Capítulo XXII: Entre éter e sangue

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Sébastien

No primeiro dia, tudo era dor e sangue. Na primeira semana tudo era sofrimento e brasa. No primeiro mês tudo era caos e chamas e em nenhum lugar havia escapatória. E cinco meses depois, quase no final de abril, tudo era morte num interminável ciclo martelando sobre o peito de Sébastien, gritando em sua mente e despedaçando seu corpo.

As barreiras telepáticas ajudavam, mas a cada dia impediam menos, e cada vez que precisavam ser refeitas Sébastien se preocupava com os riscos que a proximidade com o seu poder podia causar ao seu círculo.

Sam já havia sido tentado a usar aquele conhecimento uma vez, quem poderia ser o próximo? Não importasse o quanto ele repetisse, Sébastien não conseguia tirar de si a culpa de ter causado parte daquele colapso. Era esse poder maldito agindo dentro dele e tentando escapar e haveria um momento que ele iria. Sébastien precisava se certificar de que isso não iria acontecer. Pelo menos aguentar o suficiente até aquela guerra terminar.

Seus joelhos tocaram o chão devagar, pois cada junta de seu corpo doía e rangia por dentro. O suor da pele pingava sobre o assoalho, e ele sentia a febre queimar na pele, mas estava tentando controlar os sintomas com ervas medicinais da estufa da diretora para evitar alertar seus membros de círculos do que estava acontecendo. Seus sonhos não eram mais seguros e manter os olhos acordados era tão perigoso quanto. Pois cada pequena informação que ele via nas paredes, em sua pele ou no ar se fixava lentamente em sua mente, como pequenas peças de um quebra cabeça, que eventualmente iria estar completo. Informações que ele sabia que o círculo iria reter de uma maneira ou de outra e para Sébastien era seu dever impedir isso de acontecer.

Em suas mãos havia um amontoado de papéis antigos. Feitos de um maneira rústica, mas cuidadosamente preservada pelo tempo. O rapaz de olhos azuis sabia que não eram seus para usar. Na verdade, ele nunca tinha roubado nada na vida até aquele momento. Mas seu poder, aquele que era natural dentro de si, a fonte de todo usuário de espírito, havia reagido a esses papéis enquanto Sébastien procurava por Sam na mansão das rainhas feéricas.

Lá ele havia descoberto uma enorme biblioteca contendo diversos segredos que ele não tinha tido coragem de olhar. Mas o equinócio de primavera aumentava seu poder. O tornava mais sensível. A proximidade entre ele e os papéis havia gerado uma atração mútua e tentadora, mesmo que ele não soubesse para que.

As portas para biblioteca estavam trancadas com magia feérica mais poderosa do que Sébastien jamais tinha visto, mas nada realmente estava trancado para o Rei de Sangue. Mas essa era parte do roubo que ele queria ainda mais ignorar. A energia que tinha vazado pela ponta dos dedos e permitido sua entrada. A primeira vez em semanas que seu corpo tinha experimentado calma e tranquilidade. A força sacrificial se alimentando dele mesmo, correndo em seu fluxo natural, se libertando de sua jaula momentaneamente.

Os papéis em questão contavam com um poderoso feitiço. Algo que Sébastien nunca tinha praticado. Não era magia proibida, é claro. Mas era tão perigoso e inconsequente quanto. Mas a culpa era algo que soterrava razão e movia tempestades. E Sébastien se encontrava no olho do furacão, o encarando com raiva e medo, querendo com todas as forças dissipar os ventos que ameaçavam o bem estar de tudo e todos que amava e não só isso. Havia mais em jogo. Ele não era só perigoso para o círculo ou para Talya. Seu poder era perigoso para o mundo todo e ele se recusava a ser uma ameaça como as forças que tentava impedir de destruir Nova Salém.

Esse feitiço não requeria ingredientes difíceis, condições da lua, do sol ou de qualquer astro. Ele só precisava de força, poder e desespero para ser lançado e Sébastien tinha todos. Menos a real natureza necessária para lança-lo, mas ele tinha algo mais, a capacidade de pegar emprestado esse poder momentaneamente.

Bruxos&Demônios, vol. IV - Perda&TormentaOnde histórias criam vida. Descubra agora