- Não faça isso, amor. - Pricila disse rindo. - Sabe que odeio ficar curiosa.

- É que você pode se chatear. - Carol disse,
olhando para suas mãos.

- Me dirá depois? - Pricila perguntou e Carol assentiu.

- Olha, é a senhora Wilson. - Carol disse
animada, olhando pelo retrovisor a vizinha
da frente varrer sua calçada. - Vou lá dar um oi para ela.

- Eu te acompanho. - Pricila disse, soltando o cinto.

- Não. Você está na sua hora.

- Mas pode vir algum carro e...

- Pricila, quando você vai parar com isso? -
Carol questionou irritada.

- Para com o quê? - Pricila indagou confusa.

- Com isso de me prender. - Explicou. - Eu sei que você me ama e sei que faz pelo meu bem, mas o médico, a psicóloga, a psiquiatra e todo o resto do mundo, inclusiva a minha mãe, me indicou fazer coisas de pessoas da minha idade.

- Eu só queria te fazer companhia. - Disse,
vendo Carol arquear uma sobrancelha. -
Tudo bem, é só... que você está progredindo
muito rápido. Não sei até onde eu posso te
deixar...

- Você não é minha mãe para me deixar
fazer algo ou não. - Carol disse irritada e
Pricila se espantou. Ela jamais havia visto sua namorada explodir daquele jeito. - Eu sei que é seu aniversário e eu não quero que seu dia seja ruim, então nos falamos mais tarde.

- Espere.. - Pricila pediu, segurando
suavemente o pulso de Carol quando
viu que a garota iria abrir a porta. - Você
está mesmo chateada comigo por querer
te proteger? - Carol suspirou e demorou
alguns segundos antes de lhe fitar.

- Você não me deixa nem atravessar a
rua sozinha, como se eu fosse estúpida o
suficiente para não olhar para os dois lados.
- Carol disse. - Sobre termos relações,
eu entendo, Pri, você ainda não acha que
esteja preparada, apesar de eu claramente
demonstrar que sim. - Continuou. - Você não me deixa fazer nada das pessoas da minha idade ou não deixa seus amigos falarem de determinados assuntos quando estou presente, mas eu andei pensando muito nisso.

- Andou?

- Sim, andei. - Carol disse. - Tenho certeza de que minha mãe poderia ter dito: "Não quero você perto da minha filha, ela ainda tem a mente de uma criança." Mas ela não disse, Sabe por quê?

- Porque ela confia em mim? - Pricila
perguntou confusa.

- Também, mas sobretudo, porque ela confia em mim. - Carol disse, se inclinando e dando um selinho em Pricila antes de abrir a porta. - Eu preciso crescer, Pricila, e juro que estou tentando. Todos estão tentando me ajudar nisso, mas a pessoa mais importante para mim, além da minha mãe, não está colaborando muito. - Falou seriamente. - Bom serviço. - Carol disse solenemente antes de fechar a porta e Pricila sentiu o desejo de sair do carro e ir concertar as coisas, porém estava em sua hora, por isso ligou o carro.

[...]

-Já estou aqui. O que tinha para falar comigo? - Ela perguntou a Gabriel, sem aparente humor.

- É sobre sua falta de um tempo atrás,
alegando que sua namorada estava doente.
- Ele disse seriamente e Pricila bufou, ela
não estava em um bom humor, havia sido
superprotetora com Carol sem sequer perceber e, o por de tudo, não havia reparado que isso magoava sua namorada. Que péssima namorada ela era, pensava.

- Não sou obrigada a ter cem por cento de
presença. - Pricila disse secamente e o homem sorriu, fazendo Pricila franzir o cenho em completa confusão.

- Sabe por que impliquei tanto com você? - Ele perguntou e Pricila negou. - Porque eu me via em você: Sempre dedicada, sem vida social, fazia horas extras, tirava as melhores notas.

- E por que isso é um problema? - Pricila
perguntou com rispidez.

- Porque eu perdi minha mulher e só fui
descobrir nove horas depois, porque não quis atender o telefone, afinal eu estava estudando no meu horário de almoço. - Ele disse com amargura. - Ela estava viva e eu poderia ter dado um último adeus, mas coloquei o trabalho acima de tudo. - Pricila o fitou surpresa.

- Está dizendo que... só porque com você foi
assim, comigo seria igual? Que me tratou
igual a um nada por rancor de você mesmo? - Ela perguntou incrédula, vendo ele assentir.

- Mas quando me ligou algumas semanas
atrás e mencionou e faltaría por sua
namorada.. - Ele disse. - Vi que era diferente. Eu gostaria de me desculpar com você.

- Uau. - Pricila  disse, sentindo raiva e ao mesmo tempo dó. - Está tentando se redimir mesmo.

- Estou. - Ele disse, entregando uma folha
enrolada com um laço vermelho. Pricila pegou com um certo receio, mas quando abriu não pôde crer no que lia.

- Eu não acredito. - Pricila disse boquiaberta, sorrindo logo em seguida.

- Te fiz trabalhar quase o dobro, você está
mais do que apta. - Ele disse sorrindo. Era
uma das poucas vezes que Pricila o havia visto sorrir. - Desde aquela ligação eu conversei com todos da universidade e do hospital, você se formaria em julho, uhm? - Pricila assentiu. - Bem, adiantei seu processo, parabéns, você é oficialmente uma fisioterapeuta. Pricila nem sabia dizer quando que lágrimas haviam começado a descer de seus olhos, mas as podia sentir.

- Você pode ir na formatura em julho, junto
com os seus colegas, se quiser. - Ele disse. - E
bem-vinda à equipe do hospital. A partir de
hoje você é assalariada. Muito.. Obrigada. - Ela disse, vendo seu certificado com os olhos brilhando. - Eu consegui isso semana passada, mas vi na sua ficha que hoje era seu aniversário, então esperei. - Ele disse suspirando.- Feliz aniversário. - Disse em um sorriso. - Era só isso. Ao trabalho, Caliari.

- Gabriel... - Pricila o chamou assim que ele
virou as costas. - Você não poderia prever que sua esposa morreria. Você não tem culpa. - Ele assentiu e a olhou desconcertado.

- Obrigada, Pricila, você realmente tem
um bom coração. - Ele disse. - Um dia talvez
eu acredite nisso que você disse. - Ele disse
sorrindo tristemente, se virando e saindo dali.

Pricila naquele momento era um turbilhão
de sensações. Se sentia mal por ele, feliz
demais por ela, com raiva de si mesma por
ter magoado Carol e finalmente, arrasada
por querer compartilhar algo tão grande com alguém que provavelmente não a queria ver naquele momento.
















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Por hoje é só galerinha, boa noite pra vcs e até amanhã...🤪

Em um piscar de olhos - CapriOnde histórias criam vida. Descubra agora