O coração de Alexandra batia com força, sua respiração saindo com dificuldade. Deveria afastar Marcos, sair correndo dali, mas seus pés pareciam estar cravados no chão. A voz dele penetrava em seus ouvidos provocando sensações que ela julgava mortas há anos.
No passado, apenas com muito custo conseguia resistir às investidas sensuais de Marcos. Era muito sensível à voz dele, ao cheiro, aos toques... O desejo de casar-se virgem fizera com que somente fizesse amor com Marcos pouco antes de se separarem. Mas escondera aquela lembrança no mais profundo de sua mente.
Agora estava ali sentindo-se absurdamente fragilizada diante daquele homem, as recordações surgindo num turbilhão em sua cabeça. Ele estava tão perto, tão perto... Sentiu suas narinas tremerem quando sentiu o cheiro dele.
Marcos inclinou a cabeça e ela sabia que seria beijada. Um calor no baixo ventre mostrou que seu corpo se lembrava muito bem do dele. Fechou os olhos quando o rosto se inclinou para o dela. Sua pele queimava.
O rosto de Rodrigo, entretanto surgiu em sua mente e abriu os olhos, abalada. O que estava fazendo? Recuou um passo e Marcos a segurou.
— Não, Marcos.
— Por quê?
— Rodrigo...
Ele fechou o semblante. Alexandra deu outro passo para trás e Marcos a deixou se afastar.
— Entendo.
Ela balançou a cabeça, confusa.
— Tenho que ir.
Ele estendeu a mão para ela, mas Alexandra não permitiu que a tocasse.
— Encontre comigo hoje à noite.
— Não.
— Por favor.
Ela franziu a testa, detestando que ele se sentisse seguro para fazer o convite.
— Não sou uma traidora, Marcos.
Ele piscou rapidamente.
— Não estou dizendo que você é.
— Mas está me tratando como se fosse.
Marcos respirou fundo.
— Apenas um minuto atrás... você quis me beijar. – Alexandra sentiu o rosto queimar, sabendo muito bem que ele estava certo.— Ainda há algo entre nós.
Como ela poderia refutar aquilo se quase deixara que ele a beijasse?
Sons chegaram até eles e Alexandra olhou para trás, vendo pessoas chegando para o horário das visitas. Tornou a olhá-lo.
— Tenho que ir. – disse mais uma vez.
— Vamos nos encontrar.
— Não.
— Apenas para conversar.
— Já conversamos, Marcos.
— Mas temos pendências.
Alexandra suspirou, cansada da emoção que a tomava.
— Olha, Marcos, o que quase aconteceu... Foi um engano.
— Engano? Nós...
— Alexandra?
A voz a fez olhar para trás. Sua tia estava parada, olhando-os, com o rosto espantado.
— Oi, tia.
Leandra olhava de um para o outro e ofegava.
— Está na hora da visita.
— É... Eu já vou. – explicou, porém a tia não saiu do lugar. Enviava um olhar maligno para Marcos.
Alexandra tornou a olhar para ele.
— Adeus, Marcos.
— Alexandra... – ele começou, mas ela ergueu a mão.
— Já conversamos tudo o que precisávamos.
Marcos apertou os lábios e não replicou. Ela respirou fundo.
— Adeus.
Deu as costas a ele e foi até a tia. Leandra segurou seu braço.
— O que significa isso, Alexandra?– sussurrou. — Você com aquele rapaz?
— Estávamos conversando. – caminhou para fora do jardim.
— Você não deveria ter feito isso. – a tia a seguiu. — O que os outros vão pensar?
Alexandra estalou a língua.
— Não estou preocupada com o pensamento dos outros.
— Mas deveria. Todo mundo sabe o que esse rapaz te fez!
Alexandra inspirou, impaciente.
— Tia, isso já tem muito tempo. Vamos esquecer, tá?
Chegaram à portaria do prédio.
— Ele esqueceu? Parecia muito interessado.
Alexandra não fez comentários e foi até a recepção. Sentia-se abalada, mas não diria aquilo à tia. Precisava aquietar a confusão em sua mente.
Deixou a tia visitar a avó primeiro, satisfeita em se sentar e pensar. Que loucura fora aquela que quase acontecera? Apertou as mãos ao lembrar do toque dele em sua pele. Ficara excitada apenas com a proximidade de Marcos!
Esforçou-se para pensar em Rodrigo. Estavam juntos há mais de um ano e seu relacionamento era maravilhoso. Conversavam muito, ele era carinhoso e compreendia sua necessidade de espaço; Rodrigo a deixava ser quem era, sem forçar sua presença. Ele a satisfazia emocional e fisicamente. Eram um casal equilibrado e companheiro.
Pensou em como era com Marcos. Ele não lhe dava espaço. Estavam sempre juntos e sentiam a necessidade de partilharem tudo. Marcos era a primeira pessoa em que pensava de manhã e a última em que pensava à noite. Na época, não conseguia se imaginar vivendo sem ele.
Num impulso pegou o telefone celular e ligou para Rodrigo. O telefone tocou algumas vezes antes dele atender.
— Oi, amor. – ele cumprimentou com a voz rouca que ela amava. — Está tudo bem? E a sua avó?
