Epílogo

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                         Nove anos depois...
Pedro Luiz segurava a mão do garotinho, enquanto a menina soprava as velinhas do seu bolo. Era o sétimo aniversário de Ana Lídice, sua meio-irmã e segurava a mão de João Marcos, de três anos, para impedí-lo de atrapalhar a irmã. Ao lado dos dois, Estefânia, de cinco anos encarava o irmão caçula que queria chamar a atenção para si.
Pedro Luiz amava seus meio-irmãos, mas tinha uma verdadeira adoração por João Marcos. O menininho o seguia como um cachorrinho e achava que o irmão mais velho era capaz de tudo. Mostrava mais admiração por Pedro Luiz do que pelo pai.
Fora difícil participar daquela festa, pois a mãe colocara empecilhos, como sempre. Ela se casara e tinha uma menina, Alícia, da idade de Estefânia. Porém o marido da mãe não aguentara o amargor que cercava a esposa e estavam separados. Pedro Luiz apenas torcia para a mãe viver a própria vida e deixar os outros em paz.
Ana Lídice soprou as velas e João Marcos chorou, desconsolado. Pedro se abaixou e tentou convencer o irmãozinho a parar de chorar. Admirou o rostinho cor de café com leite e os olhos verdes como os do pai, agora vermelhos de tanto chorar.
- Pare de chorar, Joãozinho. Está todo mundo te vendo.
- Eu quero soprar as velinhas! - gritou, mas os gritos de viva abafaram sua voz.
- É o aniversário da Aninha. Ela que tem que soprar.
- Meu bolo foi pequeno!
- Seu bolo foi grandão. - passou as mãos pelo rosto molhado. - E foi mais bonito.
- Foi?
- Foi, sim.
João Marcos fungou e passou as mãozinhas pelos olhos e as limpou nos cabelos de cachos crespos e dourados.
- Quero ver o bolo. - pediu, estendendo os bracinhos magros para o irmão mais velho.
Pedro Luiz o ergueu no colo. Viu que Alexandra o observava e sorriu para ela. Mesmo com tudo o que sua mãe dizia, não conseguia desgostar da madrasta. A mulher do pai sempre o tratara bem e fazia questão que Marcos tivesse um tempo só com ele. Pedro Luiz descobrira em Alexandra uma incentivadora em seu gosto pela leitura e ela vinha apresentando a ele vários livros. Se seus irmãozinhos deixassem, ele e a madrasta gastariam horas falando de livros.
Pedro Luiz queria ser leal à mãe, mas gostava demais de conviver com o pai e sua família. O seu maior sonho era poder trazer Alícia para conhecer seus outros irmãos, mas sabia que a mãe nunca permitiria. Quem sabe mais tarde?
Balançou o irmãozinho no colo e se deparou com um par de olhos escuros o fitando; era Letícia, a sobrinha de sua madrasta. Sentiu o rosto pegar fogo com o olhar brincalhão da menina para ele. Se conheciam desde o jardim de infância, mas só naquele ano percebera como os olhos dela eram provocantes e sua boca tão bonita.
Olhou novamente para a madrasta e viu que ela sorria para ele; desviou o olhar com medo que ela adivinhasse como seu coração acelerava quando estava perto da sapeca Letícia.
Olhou para o pai que segurava Ana Lídice no colo. Diziam que a menina se parecia muito com a falecida bisavó.
No princípio, Pedro Luiz tinha ciúmes pelos meio-irmãos serem mais próximos do seu pai, porém Marcos lhe dava toda a atenção que precisava.
- Quero ir com o papai! - João Marcos gritou, se contorcendo para descer do colo.
- Papai está segurando a Aninha.
- Papai! - o menino gritou.
Marcos olhou na direção dos dois e, beijando Ana Lídice, passou-a para o colo da avó paterna. O pai começou a andar em sua direção, ouvindo os gritos do filho caçula. - Pode me dar ele. - Marcos pediu.
João Marcos pulou para o colo do pai.
- Eu quero bolo!
Marcos beijou o filho.
- Vamos lá pegar.
Pedro viu o pai voltando para a mesa do bolo, sendo seguido por Estefânia, que correu e se jogou no colo da mãe. Ele riu da dinâmica familiar do pai.
- Não vai pegar bolo?
Ele deu um salto ao ouvir a voz de Letícia próximo ao ouvido.
- Ah... Eu... Vou, vou sim.
- Vamos pegar um pedaço e sentar na varanda? - ele ficou um momento de boca aberta, diante do olhar divertido da garota. Admirou os cabelos muito curtos, a pele cor de chocolate e a boca que não conseguia parar de olhar. - Oi, Terra para Pedro Luiz!
