Capítulo 50.

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- Você deu o apartamento a ela, não deu?

Victor mira a arma ao alvo. Aperta o gatilho, a bala atingindo o local próximo ao meio. Apoio a minha no mesmo suporte. Alinho a visão à mira, que está alinhada ao alvo.

- Eu não o usava mais.

Ele ri, abafado.

- Não é por causa disso que você deu. Se importa com ela, simples assim. Mas isso o assusta, portanto, fica encontrando justificativas que não sejam o fato de que você se importa com ela. - aperto o gatilho.

No entanto, um milímetro dos meus dedos se move. A bala atinge apenas metade do centro vermelho. Victor continua:

- Inclusive, sei também que não suporta mais pensar no que fez com ela da última vez. Que nem eu sei o que foi, mas que sei que a deixou chateada. Isso o consome tanto que precisou me chamar para brincar de tiro ao alvo no meio da madrugada.

- Estou prestes a fazê-lo de alvo, a propósito.

- Não estou mentindo.

- Você não estava dormindo. E não lhe chamei para me entreter.

- Hum.

Ele sabe que estou mentindo. Ou ao menos, suspeita. Não estou me importando com isso. Contanto que continue atirando a porra da bala ao alvo comigo, está bom. Não aguento mais sonhar com ela. Precisar me esforçar para não ir até ela. Não aguento mais não sentir seu cheiro. Não ouvir sua risada. Sonhar com ela em meu colo foi o limite.

- Uma vez, enquanto tinha pesadelos, acordei com uma marca no pescoço.

Ele para. A princípio, não recua a arma do suporte.

- Marca como?

- Marcas de duas mãos ao redor da minha pele.

Agora, sim, ele retira a arma. Se vira para mim.

- A quanto tempo foi isso? Por que não nos disse?

- Pensei... - olho para o céu. A noite escura, pequenas estrelas pingando na escuridão. Os benefícios de estar longe da cidade infestada por poluição. -... ainda penso, que tenha a ver com os recentes acontecimentos. - afinal, aconteceu depois. - Quando acordei, não havia ninguém no quarto. Mas a janela estava aberta. Não deixo a janela aberta. - olho para a janela do quarto, ao longe. Deixo os olhos caírem para as árvores. - Quem quer que tenha sido foi rápido. Assim que senti acordei. E assim que acordei olhei para a janela.

- E por que não nos disse?

- Porque no sonho, tinha sido ele.

Victor paralisa ainda mais. Não costumo mencioná-lo. Não como alguém do qual ainda temo. Do qual ainda me perturba, ainda que inconscientemente. O sonho o projetou como a pessoa que enrolou as mãos em meu pescoço. Que me sufocou. Portanto, não fui capaz de correr atrás de quem quer que tenha sido.

- Ele morreu, Crusher.

Ainda olho para as árvores.

Ele morreu.

Perdi a conta de quantas vezes ouvi a mesma frase. No entanto, não me parece uma frase de efeito. Sei que meu pai morreu. Sei que Frederic deixou de existir. Sei que não respira, não se move, não é mais um ser vivo. Um corpo precisa de dois anos para se decompor.

A esta altura, já deve ter se decomposto completamente. No entanto, é difícil acreditar na morte de alguém quando ela permanece viva dentro de você. Quando ainda consome sua mente. Lembra cada pedaço dela que ele destruiu. Domina seus pesadelos.

Não importa quantos perguntem ou se lembrem de sua morte... às vezes... parece que ele ainda está vivo.

- Arthur.

Medicine | Volsher.Onde histórias criam vida. Descubra agora