— Ela está estável. Eu só quis ouvir a sua voz.
— Ah, linda. Estranhei você ligar agora.
Alexandra mordeu o lábio inferior, sentindo-se culpada.
— E você, está tudo bem?
— Estou cheio de trabalho.
— Ah, desculpe te atrapalhar.
— Tudo bem
— Rodrigo, você tem certeza de que não poderá vir amanhã?
— Tenho amor. Queria muito estar aí seu lado, mas esse final de semana preciso estudar o caso em que estou trabalhando.
— Sei.
Ela ouviu vozes do outro lado do fone.
— Mas ficarei aqui torcendo pela sua avó.
— É só que...
Ela ouviu alguém falando com ele. Esperou um instante.
— Alexandra, amor, eu preciso ir. Te ligarei à noite.
— Tudo bem.
— Eu te amo. Estou sentindo muito a sua falta.
— Eu também. É que... – ela se interrompeu quando Rodrigo falou com alguém do outro lado. Esperou um pouco e decidiu desligar. — Amor, vou deixar você trabalhar.
— Está bem. Se cuida. Te amo.
— Também te amo.
Ele encerrou logo a ligação e Alexandra guardou o aparelho, chateada. Não costumava parecer tão ansiosa quando falava com Rodrigo.
Culpa do Marcos! – pensou.
Chegou à conclusão que tinha razão em ficar longe de Bastos. Marcos não era razoável. Como ele podia dizer que ainda a amava?
Remexeu-se na poltrona, incomodada com o rumo dos últimos acontecimentos.
Fernanda apareceu e ficaram conversando. Depois de um tempo a tia desceu, feliz, porque a mãe estava lúcida.
Alexandra subiu, animada. Entrou na enfermaria da UTI e, de fato, viu a avó apoiada no leito, quase sentada.
— Vó! – a idosa senhora sorriu e Alexandra a abraçou com cuidado. — Que bom te ver!
Lídice não correspondeu ao abraço, porém beijou o rosto da neta.
— Achou que eu iria dormir para sempre igual à Bela Adormecida?– brincou, com a voz muito fraca.
Alexandra sorriu.
— Eu arrumaria um príncipe encantado para vir te acordar.
— Para ele me ver sem dentadura? Nem pensar.
— O príncipe não se importaria.
— Não vou arriscar.
Ela acariciou o rosto da avó.
— Você parece bem melhor.
A avó cobriu a mão dela com a sua.
— Não queria preocupar ninguém. – deu um sorrisinho. — Leandra estava aqui toda sentimental.
— Com razão, vó.
A mão de Lídice tremeu e Alexandra observou a pele fina e enrugada. Parecia tão frágil!
— Você está bem?– a avó perguntou.
— Eu é que tenho que te perguntar.
— Você estava com o Marcos. – declarou, de repente.
Alexandra sentiu o rosto esquentar.
— Tia Leandra contou.
— Contou. – a avó fechou os olhos. —Vocês conversaram?
— Conversamos.
Lídice abriu os olhos vagarosamente.
— Foi difícil?
— Isso tudo ficou no passado, vó.
— Ficou?
— Ficou. – Alexandra respondeu, incomodada com o olhar arguto da avó.
— Antes de passar mal... eu queria conversar com você...
A voz da avó soou trêmula e Alexandra acariciou sua mão.
- Vó, a senhora está ficando cansada.
A avó apertou sua mão.
— Seu noivado...
— O que tem?
— Você tem certeza?
Alexandra se sobressaltou. Que assunto era aquele?
— Tenho, claro.
A avó inspirou profundamente.
— E o Marcos?
— O que tem o Marcos?
A idosa fechou novamente os olhos. Quando os abriu, mostrava cansaço.
—Já passou muito tempo, querida...
Preocupada, Alexandra acariciou o rosto abatido.
— Vó, a senhora está cansada. Depois a gente conversa.
— Quero conversar agora... – deu-lhe novamente um olhar intenso, parecendo agitada. — Vocês não resolveram a situação.
— Não tem nada para resolver, vozinha. Olha, eu vou embora. Deixar a senhora descansar.
O aperto em sua mão perdeu a força.
— Converse com ele...
— Já conversamos.
— Ele te esperou...
A avó tossiu, engasgando.
— Quer água?
— Um pouquinho...
Alexandra segurou o copo em sua boca, a avó tremia. Quando ela fechou os lábios colocou o copo sobre a mesinha. Lídice fechou os olhos.
— Você tem que aproveitar a oportunidade... – sussurrou.
— Vó... Não se preocupe comigo.
— Minha menina linda...
Acariciando a mão da avó, Alexandra percebeu que ela dormira.
Ficou na enfermaria, observando o rosto gentil. Sua avó acreditava que ela ainda sentia algo por Marcos?
De repente, sentiu-se cansada, um cansaço de quase seis anos. E ainda encontraria com a mãe de Marcos mais tarde!
Soltou a mão da avó, beijou seu rosto e saiu.
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Lembranças de uma paixão ( concluída)
RomanceEle era fruto da escória da cidade, ela fora criada para ser uma princesa. Juntos, mostraram a todos que o amor sempre constrói. Até ele a trair... Mas a mágoa e o tempo seriam capazes de apagar uma paixão ardente?