Ele balançou a cabeça e sorriu.
- Desculpe, eu me distraí.
- Eu percebi. - ela deu um sorriso sapeca. - Então, vamos?
Os dois pegaram fatias de bolo e refrigerante e caminharam na direção da varanda. Pedro Luiz notou que Alexandra sorriu para ele, fazendo um sinal de positivo. Sentiu-se corar novamente. Achou que ela já sabia do seu segredo.
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Alexandra acompanhou seu enteado sair para a varanda com sua sobrinha; lembrou-se que tinha a idade dele quando se apaixonara por Marcos. Olhou para o marido. Ele disputava uma batalha com João Marcos que agora insistia em ir para seu colo, onde já estava Estefânia. Ela e Marcos sempre se perguntavam a quem o menino puxara, pois ambos tinham sido crianças sossegadas.
João Marcos começou a chorar e Marcos se afastou com ele, que chorou ainda mais. Alexandra sorriu. Depois de um filho bem-humorado e duas filhas calmas, João Marcos vinha sendo um desafio para o seu marido. Pensou que depois que os convidados se fossem e arrumassem a sala, trataria de ajudar o marido a relaxar.
Sentiu um leve comichão nos seios ao pensar naquilo.
Sua vida e de Marcos era muito atarefada. Ela continuava a trabalhar para a editora, mas reduzira bastante o seu horário por causa das crianças. Entre trabalhar, cuidar da casa e idas e vindas por causa de colégios, médicos, natação e balé, lhe sobrava pouca energia para se dedicar ao marido. Entretanto, se esforçava para terem momentos de qualidade quando fechavam a porta do seu quarto. Então, se esqueciam das responsabilidades e do cansaço e se dedicavam um ao outro. Conversavam baixinho, se tocavam e mostravam ao outro o quanto era amado.
Ela gostava de se preparar para as noites com Marcos, ainda que apenas se desejassem boa noite e dormissem. Gostava de estar sempre cheirosa, com a pele macia e com camisolas sensuais. Não se cansava em se dedicar a ele e sabia que o marido pensava o mesmo.
Mesmo cansado, Marcos nunca deixava de acarinhá-la e sussurrar em seu ouvido.
Ambos reconheciam que, por muito pouco, não ficaram juntos. Para Alexandra ainda havia um resquício da dor da traição e para Marcos a ansiedade de ter vivido tantos anos sem tê-la, por isso, valorizavam seus momentos, os risos, as lágrimas, as palavras duras, o carinho, tudo fazia parte do milagre de seu reencontro.
Alexandra suspirou. Seu amor por Marcos não esfriara, pelo contrário, se tornava mais forte a cada ano. Ele era seu companheiro e seu parceiro, era seu amante e seu amor.
Estar com Marcos fazia sua vida valer a pena. Ter uma família com ele tornava cada momento precioso. E fazer amor com Marcos a lembrava do quão forte era a ligação entre eles. Amava cada toque dele, o som de sua voz, seu corpo tão másculo e protetor... Marcos fora e continuava a ser o amor da sua vida.
Estefânia escapuliu do seu colo para brincar e ela foi atrás do marido. Encontrou-o no corredor, com um cansado e sonolento João Marcos.
- O soldado está perdendo a batalha?
- Falta só mais um pouquinho pra ele capotar de vez.
Alexandra riu e apoiou o rosto no ombro de Marcos.
- Você fica lindo com uma criancinha nos braços.
- Está tendo ideias?
- Que tal outro menininho?
Marcos a olhou, alarmado.
- Esta tentando me dizer alguma coisa?
- Não, bobo. Estou brincando.
- Ah... - olhou para João Marcos, que finalmente fechou os olhinhos. - Essas pessoinhas dão muito trabalho.
- Você não reclama na hora de fazer.
Ele deu um sorriso malicioso.
- Gosto muito de fazer.
Alexandra apertou sua nádega.
- Quer me dizer isso depois que a festa acabar?
- Sempre vou dizer, meu amor .
Ela o admirou. Viu o menino sofrido, o adolescente lutador , o jovem inseguro e agora o homem equilibrado que se formara. Marcos sempre fizera parte de sua vida e o amara por tanto tempo que não podia se lembrar de quando ainda não o amava.
Abraçou-o carinhosamente e ambos ninaram João Marcos num ritmo calmante.
Aquela era a sua vida com Marcos: havia ternura, havia paixão e algo que ela tinha certeza; ela era de Marcos e ele era dela. Sempre.
                               FIM

Lembranças de uma paixão  ( concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora