Desfazer a mala

2.4K 161 1
                                    

ALESSA


O dia seguinte chegou e eu me levantei bem cedinho, não queria passar mais um dia inteiro jogada na cama.

Peguei uma muda de roupas dentro da mala e fui ao banheiro. 

Ontem a noite quando pedi para tomar banho, o dono da casa me deu uma toalha e sabonete novos, me explicou como usar o chuveiro e disse que a porta não trancava, então, era pra eu manter a luz acesa enquanto estivesse ali, pois refletia por debaixo da porta e ele saberia quando não entrar.

Encostei a porta e acendi a luz, me olhei no espelho e suspirei, minha cara estava pra lá de péssima. Na verdade eu nem sabia a última vez que não estive assim.


Tirei minha roupa e liguei o chuveiro, me afastei da água gelada rapidamente e esperei que esquentasse para eu voltar. Analisei melhor o banheiro, ontem a noite estava mega cansada, não vi nada a não ser o chuveiro.
O local era simples, mas bem cuidado como o restante da casa. Paredes azulejadas até o teto, uma cortina plástica separava a área do chuveiro do restante do banheiro, isso também evitava que o lugar se molhasse inteiro. Um espelho não muito grande se encontrava no armário de escova e sendo ligeiramente curiosa, lá dentro além da escova de Connor, vi alguns remédios para dormir e outros para dor.


Quando a água finalmente esquentou, pareceu o paraíso, a temperatura estava muito boa, fechei os olhos sentindo a água cair e permaneci ali por tempo suficiente para tomar um bom banho.

Me vesti e deixei tudo limpo, apaguei a luz e sai de vez, trouxe comigo a roupa suja, coloquei numa sacola e depois na mala. Eu não tinha desfeito nada e nem pretendia, acho que a tal investigação não duraria muito tempo, então pra evitar ocupar a casa daquele homem, preferi manter tudo ali.

Não muito tempo depois ouvi o chuveiro e em logo barulhos na cozinha.
Um cheiro maravilhoso entrou pelo quarto e eu desejei comer oque quer estivesse sendo preparado. Como um gatilho disparado, as imagens de Brandon reclamando do meu peso vieram a mente e eu me contive.


A demora foi bastante curta até ouvir batidas na porta do quarto, eu não poderia fingir que dormia, ele com toda a certeza me ouviu no chuveiro.

Abri a porta vendo Connor já com seu chapéu, aquilo dava uma aparência ainda mais bruta ao homem.


— Bom dia — Ele soltou com a voz rouca.


— Bom dia —


— O café tá pronto —


— Não estou com fome, muito obrigado — Sorri gentil.


— É sério ? — Arqueou as sobrancelhas.


— Sim...—


— Olha, para de graça e vem comer — Saiu tranquilamente me deixando ali com cara de otaria.
Olhei o quarto me lembrando de onde estava e sai atrás do homem.

Na cozinha ele colocou uma garrafa pequena na mesa junto com duas xícaras.

— Gosta de café ? — Assenti. — Então essa garrafa fica pra casa —


Apontei uma outra garrafa grande na cor preta.


— Essa não ? — Ele negou. — Porque ? —


— Essa eu levo pra tomar com os peões —


— Entendi — Disse simples e ele me deu um prato.


— A Joselin vem novamente fazer o almoço, não se assuste ela tem passagem livre por aqui —


— Novamente ? — Assentiu.


— A...esqueci, você não a viu ontem, mas ela sempre vem fazer o almoço pros peões quando eu estou com muito trabalho na fazenda —


— Eles almoçam aqui ? —


— Sim, só não vieram ontem porque eu pedi pra darem um tempo, você precisava conhecer melhor a casa e tinha acabado de chegar. Mas se disser que não está preparada pra ver mais pessoas eu não os trago —


— Tudo bem...a casa é sua —


— Mas quem está sendo protegida é você —


— Tudo bem, eu preciso conhecer pessoas novas — Sorri e me aproximei do fogão, vi dois lindos omeletes com bacon. Quando peguei o menor, vi fios de queijo derretidos se esticaram e senti água na boca.
Peguei também torradas de um prato ao lado da panela.


Me sentei e coloquei café na xícara, Connor fez o mesmo e assim como ontem no almoço e no jantar, tudo estava silencioso.

Ao terminarmos, me levantei e fui lavar a louça, ele se levantou e colocou seu prato e xícara por perto para serem lavados.


— Gosta de ficar descalça ? — O olhei não entendendo e ele repetiu. — Você gosta de ficar sem chinelos ? Porque aqui, eu não recomendo —


— Não é isso...—


— Então oque é ? O saltos estão machucando ? — Perguntou com o mesmo sarcasmo de ontem.


— Não colocaram chinelos na minha mala e não vi nenhum shopping ou supermercado ao lado da casa —


— Achei que seus saltos seriam suficientes pro tempo que vai passar aqui —


Terminei a louça e me virei.


— Não são, eu não passo vinte e quatro horas de salto. Porque eles te incomodam ? E como assim tempo que vou passar aqui ? —


— Me pareceu que sim, isso é uma fazenda, você chega aqui com saltos daquele tamanho ?.
Sim, tempo, acha que eles vão te levar semana que vem ? Pela minha experiência com pessoas no programa de proteção, quem vem pra esse fim de mundo não é por qualquer coisa, já passaram mais de um ano e meio aqui —


— Como disse antes, eles não me disseram pra onde eu viria. E eu estava num jantar formal, até me levaram pra trocar de roupa, mas não me deram um par de chinelos ou botas como a suas —
Tentei ignorar a informação do tempo.


— Vou resolver isso... — Me olhou uma última vez. — É melhor desfazer aquela mala — Riu pegando a grande garrafa de café e saiu.

Eu até quis falar algo, mas não sabia oque, então, fiquei em silêncio, era melhor, não podia fazer besteiras, eu mal conhecia o lugar, e se ele resolvesse jogar tudo pro ar e me largar no meio do nada ?.

Voltei pro quarto e coloquei a mala na cama, a analisei bem, eu tinha mais coisas, não era só aquilo.

Eu tinha muitos sapatos, roupas para dar e vender, até joias, perfumes e bolsas incontáveis. Tudo aquilo, era presente do Brandon, um tapa, um maço de rosas, um soco, uma joia, uma surra completa, um banho de loja. Até carros eu já havia ganhado na tentativa dele se desculpar e me comprar. Mas eu nunca fiz questão daquilo, eu preferia não ter nada e a paz ser presente em minha vida, do que ter tudo aquilo e ser uma infeliz sem amor.


Tirei minhas poucas roupas de lá e dobrei, fiquei extremamente surpresa ao ver meu vestido vermelho bem dobrado e até meio escondido. Balancei a cabeça tentando adivinhar quem seria o bendito infiltrado, bom, não adiantou nada, o vestido acabaria no lixo, eu não tenho corpo pra usá-lo.

Coloquei as coisas no guarda-roupas e o fechei de vez, pensar mais faria minha cabeça explodir.


Fiquei na cama até ouvir um barulho na cozinha, me levantei e fui ver.

De costas para mim, uma silhueta feminina se mexia calmamente enquanto fazia algo que eu não podia ver.


— Bom dia...— A mulher se virou e eu sorri. Era uma senhora, aparentava seus cinquenta e poucos anos, muito bonita e conservada por sinal.


— Bom diaa ! — Se aproximou e me abraçou. — Como você está ? O Connor me disse que seu nome é Alessa, não é ? —


— Não...Sim ! É Alessa. E eu estou bem, como vai a senhora ? — Me soltou. — Joselin ? —


— Sim, isso ai, Joselin, mas pode chamar de Jos, ou Jose. Eu vou muito bem, vim fazer a comida para os meninos —


— É, ele me avisou. Disse para não me assustar — Voltou ela para a pia.


— Se assustar ? Comigo ? Era mais fácil se assustar com ele, aquele brucutu — Riu e acabou me fazendo ir na onda.


— Você poderia pegar o cutelo, por favor ? Está no outro faqueiro perto da geladeira. Essa faca é pequena demais —


Fiz oque ela pediu e me aproximei para ajudar.

InevitávelOnde histórias criam vida. Descubra agora