Capítulo 24

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Marcos passou a manhã num estado febril. Tentava se concentrar no trabalho, mas as imagens e sensações do que vivera com Alexandra estavam muito vivas em sua mente. De repente, os anos sem ela desapareceram e só sobraram aqueles momentos na lagoa.

- Marcos?

Ele ergueu a cabeça, surpreendido pela voz de Patricia. Ela estava em pé à sua frente.

- Oi?

- Estava no mundo da lua?

- Estava concentrado. - respondeu, desconcertado.

- Deve ser algo muito complicado, porque suas orelhas estão vermelhas.

Ele admirava a sagacidade da colega, mas não quando tinha a ver com sua vida particular. Tentava ser o mais discreto possível e se aborrecia até quando Maria Eduarda ligava para a delegacia.

- É complicado.

Patricia sentou-se à beira de sua mesa.

- Posso ajudar?

- Não, obrigado.

- Você está bem?

- Está tudo bem.

Ela o encarou por um momento.

- Posso ser sincera?

- Hã?

- Você tem estado agitado esses dias. É algo sobre nosso serviço?

- Não. Está tudo bem. - repetiu.

Patricia deu de ombros e se levantou da mesa.

- Já te disse que se precisar de ajuda, tem uma equipe boa à disposição.

- Eu sei.

Ela deu um meio sorriso e saiu da sala.

Marcos sabia que não estava no seu normal nos últimos dias. Alexandra estava de volta à sua vida e aquilo mudava tudo. Pensou em como carregara sua vida nos últimos anos como um peso a ser sustentado; mesmo suas vitórias pessoais não tinham tanto brilho. Era como se houvesse perdido a alegria de viver quando ela fora embora.

Agora estava repleto de esperanças. Ela se entregara a ele! Ainda devia sentir algo... Desejou que aquele algo fosse amor.

Trabalhou o resto da manhã com o coração quentinho.

No final da manhã seu celular vibrou e ao olhar a tela, enrugou a testa. Maria Eduarda. Não, não deixaria nada estragar a felicidade que sentia. Colocou o telefone no mudo e voltou ao trabalho.

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Alexandra chegara em casa e fora direto para o banheiro. Abrira o chuveiro e deixara a água morna escorrer pelo seu corpo, numa tentativa de cessar a agitação. Sentia em várias partes o aperto firme de Marcos. Agradecia por não ser pálida, senão haveria vários hematomas à mostra. Podia senti-lo nas coxas, nos bíceps e, principalmente na vagina agora tão sensível.

Como tivera a coragem de fazer sexo com outro homem? Era de Rodrigo, eles se amavam, iriam casar e formar uma família!
Ficara um tempo se encarando no espelho de corpo inteiro, admirando o corpo que há menos de uma hora estivera totalmente sob o controle de Marcos.

Quando dera por si, a manhã já chegava ao fim. Passara quatro horas enrolando dentro do quarto, mexendo em seus objetos antigos, relembrando os seus dias de adolescente. Fora apaixonada por Marcos desde os catorze anos e seu amor sofrera um golpe doloroso quando ele a traíra. O que acontecera depois daquilo? Deixara de amá-lo?

Pensou nos dois anos seguintes à separação. Gastara toda sua energia se formando e depois trabalhando efetivamente na editora. Nunca, nunca mesmo deixava seus pensamentos se prenderem em Marcos. Só não conseguira fugir dos sonhos. Eles a perseguiam.

Mais tarde, sua vida se tornara mais leve. Aceitava convites para encontros, mas não se deixara apegar a nenhum homem. Somente Rodrigo conseguira quebrar a barreira que seu coração construíra. No dia que fizeram amor pela primeira vez, ela chorara. Não explicara a Rodrigo o motivo, mas ela se lembrara da sua primeira vez e de como a recordação se tornara amarga.

Rodrigo era seu amigo e parceiro nas noites de trabalho. Sentiam um amor tranquilo que satisfazia os dois. Não era nada parecido com o amor que tivera por Marcos.

Mas de que adiantara tanto amor se ele na primeira duvida a traíra?

Seu telefone tocou e ela deu um pulo na cama. Olhou o visor; era um número desconhecido. O aparelho parou de tocar, mas logo depois apareceu a notificação de uma mensagem. Abriu-a: Ligue quando quiser. Sim, era de Marcos.

Passou o telefone de uma mão para a outra. Para que ligaria para ele? O que teria para dizer a ele se ela nem sabia o que pensar?
Num impulso ligou para Rodrigo. O telefone tocou um pouco, mas ele não atendeu. Sabia que o namorado estaria muito ocupado naquele final de semana, entretanto precisava ouvir sua voz.
Meu Deus, o que foi que eu fiz? - pensou, cobrindo o rosto com as mãos.
Flashes dela e Marcos inundaram sua mente, deixando o seu corpo sensível. Não sabia como lidar com aquilo!
Eu preciso contar para o Rodrigo!

Mas como contar? Como explicar o que fizera? Ficou olhando para o telefone celular. Ligou mais uma vez. O telefone tocou, tocou e a ligação caiu na caixa postal. Talvez fosse melhor assim. Estava transtornada e não sabia o que diria para Rodrigo.

Olhou a mensagem de Marcos. Como ele estaria se sentindo naquele momento? Seu celular vibrou em sua mão e tocou. Era Rodrigo.

- Oi!

- Alexandra, estou numa reunião. Aconteceu alguma coisa?

Aconteceu, mas como diria a ele?

- Estou meio confusa aqui...

- Sua avó piorou?

- Não.

- Está querendo ficar mais dias?

Ela não havia pensado naquilo.

- Talvez.

- Olha, se você achar necessário ficar...

- Vou pensar.

- Amor, preciso voltar para a reunião.

- Tudo bem.

- Eu te ligarei quando tiver uma folga.

- Está bem.

- Até mais tarde, então. Te amo.

Ela desligou o aparelho, desanimada. Rodrigo com certeza não entendera sua insistência em falar com ele. Seu relacionamento era muito equilibrado e ambos respeitavam o espaço do outro. Não se lembrava de ter ligado durante o horário de trabalho de Rodrigo como fizera naquela manhã. Estava fragilizada, muito confusa e sem querer encarar seus próprios pensamentos.

Uma batida na porta a tirou do estado contemplativo.

- Oi, Fernanda?

- O almoço está pronto.

- Obrigada. Já vou descer.

Desceu para almoçar sem vontade. Seu estômago estava apertado de tensão. Passou na frente do espelho e o reflexo a fez parar. Seus olhos brilhavam muito, com uma expressão assustada. Qualquer um da sua família que a visse assim saberia que algo havia acontecido.

Preciso me acalmar antes de ver a vovó.

Passou a língua nos lábios que estavam excepcionalmente secos. Sim, precisava se acalmar.








Lembranças de uma paixão  ( concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora