Capítulo 6.

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Vinte dias depois.

Fazem vinte dias desde que Carolina viera para cá.

Não que eu esteja usando-a como marco temporal. Estou assinando termos em minha sala. Victor, Mob e GS estão conversando em um dos sofás. Possuem a mania de se amontoarem no mesmo lugar que eu, às vezes. Apago o cigarro e o deixo no cinzeiro. Acendo outro, continuo assinando termos e grampeando papéis.

Deslizo a caneta na linha, colo o selo no papel com a logo da Italian Blood, faço outra vez. Até que o celular de Victor toca. Levanto os olhos dos termos, pela primeira vez.

- O quê? Ah, não, claro... bom, não vou negar que eu queria te ver sim meu amor, mas se ela precisa de você... não tem problema. - Victor diz, visivelmente decepcionado. Mob ri, se espalhando do sofá:

- Honestamente, não me vejo nesse tipo de situação. Eu, carente de atenção de apenas uma pessoa? Que seja de várias, isso porque sei que conseguirei a maioria.

- Mas isso não é amor. Aquilo ali é. Você ama apenas uma pessoa, e quer somente ela. - diz GS.

- Pois então que eu não ame ninguém. Dio me livre. Mas prefiro não ser carente de atenção de ninguém, non è, chefe? Quero ser igual a você. - ele gesticula na minha direção. - Um Crusher da vida. Que não transa a anos e está muito bem com isso. - ele e GS dão risada. Mas então, a risada de Mob some. Ele para, olhando para o nada. - Não... transar é bom. - deixa um tapa no braço de GS. - Eu não ficaria sem transar. Nossa, não. - ele se levanta. - Decidi que preciso transar agora. - GS gargalha. Mob vem até minha mesa. - O departamento de armas está ótimo, chefe. Sem nenhum problema, falta de lote ou defeito em nada. Fiz duas rondas ontem, aqui está o relatório.

Ele tira um papel dobrado e sujo do bolso e deixa à mesa. Eu o pego, abro e encaro a letra mirrada. Como não digo nada, Mob sai da sala. Victor continua ao telefone. Puxo a fumaça e solto lentamente. Presto atenção no que está dizendo.

- Não, não estou dizendo isso. É que... três semanas. Sinto saudades suas, sabe. Mas se precisa ficar com ela, entendo. Vão sair ou ficar em casa? Se forem sair, tomem cuidado. Ah, vão ficar em casa mesmo? Cer...

- Convide-a a vir aqui.

Victor paralisa. Olha para mim e tampa a saída de áudio.

- Você odeia que ela venha aqui.

Sim, eu odeio. A questão é por que sugeri. Penso em uma resposta.

- Está parecendo um cachorro abandonado. - volto os olhos para os termos. - Não diga que fui eu quem convidei. - ele fica por mais alguns segundos me observando.

Sei por que sinto-o me encarando. Estou olhando fixamente para as letras da folha, mas não as assimilando. Tento processar o leve bater no peito. Não quero Bárbara aqui. Sequer pensei nela. Quero ver Carolina. Outra vez. Talvez não aja motivo plausível. Apenas quero. Continuo tentando processar.

- Hum... você pode vir aqui, se quiser. Sim, sim, mas hoje ele está de boa. É, ela pode vir também. Aí posso pedir pizza para vocês, eu já ia sugerir de te mandar o dinheiro aí. Pare de graça, Bárbara, ganho mais de dez mil por semana, o que é oitenta reais em uma pizza? Se não gosta que eu fique me gabando disso como se você fosse uma interesseira, não negue mais as coisas que eu lhe pago. É, isso mesmo. Agora vem logo. Estou louco para te... - a voz se torna um sussurro.

GS faz uma expressão nojenta e é o próximo a sair da sala.

Victor finaliza a chamada.

- Obrigado. Já é uma nova evolução você deixar que ela venha para cá. Mas ela vai trazer Carolina. - ele coça o queixo. - O namorado traiu ela, e ela está meio estranha, segundo Babi. - tiro os olhos do papel e olho para ele. - Parece que as duas combinaram em segui-lo até a dupla que ele fazia na faculdade, daí pegaram os dois. - diz Victor.

A traição, na máfia, resulta em morte.

Devo matá-lo? Não. Ele não é da máfia. Mas a traiu. Não consigo deixar de fantasiar um pedaço de seu dedo no chão. Ou de seu pênis. Quando Carolina chega, realmente está estranha. Achei que fosse estar mais, mas ainda sim, seus olhos estão cansados. Ela não diz uma palavra sequer, apenas sorri levemente.

- Obrigada por deixar que a gente viesse aqui. - diz Bárbara. Ela olha para Victor, mas sei que está dizendo a mim.

- Não tem de quê. Luci espalhou várias almofadas no chão e está fazendo a pizza. - Victor se vira e sai entrando.

Espero que vá na frente. Estou na frente de Carolina enquanto anda. Está de calça moletom e regatinha. Seus cabelos estão presos, em um rabo de cavalo. Ela se vira levemente para me ver andando atrás de si. Tropeça ligeiramente, mas seguro seu cotovelo antes que caia. Minha mão fica formigando sob sua pele quente. Eu a tiro de lá.

- Ah, sério? A gente não ia comprar? - Bárbara questiona.

- Não, não gostamos das pizzas daqui. Vocês não sabem fazê-las. Preferimos as italianas.

- E qual a diferença de uma pizza americana... para uma italiana? - Carolina diz, pela primeira vez.

- A massa é mais fina, leve, sem borda recheada e com temperos mais frescos. - explica Victor. - É por isso que comemos uma pizza inteira cada um, enquanto vocês saem tacando coisas demais dentro delas e não aguentam três pedaços. - diz.

- Mas elas não deixam de ser deliciosas. - Bárbara diz.

- Claro que deixam. Me sinto enjoado.

Carolina não diz mais nada. Está estranha, certamente.

Quando chegamos à sala, ela se senta no sofá, encolhendo as pernas e relaxando-as, como uma gata outra vez. Palavras estão prestes a sair para fora da minha boca. Mas não as digo, porque me impeço. Não quero saber por que está tão quieta.

Não quero saber por que está assim por alguém que a traiu. Não deveria.

Volto para meu escritório, onde havia deixado meus termos de lado.

Medicine | Volsher.Onde histórias criam vida. Descubra agora