Capítulo 25.

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Carolina está dormindo quando estacionamos. No entanto, desta vez, não acorda.

E não sei se quero fazer isto. Pelo retrovisor, seus olhos estão adormecidos. Está de barriga cheia. Dormindo. Segura. Olhando para fora, não. Não vejo segurança no local. Ao que parece, a casa de seu ex é da mesma qualidade da dela. Péssima. Tampouco é uma casa. Se trata de um apartamento aos pedaços. No entanto, não tenho posição de fala. Não é de minha conta. Ela deve ficar aqui. Porque quis.

E porque não é um problema meu.

Respiro fundo.

Estou emocionalmente instável. Dei a ela informações demais. Passados demais. Pedaços de mim demais. E, mesmo assim, faria outra vez. A sensação de insatisfação me atinge. Como se não acabasse. Como se a satisfação fosse tê-la perto. E não posso sentir isto. O intervalo de tempo, desta vez, precisa ser definitivo. Não devo voltar a importuná-la.

- Carolina.

Ela se move. Seus olhos piscam, lentamente. Ela olha para fora enquanto esfrega os olhos. A tristeza os atinge quando vê o local em sua frente.

- Ah... chegamos? - sua voz sai baixinha.

- Uhum.

Mude de ideia. Diga que vai sair fora desta porra.

Por um instante, vejo seus olhos hesitando. O desconforto em suas íris.

Mas, no outro, ela respira fundo. Abre a porta do carro. Agradece a Jonas por suas malas. Saio. Recolho duas de suas caixas. Ela olha para o local por um instante. Depois para mim. Deve se perguntar se é seguro que eu entre. Só devo ajudá-la com as malas. Então não há como haver perigo nisto. Carolina sorri de leve e vai na frente. Entra, e não preciso comentar a sujeira que é o local.

Seus pés sobem os degraus. Acompanho o movimento de sua cintura. O do quadril e o da... engulo seco. Desvio os olhos da parte de trás da jeans. Finjo não estar ciente da quentura que se acumula em meu pau. É indecente. Errado. Não deveria sentir o que sinto por ela. Carolina para em frente a uma porta. Bate duas vezes, as mãos se apertando. Está desconfortável com algo. Quando a porta se abre, no entanto, vejo-me contrariado.

Há como haver perigo nisto. Porque a imagem de seu ex me lembra facas. Me lembra a arma que tenho guardada, no porta-malas. Ele olha para mim. Para Carolina, e para mim outra vez.

- Nossa, então esse é o seu tipinho? Tá explicado porque não demos certo... você gosta de maconheiros. - diz.

- Nós não demos certo porque você me traiu, Pedro.

- E você voltou querendo que eu dividisse minha casa com você. Ou seja, se ficar reclamando e encher o saco eu te coloco para fora daqui, com todo o prazer. Só não faço isso de verdade porque também estou querendo uma ajudinha na porra do aluguel. - a arrogância escorre de sua boca. A maneira com que a trata me faz querer enterrá-lo vivo. Assistir sua morte dentro do caixão. No entanto, espero Carolina revidar. Dizer algo. Porque, se não disser, não vou defendê-la com palavras. Ela não reage. Uma mão aparece no peito nu de seu ex. - Calma, amor. Já vou voltar para a cama. Ao que parece, não se pode comer uma boceta em paz. - a mulher, semi-nua, sai andando por dentro do local. - Mas é interessante ver como as coisas realmente são depois de eu não estar mais com você... nunca imaginei que gostasse de aspirantes a psicopatas.

- Cala essa bo...

- Tenho certeza de que o psicopata pode pensar diferentes formas de calar sua boca. - ele se cala imediatamente. Ótimo. É melhor de boca fechada. Não. É melhor longe dela. Não. Nenhum dos dois. É melhor que eu saia daqui, o quanto antes. Antes que cometa um assassinato, sem motivos plausíveis envolvendo a máfia. Continuo encarando-o. Mostrando-lhe o verdadeiro olhar de alguém capaz de perfurar sua boca, com agulhas. Costurá-la. Seus gritos seriam música aos meus ouvidos.

- Bom, eu... - Carolina tosse. - Nós vamos terminar de trazer as coisas. Você pode...?

- Eu não. Quem está se mudando para cá é você. Se vire com suas tralhas. - ele entra no local. Carolina permanece parada. Respira fundo e trêmula.

- Não sei como fui capaz de me relacionar com ele, mas... se serve de consolo, eu só estou conhecendo ele de verdade agora, porque a pessoa que ele era comigo antes... é como se fosse outra. - ela sussurra.

Vou lhe dizer que ainda há tempo. Tempo de aceitar o que lhe sugeri. No entanto, não faço isto. Apenas saio andando.

Quando terminamos de deixar suas coisas no local, paro em frente a ela. O cômodo agora está vibrando. Há gritos e gemidos na sala. Carolina nunca pareceu tão desconfortável. Quero levá-la daqui. No entanto, ela se aproxima mais de mim. Desliza os dedos sob o pulso, seus olhos me transportando para outro mundo. Seu corpo fazendo-me sentir calor. Sua proximidade é como fogo engolindo uma lareira. Quero queimar cada parte minha nela. Meu interior ferve. Batimentos cardíacos se descontrolam.

- Eu... muito obrigada de novo, Crusher. - sussurra, os olhos lindos me fitando. - Nunca sei te agradecer a não ser com palavras, mas... obrigada mesmo. Você não tem noção do quanto me faz esquecer dos meus problemas. - ela sorri. - Então, acho que até... a próxima vez que você decidir aparecer do nada e me encher de comida. - ela ri.

- Eu... - engulo seco. - Acho que o certo é não lhe perturbar mais.

Seu sorriso diminui.

- O quê? Como assim?

Seus olhos agora estão hesitantes. Inseguros.

- Não lhe visitar mais. Não vou mais te visitar, Carolina.

O sorriso some. Por completo.

- P... por quê? Eu dei a impressão de que queria que você parasse? - ela ri, nervosa. - Se sim, foi um enga...

- Não deu. Eu prefiro não fazer mais isto.

Me arrependo no instante em que abaixa o rosto. Não consigo ver sua expressão, mas está outra vez piscando os olhos. Engolindo seco. Apertando as mãos. Se segurando para não chorar. Saber que se sente triste por isso, é o que me quebra. Ela poderia não se importar. Eu poderia não me importar. Mas, quando levanta o olhar, suas íris estão cobertas de água. E, quando dou por mim, meu peito dói. Como se houvesse se dilacerado. Como se isto fosse um erro; me afastar dela.

Ela morde o lábio inferior, que começa a tremer. Quero reverter o que disse e cobri-lo com o meu. Dizer-lhe que não vou parar. Mas este é o certo. Manter-me longe dela.

- Ah... tudo bem. Obrigada, mesmo assim. Pelo livro, pelo que você gastou por mim... por tudo. - sua voz é rouquinha.

- Certo.

- Certo. Então... - ela respira fundo. Dá um passo para trás, ficando entre a porta. - Tchau, Crusher.

- Tchau.

E é só quando estou no carro, batendo a porta, que me dou conta. Fora um erro. Não vou poder mais vê-la. Não vou poder ver seus olhos. Seu sorriso. Sua risada. E não dei ao menos um último abraço. No entanto, o carro já está longe. Virando a avenida. A centenas de ruas de distância dela. Fecho os olhos. Não, não fora um erro. Carolina significa... instabilidade. Confusão. Desordem. Uma ferrugem em meu cérebro. O que impede as engrenagens girarem.

E devo voltar a me concentrar nelas.

Medicine | Volsher.Onde histórias criam vida. Descubra agora